Capítulo 15 - Aylla

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Quando chegamos em casa, me joguei no sofá. Meu tornozelo estava latejando e tudo o que eu queria era que aquela dor passasse. Nem usar mais meus saltos eu podia. Enrico havia comprado um monte de sapatilhas e tênis para mim e aquilo me deixava mais irritada, pois nunca fui mulher de usar aquele tipo de calçado. Odiava cada uma delas, mas era só aquilo que eu tinha.

- Ruth fez uma sopa, você vai querer? - Enrico gritou da cozinha.

- Não. Estou sem fome. - Fui para o quarto mancando muito em busca dos remédios. Detestava ter que toma-los, pois tinha pavor de me viciar novamente, mas eu estava com tanta dor, que quando vi o frasco, tomei vários de uma vez.

Que se foda. - Pensei.

- O QUE VOCÊ FEZ, AYLLA? - Enrico chegou bem no momento em que eu jogava todos na boca. - Esses remédios são muito fortes. Quantos você tomou? - disse desesperado.

- Não sei. Nem me importo. Estou com muita dor.

- Será que eu vou ter que contratar uma babá também para cuidar de você?

- Se for um bronzeado de um metro e oitenta e sete, eu aceito - Me levantei e desabotoei sua camisa, mas ele segurou minhas mãos e me sentou novamente na cama.

- Você não está bem, é melhor descansar e vamos observar o que vai acontecer depois de ter tomado tanto remédio de uma vez. - Enrico saiu e me deixou com cara de paisagem, sozinha no quarto.

- O que está acontecendo afinal? - Me levantei e fui atrás dele. Por que está fugindo de mim?

- Nos estou fugindo. Você que falou que está com dor. Não quero te machucar ainda mais, é só isso.

- O cacete que é só isso. Você está bravo comigo, não é? Eu não queria te ofender daquele jeito.

- Mas ofendeu. Fez uma cena ridícula no meio da rua, fugiu de mim e me deixou desesperado, aí chega aqui e se entope de remédio sem necessidade e age como se nada tivesse acontecido. Para piorar, me destratou na frente do médico e ainda vou ter que aguentar outro homem tocando em você.

- Eu não sei o que me deu. Me desculpe Enrico. Vou tentar me controlar, eu prometo. Quanto ao médico. Se te deixa mais tranquilo, vou pedir para ele indicar uma mulher para fazer esse procedimento. Tudo bem assim? - Ele apenas me ignorou e virou de costas para mim.

Eu tinha que começar a ceder em alguma coisa, ou nosso relacionamento iria começar a desmoronar e eu não suportaria se aquilo acontecesse.

Realmente eu não sabia de onde vinha tanta raiva, mas o médico havia dito que poderia ser uma sequela do trauma que sofri e só me restava esperar e tentar me acalmar por conta própria.

Enrico mexia na panela de sopa e eu me aproximei e agarrei sua cintura por trás. Ele era tão alto que eu cabia embaixo de seus braços. Ele terminou de esquentar a sopa e só então desligou o fogo e se virou.

- Eu sei que você está tendo dias difíceis, Aylla. Mas de nada vai adiantar você descontar essa fúria em mim toda vez que algo te aborrecer. Não foi só você que perdeu. Eu também perdi e quase perdi em dobro. Se você tivesse morrido eu não sei o que faria da minha vida. Eu estou com muita pressão na cabeça neste momento. É você, sua recuperação, essa merda de DIU que eu também não queria, é a empresa, esse maldito Thomas que pode voltar a qualquer momento. Você já pensou em como eu me sinto Aylla?

- Eu sou um peso para você, não é? Desde que me conheceu sua vida virou um inferno. Mas eu não sei ficar sem você, Enrico. Se eu acordar de manhã e não te sentir, se eu imaginar que você não está comigo e que me deixou, eu simplesmente morreria. Eu não queria que nada disso acontecesse. Eu me apavoro em pensar que você não aguentará e fugirá. Mas o medo de te perder é maior que o medo que eu tenho de ficar cara a cara com aquele maldito. - Eu me ajoelhei e coloquei as mãos no rosto. Tudo aquilo estava sendo de mais para mim.

- Eu nunca vou te deixar Aylla, mas olha para mim. Você tem que me ajudar a te ajudar. Olha o que você fez hoje. Se pôs em risco por nada. Se dopou de remédios e me tirou do sério, me fazendo ser rude com você. Eu não sou assim, você sabe disso. Mas pense no que me forçou a fazer. Olha para seu braço.

Só então olhei e vi as marcas dos dedos de Enrico. Nem tinha notado que ele havia me pegado com tanta força.

- Não se preocupe com isso. Não foi nada.

- Não foi para você, mas para mim foi um ato horrível. Eu jamais encostei o dedo em uma mulher. E fiz isso justamente com a mulher que amo. Me sinto um monstro.

- A culpa foi minha. Sei que te tirei do sério.

- Não tente achar justificativas para isso - disse ele, passando os dedos por meus braços. - Eu vivo para proteger você e não para te machucar. Não corra mais de mim, por favor. Eu me descontrolo quando sinto que não tenho controle sobre sua segurança.

- Eu prometo que vou tentar te ouvir mais. Não posso permitir que você se afaste de mim. Eu só me sinto protegida em seus braços Enrico. Só aqui. Me agarrei a ele como se fosse um bote salva vidas.

- Eu sei. Por isso zelo tanto por sua vida, amor. - Ele me abraçou e voltei a me acalmar.

Nós sentamos e tomamos a sopa. Mas eu estava sem fome e muito inquieta quanto a um assunto e não dava mais para esperar.

- Enrico. Preciso te perguntar uma coisa.

- Eu vou perder o apetite, não vou?

- É sobre o Thomas.

- Já perdi - disse empurrando o prato.

- Se os seus homens o encontrarem, o que farão com ele?

Ele limpou a boca e ficou um tempo com as mãos cruzadas e com a cabeça baixa, depois olhou diretamente para mim.

- Eles não farão nada. Quem fará sou eu. Quero que ele sangre até a morte. Será uma morte muito dolorosa e lenta, tenha certeza disso. Ele vai sofrer.

- Era disso que eu tinha medo. Por isso não era para você se meter nessa merda. Se algo acontecer a você, como eu fico? E o que direi a sua mãe. Abandona essa vingança enquanto pode, esquece esse cara pelo amor de Deus.

- Tarde demais. Ele matou meu filho, quase matou minha mulher e está solto e respirando. Ele vai pagar e nem perca seu tempo me pedindo para não fazer isso.

Me levantei abruptamente da mesa, quase derrubando minha sopa intocada.

- Por que você tinha que se meter comigo. Olha no que deu. Eu falei pra você deixar essa porra toda no passado e olha o resultado da sua curiosidade. Não terei mais um dia de paz sabendo o que você pretende fazer.

- E qual é a outra opção. Me diga? Eu tenho que deixar ele te pegar e te matar?

- Eu sou uma fodida mesmo. Pelo menos assim acaba com toda essa merda e você não se suja por mim. Não faria diferença se eu deixasse de existir.

- Para mim faria toda diferença, você não pensa em mim quando fala uma asneira dessa?

- Claro que penso. Nada nesse mundo é mais importante para mim que você. Não preciso te lembrar disso. Mas você está sendo teimoso. Desista enquanto é tempo. Deixa a polícia se resolver com ele e fazê-lo pagar pelo que nos fez.

- Não Aylla. Eu vou pegá-lo e vou esquartejar esse monstro.

- E se você fizer isso, no que estará se transformando, senão em um monstro como ele?

- Meus motivos são bem diferentes dos dele. Não ouse nos comparar. Está vendo você me fez perder a fome, está satisfeita?

Ele se levantou, jogou o guardanapo longe e saiu da mesa nervoso. Pegou sua carteira e foi sentido a porta.

- Onde você pensa que vai?

- Para qualquer lugar, onde eu não escute você falando sem parar sobre o que eu devo ou não fazer. Se queria me irritar, parabéns, você conseguiu. Boa noite.

Ele saiu de casa batendo a porta com tanta força que derrubou até o quadro da entrada.

Eu fiquei ali, sozinha e sem saber o que pensar sobre aquela atitude.

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Vidas Cruzadas Parte IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora