Quase morte

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Mais algumas horas andando, nós começamos a ouvir risadas e depois, um grito tão alto que nos fez querer correr, Takeshi quase se soltou mas eu o segurei com força e disse para não soltar. Os gritos foram se multiplicando e se misturavam com choro e pedidos de socorro, mas logo mudava para várias vozes conversando e rindo, e por fim, um grito tão alto e agudo que estremeceu todo meu corpo. A angústia apertou meu peito, me faltou ar, não tive controle das minhas próprias emoções e lágrimas salgadas escorrem pelo rosto parando no canto da minha boca

Entrei em desespero e não fui a única, o único de nós que conseguia se manter mais instável era Meraki que sempre dizia para não soltarmos as mãos; a tensão percorre minha espinha e o frio na barriga é avassalador, ouço os dentes de Takeshi baterem um no outro por ele não parar de tremer e eu mal conseguia me mexer, estava literalmente sendo arrastada por Meraki. Os sons piorava cada vez mais, agora os lagos borbulhavam e o estouro das bolhas faziam barulho e as risadas, conversas, gritos, choro, iam ampliando tomando conta de toda a floresta e ficava cada vez mais alto ao ponto de se tornar insuportável.

Foi uma noite tensa mas finalmente o dia amanheceu e os raios de sol insistentes voltaram a invadir entre as folhas das árvores

– meus pés estão tão cansados, não aguento mais andar -reclamei

– se quiser eu te carrego nas costas -ofereceu Takeshi

– mas você se cansaria mais e não ia aguentar até o fim

– Meraki, falta muito para sairmos daqui? –perguntou Takeshi

– se não pararmos vamos sair daqui o quanto antes

Meraki deu sua deixa na fala e em seguida escutamos gritos. Gritos de dor vindos do lado leste da mata bem distante

– acho que não somos os únicos viajantes aqui –disse Takeshi

– continuem andando –repetiu Meraki

Mais uma vez as horas se passaram. Dez, onze, meio dia, uma da tarde, duas, três... Nossos estômagos estavam roncando tão alto que era possível de se ouvir a quilômetros de distância. Nós comemos pão e alguma biscoitinhos, nossa água já estava acabando mesmo com todo o cuidado que estamos tendo e cada vez mais que entrávamos na floresta, íamos vendo coisas terríveis, chegamos em uma área onde só há pilhas de corpos, outros corpos devem estar aqui a mais ou menos três dias e o lugar fedia mais que a floresta inteira

O mais estranho é que nem moscas tinha, apenas sangue, que as vezes variavam as cores deixando a entender que são várias criaturas de reinos diferentes. Ver todos esses corpos me deu um pesar no coração, eu queria ver essa floresta queimar até não sobrar nada dela.
Meus pés estão com bolhas, estou suada e sedenta, não importa o quanto eu poupe minha voz, minha garganta continua seca e eu não era a unica a reclamar. Takeshi e até mesmo Meraki reclamaram, mas não havia uma gota a mais de água

Mais uma vez a noite cai e com ela o nosso ânimo e vontade de prosseguir, mas só de pensar na morte dolorosa que teremos, continuar mesmo com os pés sangrando é um ótimo incentivo.

Os lagos brilham e como consequência as vozes iniciam e de início a floresta apresentou o grito do ser que escutamos mais cedo que agora já está morto.

E mais uma noite passamos debaixo de uma tormenta, nossos choros se misturavam com o choro das vozes igualmente com os gritos, não estávamos suportando mais tudo isso.

...

Amanheceu novamente e Meraki disse uma frase que encheu nossos corações de esperança. "Estamos muito perto da saída" oque é ótimo, porque a comida também acabou. Parece que nossos corpos ganharam mais força e andávamos mais depressa, agora nada mais importava nem mesmo os gritos que estavam ecoando por toda a floresta de uma forma repetitiva muito suspeita
Sinto algo escorrer pela lateral do meu rosto debaixo do meu ouvido, levo minha mão até o ouvido percebendo que é ele que está sangrando

Isso me preocupou mas preferi não falar para os outros, até porque nada adiantaria, não podemos parar custe oque custar.

– ela sabe que estamos perto de sair e quer forçar uma separação, dêem as mãos de novo, estamos quase lá -disse Meraki

Agora os gritos repetitivos fizeram sentido, é a floresta querendo nos desesperar outra vez mas não vamos parar, estamos quase lá, daqui a pouco vamos cruzar a saída

...

Já é noite e nada da saída, os gritos estão cada vez mais altos e está chovendo, isso dificulta muito para nós pôs a estrada está escorregando e se cairmos pode ser fatal.

– não parem! A saída é logo ali! –gritou Meraki em meio as vozes

– só que você já está falando a mesma coisa desde que o dia começou de novo, Meraki! –gritou Takeshi– estamos perdidos!? Essa floresta tem fim!?

– não se desespere, é isso que a floresta quer, por favor, confiem em mim

Seguimos debaixo da chuva um segurando o outro para não cairmos até que Meraki surta, ele grita de dor e desespero e se solta da mão de minha mão voltando para trás. Para sua sorte, Takeshi agarra seu braço com força, ele luta bravamente para sair mas ele não o larga, deu um tapa em seu rosto e isso foi oque fez o mesmo se acalmar

– Meraki, fica comigo! Se recomponha

– eu não aguento mais, eu quero sair! –gritou o mesmo

– se recomponha! Estamos quase lá, lembra? Foi você quem disse isso. Por favor não desiste agora, fica comigo

Ele concorda com a cabeça e segura mão de Takeshi, agora quem está na frente sou eu e continuo andando até o fim.
De repente vimos então uma abertura que a própria natureza fez, e olhando por ela, dava para ver que a chuva cai com mais abundância

É a saída.

Todos nós começamos a sorrir e andamos mais depressa até que em um ato desesperado na porta da floresta, nos lançamos para fora sentindo a chuva cair em peso sobre nossos corpos, o fedor de cadáver havia desaparecido, estamos livres, e agora correndo para longe

Corremos a uma boa distância da floresta até que minhas pernas pararam de funcionar e eu caí com o rosto no chão. Todos nós caímos exaustos e fracos e a chuva era oque pouco importava naquele momento, ficamos ali deitados com a língua para fora até que nossos olhos pesaram e a última coisa que escutei foi "eles precisam de ajuda!"

...

Lentamente meus olhos foram se abrindo ao sentir meu corpo balançando. Já é dia, porém nublado, não sei o horário e nem por quanto tempo dormi.
Tudo oque me lembro são de cenas rápidas onde eu vejo Huazei sendo carregado como um saco de batata e uma correria de um povo desconhecido cujos rostos eu não lembro, muito menos sua forma

O Soldado, O Poeta e o Rei [Em Revisão]Onde histórias criam vida. Descubra agora