Capítulo 6 - Aylla

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  Eu havia acabado de sair de um coma após um mês e sentia fortes dores por todo o meu corpo. Parecia um monstro, pois estava toda retalhada. Várias cicatrizes faziam parte de meu corpo. Algumas realmente horríveis como as do meu pulso e tornozelo. Minha cabeça estava com uma parte raspada e parecia que iria explodir de tanta dor e minha voz estava parecendo a de um ganso roco. Devido à cirurgia na perna, eu ainda não conseguia sequer andar sem ajuda.
 
   Mesmo assim, Enrico não me largou por nenhum segundo. Esteve ao meu lado de dia e de noite. Ele me alimentava, me dava banho, ajudava nas horas das medicações e fisioterapia, além de me acalmar, dizendo sempre coisas positivas sobre minha aparência deplorável. Mesmo eu sabendo que não era verdade.
 
   Me consolava sempre que me via chorando pela tristeza de termos perdido nosso bebê e segurava em minha mão quando eu queria desistir de tudo. Ele não me largou e se manteve firme por nós dois. Eu não tinha mais espaço em mim para tanto amor, pois ele fazia aquele sentimento transbordar até por meus poros.
 
   Em toda minha vida, jamais imaginei viver um amor como o nosso. Quando Enrico não estava por perto, sentia meu peito sufocar. Minha vontade de lutar pela vida era, definitivamente, pelo fato dele nunca ter me deixado. Ele era incansável na luta para me manter com a mente sã. Em alguns dias eu não queria nem abrir os olhos de tanto desânimo, mas ele não me deixava abater. Me carregava no colo, como se eu fosse uma criança e eu seria capaz de dar a minha vida para fazê-lo feliz.
 
   Aquele homem era o meu amor, o meu norte e eu não era mais capaz de viver sem ele.
  
   — Aylla... Você está bem? Parece que está em transe. — Minha cunhada me trouxe de volta, estalando os dedos à minha frente.
  
   — Desculpe Giulia. Estava só pensando em como eu amo seu irmão.
  
   — Nem precisa falar. Está escrito em seus olhos. E vejo o mesmo nos dele quando te olha.
  
   — Me desculpe por não termos te contado sobre nós. Mas é que as coisas fugiram do nosso controle.
  
   — Não se preocupe. Confesso que fiquei chocada quando soube de toda essa história, mas depois de saber o quanto vocês realmente se amam eu me tranquilizei.
  
   — Mesmo vivendo todo esse pesadelo, seu irmão faz tudo ficar bem mais leve. Ele sempre foi assim?
  
   — Sempre. Desde pequeno. A minha mãe sempre fala que quando eu nasci, ele parecia um sentinela. Mal eu chorava e ele corria para cuidar de mim e assim ele fez até ir embora. Enrico sempre me protegeu e me mimou de mais. Mesmo com tantos problemas que enfrentava com ele mesmo e o pai, nunca me deixou de lado. Pode ter certeza que fará o mesmo com você, Aylla. Ele nasceu com esse instinto protetor.
  
   — Eu jamais aguentaria passar por tudo isso sem o apoio dele. Está sendo muito difícil Giulia e o pior é que a maior dor que sinto não é na carne.
  
   — Eu sei como é. Mas nada como o tempo e a ajuda da família para amortizar esse sofrimento. Saiba que nós todos estaremos unidos para ajudar no que precisarem. Tenha certeza que nem você nem meu irmão estarão sozinhos nesse caminho.
  
   — Obrigada por sua amizade. Eu queria ser mais forte para ajudar o Enrico, mas não estou conseguindo. Perder esse filho me fez sentir como é ter algo precioso arrancado da gente. Parece que uma parte de mim também morreu com ele. Me sinto desolada.
  
   — Você ainda está vivendo o luto. É normal se sentir assim. É tudo muito recente. Eu passei por isso também com nossa primeira filha. Me senti da mesma forma que você está. Parecia que a tristeza jamais me abandonaria. Mas a cada dia, a gente vai se acostumando com a dor. Ela nunca vai sumir. Infelizmente vai permanecer aí dentro para sempre. Mas outras alegrias virão e você conseguirá seguir em frente.
  
   — Ele já se mexia cunhada. Eu sentia aquela vidinha dentro de mim. Enrico mal se aproximava e ele só faltava pular nos braços do pai. — Eu chorava ao me lembrar daquela sensação. — Ele estava tão feliz, e o que mais dói é ver sua tristeza e não poder arrancá-la dele. Ele se faz de forte, mas sei que está despedaçado por dentro. Só faz isso para não me deixar mais triste, eu sei.
  
   — Pois acostume-se. Ele tentará te proteger de tudo de agora em diante. Até de você mesma.
  
   — Me desculpe desabafar com você sobre isso. Mas é que não me sinto muito a vontade de falar certas coisas com a Isa. Eles tem um passado e isso me deixa um pouco intimidada.
  
   — Tudo bem. Pode conversar sempre que quiser. Mas vou te dizer uma coisa. O que eu vejo hoje é um outro Enrico. Em algumas coisas ele é o mesmo, mas em relação a vocês, posso afirmar que não é nada parecido com o que ele tinha com a Isa. Vejo um amor sem limites entre vocês. Esse é um verdadeiro encontro de almas. Claro que existia amor entre o Daniel e a Isabela, mas nada comparado ao que vejo agora. E o mesmo acontece entre minha irmã e Karim. Viva esse amor sem reservas, Aylla. Chorem juntos, sofram juntos, se realizem, mas façam tudo isso, juntos. Te garanto que o fardo fica bem mais leve.
  
   — Obrigada por me ouvir e pelos conselhos. Me sinto um pouco melhor só de saber que tenho um ombro que posso chorar quando precisar. Como estão os meninos? — perguntei, secando minhas lágrimas.
  
   — Me enlouquecendo mais a cada dia. Estão morrendo de ciúmes da irmã e não sei mais como agir com eles. Desculpe eu não queria falar sobre esse assunto.
 
   Eu me levantei um pouco da cama e mesmo sentindo dor coloquei a mão em sua barriga, que estava bem redonda.
  
   — Se eu não puder mais ter filhos, pelo menos vou ter muitos sobrinhos para estragar. Estou muito feliz por vocês e essa princesinha.
  
   — Logo sua hora vai chegar e sua casa terá uma porção de mini Enricos e mini Ayllas correndo sem parar e te deixando maluca.
  
   — Deus te ouça. Até ficar grávida do seu irmão, eu odiava a simples ideia de ter uma criança. Para mim era algo impensável. Mas assim que descobri a gravidez, um desejo de ser mãe nasceu ali. Hoje se ele me pedir uns dez filhos, eu darei sem nem pensar, mesmo que isso me leve de volta para o hospício. 
  
   — Posso te garantir que dois são o suficiente para você deixar um quarto reservado por lá. — Começamos a rir e senti uma agulhada em meu peito e uma dor muito forte nas costas.
  
   — Aylla, você está bem?.  
  
   — Não sei. Meu peito e minhas costas estão doendo muito. Não consigo respirar, Giulia. — Imediatamente ela apertou um botão e uma enfermeira entrou.
  
   — O que houve?
  
   — Eu não sei. Estávamos conversando e ela começou a reclamar de dores no peito e nas costas e está sem ar.
 
   Eu tentava respirar mas sentia como se uma pedra estivesse sobre meu peito.
  
   — Vou chamar o médico imediatamente. — Ela saiu correndo da sala e minha dor só aumentava. De repente comecei a tossir sangue e entrei em desespero. Olhei para Giulia que estava paralisada.
  
   — Meu Deus, Aylla! O que será isso?
  
   — Não sei... Liga pro Enrico... Por favor... Não conta nada para minha mãe. — Pedi quase sem ar.
  
   — Claro, tudo bem.
 
   Enquanto eu ouvia ela falar com Enrico, uma equipe médica entrou no quarto. Assim que o médico viu meu estado, na mesma hora começou a ditar ordens.
 
   Eu não entendia nada do que diziam até ouvir as palavras tomografia e urgente.
  
   — O que ela tem doutor? Fala.
  
   — Desconfio que seja uma Embolia Pulmonar.
  
   — E isso é grave?
  
   — Muito. Preciso levá-la agora mesmo.
 
   Eu entrei em desespero. O ar sumiu de vez de meus pulmões e desmaiei.

    

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