Capítulo 19 - Aylla

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Encontrei as meninas na praça de alimentação às gargalhadas.

- Também quero saber qual é a piada para rir junto. - disse, me sentando.

- É melhor você nem saber. Além de atrasada, agora é puritana demais para certos assuntos.

- Onde você se meteu afinal? Aliás, esquece. Sabemos bem o que foi metido pela sua cara de safada e esse cabelo molhado.

- Vão cuidar das suas vidas e me errem.

- Impossível Lala. A graça é justamente falar de você. Temos meses de fofocas atrasadas para pormos em dia.

- Quer dizer que enquanto eu estava morrendo, vocês estavam só aprontando por aí. Disso pelo menos estou sabendo.

- Relaxa ruiva. Senta aí.

- Preciso comprar um monte de coisas para a viagem. Vocês terminaram de comer?

- Já sim. Cansamos de te esperar. Pelo visto você está bem saciada também. - Emma enfiava uma batata frita na boca num gesto bem sugestivo.

- Vocês nem imaginam. Mas dá para parar de falar de sexo um pouco. Preciso da ajuda de vocês. Enrico me passou uma lista imensa de coisas para comprar. Teremos que fazer várias viagens de carro para levar tudo.

- Por falar em carro. Como ficou o seu? O seguro já te deu outro?

- Ainda não. Está bem enrolado esse processo. Mas Enrico me deu outro de aniversário.

- Será que devo perguntar qual?

- Um DB9 conversível.

- O QUÊ? PUTA QUE PARIU! O CARRO DOS SEUS SONHOS.

- Pois é. Esse mesmo. - Tentei doar o mais normal possível.

- E você fala que ganhou um carro desses com esse desânimo.

- É que não posso nem dirigi-lo, Emma. O neuro me proibiu de chegar perto de um veículo e depois da minha convulsão nem eu mesma confio em mim atrás de um volante. Também sinto muita dor em meu tornozelo. Tem dias que mal posso tocá-lo no chão. Resumindo. Não posso fazer mais porra nenhuma. Estou toda fudida. Nem mesmo engravidar eu posso.

- Desculpa Aylla. Eu não queria chatea-la com esse assunto. Mas tenha paciência. Tudo isso é passageiro. Não desmorone como fez no passado, por favor. Nós estamos aqui por você, amiga. Não se entregue. Me prometa? - Emma estava visivelmente preocupada com minha angústia e me deu seu apoio como sempre.

- Aylla, o que mais houve no passado? Teve mais coisas além do que você me falou? - perguntou Mel, assustada.

- Fiquei internada em uma clínica de reabilitação por quase um ano, depois do que Thomas me fez. Nesse período, tive várias recaídas, além de tentar matar uma pessoa em uma crise terrível de abstinência. Também tentei suicídio algumas vezes. O medo de Emma e de Enrico é que eu regrida a esse ponto pelo trauma que sofremos agora. Mas fique tranquila Emma. Não tenho a menor vontade de me matar ou de me drogar novamente. Se não fosse extremamente necessário, nem esses remédios eu estaria tomando. Enrico me faz querer viver todos os dias e jamais tentarei fazer nada daquilo novamente.

- Que alívio ruiva. Você tem ótimos motivos para seguir em frente agora, então não desanime, está bem?

- Pode confiar, Emma. Só quero ser feliz. E não vou deixar o meu grandão para ninguém ficar consolando, entendeu amiga? Eu ouvi bem o que disse para ele no hospital.

- Sinal que meu plano de te trazer do além deu certo.

- Nossa Aylla. Sua vida não foi nada fácil, hein amiga. Admiro muito sua força. - Mel segurava em minha mão e senti que podia contar com ela em qualquer momento.

- Não foi e não está sendo fácil, Mel. Mas eu tenho as melhores amigas do mundo. Então as coisas se torna mais leve. Obrigada por tudo o que vocês fizeram por mim enquanto eu estava internada. Vocês são demais meninas. Masss, vamos mudar de assunto e ir atrás do que realmente interessa.

- Vamos comprar lindas cuecas para seu gostosão.

- Algumas coisas posso dizer, mas algumas serão somente para minha visão.

- Tenho medo de imaginar o que ele quer que você compre.

- Pois você deveria ter medo de saber o que eu vou comprar para usar com ele, Melzinha. A perigosa da relação sou eu.

- Eita baixinha! Se você não fosse como uma irmã para mim eu ia te chupar todinha. - disse Mel, vindo em minha direção.

- Credooo! Sai fora daqui. Nada de buceta se enroscando em mim. Quero só o meu bem dotado mesmo. Se encostar em mim faço da minha muleta uma arma. - Rimos e fomos fazer o que mulher faz de melhor. Gastar.

Passamos uma tarde muito animada de garotas. Estava me sentindo muito feliz em saber que tinha aquelas duas malucas em minha vida. Claro que algumas coisas que Enrico me pediu eu não comprei perto delas ou nos alugariam pelo resto da vida.

- Deixa eu ver Aylla. Para de ser chata.

- Nem morta, Emma. Podem esquecer. Já basta que deixei vocês me ajudarem a escolher minhas lingeries. O que virá depois de usá-las é só para ele.

- Mel, vamos sair daqui direto para um motel, essa minha amiga está me deixando com tesão.

- Liga para o Brad. Também fiquei acesa.

- Vocês duas podem parar? - Falei morrendo de rir daquela cena. Me ajudem a comprar um presente para meus sogros e apaguem esse fogo depois. Irei jantar com eles hoje.

- Você consegue se imaginar com seu grandão daqui alguns anos, amiga?

- Imagino tudo com ele, Emma. Nosso casamento, nossos filhos, netos, nossa velhice juntos. Não consigo me imaginar numa vida onde ele não faça parte. Ele é a minha vida.

- Se tivesse uma cápsula do tempo, eu iria te levar para falar essas palavras para a Aylla de um ano atrás. Ela riria muito da sua cara, sabia?

- Nem eu mesma acredito em tudo o que estou vivendo. Mas agora é um caminho sem volta.

- Será que algum dia eu encontrarei um Enrico para mim?

- Claro que sim, Mel. Mas para isso eu aconselho que vocês duas realmente se entendam. Esse trio com o Brad pode ser perigoso. Pensem bem no que estão se metendo.

- Ayllita, quem mete muito é o namorado da Emma. Para mim é apenas sexo. Nunca vou me envolver de verdade nesse relacionamento. A gente transa e eles seguem a vida juntos. Não se preocupe. Não é minha primeira experiência assim. E nem a única.

- Mas é a da Emma. Cuidado amiga. Eu sei o quanto você é sensível. Não quero que se magoe mais uma vez.

- Estou bem. De verdade. Estou vivendo um dia após o outro. Sem pensar muito como antes e estou feliz assim. - Ela sorriu, mas seus olhos não condiziam com suas palavras. Algo estava incomodando minha amiga e depois teria que ter uma conversa muito séria com ela.

- Aylla você é uma sortuda amiga. Pegou o melhor. Enrico se dedicou de corpo e alma para você enquanto esteve internada. Você sabia que ele doou até sangue para você?

- Ele não me falou isso.

- Eu suspeitei mesmo. E não foi apenas uma vez. Também montou um quarto somente para seus parentes poderem descansar quando iam te ver, para terem mais privacidade. Deu uma fortuna para o hospital fazer melhorias e doou equipamentos de primeira para a UTI neonatal.

- Ele ia todos os dias visitar o berçário mana e ficava um tempão olhando para aqueles bebezinhos enquanto chorava sem parar. Era de cortar o coração. - Emma disse derramando uma lágrima.

Eu não suportei ouvir aquilo e também comecei a chorar ouvindo-a dizer aquelas coisas sobre ele. Aquele era o homem por quem eu era cada vez mais apaixonada.

- Enrico tem um coração nobre, Aylla. É um verdadeiro cavalheiro. Hoje em dia isso é muito raro. Curta esse amor e não tenha medo de seguir a vida ao lado dele. -Concluiu Emma.

- Eu posso garantir que o amarei sem moderação. - Nós três nos abraçamos e senti que podia contar sempre com aquelas duas. Minhas irmãzinhas. - Agora vamos logo escolher uma última coisinha que o fará cair durinho quando me ver.

- Cair eu não sei. Mas duro pode ter certeza que ficará. - Mel falou virando os olhos.

Compramos várias coisas que fariam meu grandão ficar de quatro quando visse e aproveitei para comprar algumas cuecas samba canção para ele, que, embora não dormisse de roupa. Teria que se adaptar a usar algo para que pudesse circular pela casa sem causar um derrame em nossa empregada ou em minha fisioterapeuta.

Depois de comprar quase o shopping inteiro, minha perna começou a incomodar demais.

- Meninas, preciso ir embora. Estou com muita dor na perna e tenho que tomar os remédios da tarde.

- Que pena Lala. A gente ia te chamar pra dar um pulo na boate mais tarde, mas você tem compromisso.

- Mas dá pra vocês aparecerem por lá mais tarde. Normalmente esses jantares são rápidos.

- Agradeço o convite, mas terei que recusar. Com esta perna assim prefiro não sair de casa. Não vou poder dançar e isso me deixará mais para baixo.

Por mais que me dedicasse na fisioterapia, sabia que ainda demoraria muito até que eu conseguisse voltar a fazer tudo o que fazia antes do acidente. Isso se realmente eu pudesse fazer de novo.

- Se mudar de ideia, estaremos por lá. Adorei matar a saudade de você, amiga. -Nos despedimos e fui para casa.

Pedi que os seguranças deixassem as coisas na sala e corri para tomar banho. Enrico chegou assim que desliguei o chuveiro.

- Amor. Onde você está? - O ouvi gritando por mim.

- Terminando de tomar banho.

Ele veio até mim, desabotoando a gravata e com aquele olhar de predador que eu conhecia muito bem.

- Fiu... Fiu! - Ele assobiou quando me viu passando hidratante em minha perna e me atacou. Como estávamos atrasados eu recuei. Não queria causar uma má impressão aos meus sogros.

- Nem pense nisso. Eu conheço bem essa cara e não temos tempo para nada agora.

- Sempre temos tempo para isso. - Eu estava enrolada na toalha e fui secar meus cabelos. Ele chegou bem perto e a jogou no chão.

- Ops, sua toalha caiu. Desculpe.

- Não começa, por favor - pedi, o vendo me agarrar pelo reflexo do espelho. Colocou meu cabelo de lado e começou a beijar meu pescoço.

- Como foram as compras? - perguntou, passando os dedos bem de leve em meus seios, os deixando eriçados.

- Acabei com toda sua fortuna de uma vez. - Encostei a cabeça em seu peito, sentindo meu corpo todo estremecer.

- Impossível. Mas aposto que você se esforçou bastante. - E continuava a me tocar por meu corpo.

- Sem limites, você mesmo disse.

- Não me importo. Nunca fui de esbanjar mesmo. Agora tenho um belo motivo para isso.

- Prometo que não se arrependerá do investimento.

Vidas Cruzadas Parte IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora