Capítulo 60

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Rael 🔫

Chegamos no galpão e não estava entendendo nada do que estava acontecendo quando sai do carro. Haviam vários carros estacionados ali e várias motos também. Os meninos partiram na frente e fui logo atrás deles.

O salão tava cheio de pessoas. Minha família e todos os nossos aliados e pessoas das famílias deles estavam ali presentes.

De longe vi a Lívia sentada em uma mesa se empanturrando de comida. Meus pais estavam sentados logo a frente dela e meus tios também. Fui direto na direção deles e parei em frente ao meu pai.

Rael: Será que dá para o senhor me explicar o que está acontecendo aqui? - falei entre os dentes.

Minha mãe olhou incrédula para o meu pai, que simplesmente ignorou o olhar dela e a minha pergunta. Ele se levantou e saiu em direção a uma espécie de palco que tinham montado ali.

Tito: Atenção. - limpou a garganta. - Peço a atenção de todos. - todo mundo parou o que estava fazendo e se virou para prestar atenção. - A 25 anos atrás eu assumi a facção Comando Vermelho, a mais temida do Rio de Janeiro. Meu pai, FP, deixou essa responsabilidade para mim e creio que fui um bom chefe. Claro, não posso negar que houve algumas... muitas falhas e que pessoas chegaram a morrer ou se ferir gravemente, mas nada que no final não fosse resolvido. Comandar um morro e uma facção não é fácil, jamais foi e eu sei que é uma responsabilidade muito grande, foi uma das maiores da minha vida. Meu pai me ensinou tudo que eu precisei aprender para comandar com exatidão e acredito que tenha passado todo esse ensinamento para o meu filho, Rael. - me encarou.

Nessa hora todos olharam para mim. Engoli o seco.

Tito: Tudo que te ensinei, filho, terá que ser posto em prática agora. - olhei pra ele sem entender. - Tudo o que acontecerá agora está em suas mãos e cabe a você decidir se vai fazer algo para mudar as situações ou não. Hoje eu, Renan Moura, me aposento do cargo de chefe do CV e passo o cargo para o meu filho, dono do Complexo do Alemão, Rael Lima Moura.

Alguns aplaudiram aliados e toda a minha família e gritaram, outros somente olhavam frio para mim. Os meninos vieram me cumprimentar. Custava acreditar nas palavras do meu pai.

Como assim? Eu? Chefe do CV?

Assumir um morro não foi nada fácil para mim, mesmo sabendo de tudo do movimento, ainda sinto muitas dificuldades, sorte que sempre tive quem me ajudar. Mas acho que não estou pronto para assumir uma facção.

Jamais estive. A responsabilidade é em dobro e a cada passo que você der pode ser um tiro no pé ou não. Eu sei do que estou falando porque sempre acompanhei meu pai nas reuniões e sei exatamente do que vou ter que lidar agora.

Muitos vão discordar da sua ideia e estava na cara que muitos ali não gostaram nada dessa decisão do meu pai. Eu senti isso só pelo olhar de alguns aliados ou dos filhos deles.

Tito: Venha cá, Rael. - me chamou, me tirando dos pensamentos. O Alan me empurrou em direção ao palco e continuei a andar.

Minhas costas queimaram com os olhares de inveja, de ódio e de negação. Engoli o seco e meu pai me abraçou.

Tito: Você agora é o Dono do Poder. - falou em meu ouvido. - Sei que não vai me decepcionar. - me encarou. - Eu te amo. - travei o maxilar e afastei o microfone.

Rael: Porque não falou que ia fazer essa porra? - meu pai me olhou sem entender. - Esconder de mim que ia se aposentar e me renomear chefe do CV não foi nada legal, Renan. Puta que pariu, o senhor tem noção da parada? - percebi que todos olhavam para nós.

Puxei o meu pai para sair dali e fomos para o canto do salão, onde estava mais vago, mas ainda sim olhavam para nós.

Tito: Eu tive a mesma reação quando fui assumir. - sorriu pequeno. - Fica tranquilo, filho. Vai dar certo, já estive no seu lugar e não é um bicho de sete cabeças.

Rael: Não estamos falando de você, então para de fazer essa comparação. Somos diferentes, mesmo tendo o seu sangue correndo em minhas veias eu não sou igual a você, Tito. - me encarou sério. - Nossa frieza é diferente. Não estou pronto para assumir facção nenhuma.

Tito: Esteve pronto para assumir um morro, por que não o CV?

Rael: Porque eu sempre quis assumir o morro, mas nunca a facção.

Tito: Bom, agora é tarde demais. Você já é o chefe dela, todos concordam com essa decisão e você vai controlar tudo. - falou sério. - Achei que sempre quis seguir os meus passos.

Rael: No morro, pai, no morro. - suspiro.- Ser uma boa pessoa para a favela e sempre ajudar quem precisa. Mas também ser frio na hora certa e com quem merece.

Tito: É a mesma coisa, Rael. - bufei. - Não adianta mais nada, pode falar o que quiser, já está feito. Ou você engole fazendo careta, ou aceita sorrindo. - saiu de perto de mim e foi em direção a minha mãe.

Os dois saíram do galpão juntos e soquei a parede.

O que ele pensa que está fazendo? Eu só tenho 21 anos, novo demais para tomar conta de duas coisas grandes ao mesmo tempo. Três, na verdade, já que tinha a Lívia e o meu filho.

Não sei o que está se passando na cabeça do meu pai, mas sei que boa coisa não é. Do nada ele faz isso e é logo quando estão atacando os morros.

Não estou feliz com a idéia, não estou mesmo.

Sai do galpão pela saída de emergência e tenho quase certeza que ninguém me viu. O galpão não ficava não afastado da cidade, então fui andando mesmo até onde eu me sentisse bem.

Precisava ficar longe um tempo, pensar nessa porra direito.

Seja o que for, é como o meu pai disse, não tem mais volta. Ou aceita ou surta. E acho que nesse momento, eu ainda estou surtando.

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