SandCastles - DocShoe

Engasgado 😞

Antônio.

(...)

- Hoje eu comprei minha passagem, volto domingo que vem para o Brasil. — ela disse cortando o silêncio que se instaurava ali.

Ouvir essas palavras vindas de Amanda foi como ter levado um soco na boca do estômago, nada poderia definir melhor esse momento do que o mais puro desespero.

Nada poderia ser pior do que isso, NADA.

Me imaginar longe deles era uma tortura pra mim.

Mas por outro lado, apesar de me doer, eu entendo sua decisão em voltar para o Brasil.

Amanda visivelmente não está bem e nem posso a culpar por isso, já que meus treinos estão cada vez mais intensos e longos, o que me fez passar grande parte do dia longe de casa, então basicamente ela passa o dia inteiro sozinha.

Ela não tem uma única ocupação decente além de conversar com o Jubileu, não tem a presença da família nesse momento tão difícil que está sendo o início da gestação, sem as amigas pra conversar e até mesmo desabafar e sem fazer o que mais ama na vida que é atender seus pacientes.

Por mais que não seja a melhor decisão pensando nos meus sentimentos, não posso ser egoísta e pensar somente neles, teoricamente essa é a melhor decisão pensando nos sentimentos dela, que é o que realmente importa visto que as emoções dela afetam diretamente a saúde do bebê.

É sufocante pensar nela longe de mim? É praticamente claustrofóbico, mas por mais que me doa muito, eu a compreendo.

- Domingo que vem? Mas já? — perguntei quase sem voz, ainda tentando assimilar a pancada.

- É... — ela respirou fundo — Já se passaram 1 mês que estou aqui, acredita? 1 mês que eu virei sua vida do avesso. — ela falou rindo.

- Isso é muito doido, sabia Amandinha?

- Isso o que, garoto? — ela respondeu tirando os olhos do céu e virando a cabeça e direcionando seus olhos pra mim.

- Eu sempre fui um homem todo metódico, você sabe né? Depois que fiquei doente então, isso piorou muito. E daí você chegou na minha vida bagunçando tudo, literalmente tudo, né? — ela gargalhou enquanto me ouvia dizer isso — depois veio a notícia da nossa gravidez que literalmente virou a minha vida do avesso, mas a verdade é que eu descobri que no final das contas, o avesso que é o meu lado certo.

Amanda me observava com os olhos mais brilhantes do que qualquer estrela presente naquele céu.

- A minha vida virou de cabeça pra baixo e eu aprendi a apreciar a vida de outro ângulo, você entende? — continuei

- As vezes a vida faz isso mesmo né? Vira a gente de ponta cabeça ao ponto de gente não sabermos mais se estamos no chão ou se estamos no teto, tudo isso muda de acordo com a perspectiva de cada um. — ela disse voltando o olhar para o céu.

- Eu sei que não tenho o direito de dizer o que vou dizer agora e inclusive não quero que você fique achando que quero pressionar você, longe disso, tudo o eu quero o melhor pra você e pro bebê...

Fui tomando coragem aos poucos pra dizer a ela o que tava engasgado na minha garganta.

- Eu não queria que você fosse embora! — falei rapidamente antes que me arrependesse.

Amanda não respondeu, não se mexeu e eu por um segundo achei inclusive que ela tinha segurado até mesmo a respiração.

- Eu amo a sua companhia, eu amo nossas manhãs divertidas, amo nossas conversas aleatórias, eu amo ouvir você cantarolar músicas que ninguém além de você conhece, eu aprendi a amar até a sua desorganização, acredita? Eu amo você Amanda, amo nosso filho e amo a nossa família. Ter a sensação de estar perdendo vocês é como se eu perdesse o chão.

- Ouvir você falar assim me machuca e me confunde muito. — ela falou depois de um longo período em silêncio, só me ouvindo.

- Por que?

- Porque você terminou comigo Antônio! Você terminou e foi embora do Brasil 2 dias depois sem nem me dar a chance de falar com você direito. Você não se importou em saber como eu estava ou como eu fiquei durante o mês que você esteve longe. Você se quer foi capaz de mandar uma única mensagem pra mim nesse período todo pra saber se eu estava bem e até mesmo se eu estava viva.

Talvez essa nossa conversa já deveria ter acontecido a algum tempo, mas nenhum dos dois tinha coragem pra inicia-lá.

- E me dói mais ainda pensar que se não fosse pela gravidez e por eu viajar mais de 6 mil quilômetros até você, certamente você continuaria sem se importar comigo, com os meus sentimentos, com as minhas mágoas e com a minha dor. — ela continuou falando.

- Você nunca me procurou ou procurou saber de mim também Amanda, eu sei que te magoei, mas não é justo você falar como se a culpa de tudo fosse somente minha.

- Você disse que me amava depois de olhar dentro dos meus olhos e dizer que não conseguiria ter uma relação a distância comigo sem ao menos tentar, por que você acha que eu te procuraria? Isso não faz nenhum sentido. Pra que eu iria dar murro em ponta de faca? Você não queria mais e deixou isso bem claro pra mim. A única coisa que eu fiz foi acatar a sua decisão e seguir com a minha vida do jeito que dava pra eu seguir.

Ela vomitava todas aquelas palavras de forma extremamente sentida, provavelmente tudo aquilo já estava entalado na garganta dela a meses e só agora foi colocado pra fora.

- Eu nunca deixei de pensar em você nesse tempo todo, mas eu precisava desse momento pra mim também, eu precisava voltar a ser eu mesmo, eu precisava focar no meu trabalho, eu precisava disso, você consegue me entender? — questionei a ela.

- Eu te entendo, te entendo tanto que nunca questionei nada pra você. Mas é que agora a impressão que eu tenho é que se passou muito tempo e a gente acabou perdendo o timing pra viver a nossa história. A gente se dá muito bem e eu amo você, mas eu não posso me jogar no lago só porque eu ouvi o canto da sereia, você entende o que eu quero dizer?

- Sinceramente? Não. — respondi.

- O que eu tô querendo dizer que eu não posso fingir que nada aconteceu comigo quando você me deixou só porque você resolveu perceber que realmente me ama e que me quer ao seu lado, sabe? Só eu sei o quão difícil foi pra eu conseguir me reerguer depois que você foi embora.

Aquelas palavras me acertaram no fundo do coração. Eu realmente não tinha ideia de como ela ficou durante todo aquele período, até porque se eu soubesse me sentiria ainda mais culpado, como estou me sentindo agora.

- Grande parte de minha vida está no Brasil. E se eu decidir eu me abrir sentimentalmente pra você de novo e amanhã você acordar e entender que realmente não consegue viver uma relação a distância comigo e resolver terminar comigo de novo? A gente vai acabar se magoando um com o outro mais uma vez e isso vai acabar afetando a vida do nosso bebê. Tudo o que eu não quero é que ele conviva em um ambiente hostil entre nós dois, até por conta disso eu passei por cima do meu orgulho e das minhas mágoas pra vir até aqui falar pessoalmente com você, fiz isso pelo nosso filho porque a prioridade da minha vida é o bem estar dele, somente ele.

- Como eu disse pra você, a minha intenção nunca foi te magoar, Amanda.

- E eu acredito em você, mas mesmo sem ter a intenção, a mágoa ocorreu e apesar de continuar te amando e te querendo muito bem, ainda está dolorido é recente e eu não posso me dar ao luxo de dar um tiro no escuro e acabar me machucando de novo.

Por mais que o que eu mais quisesse na minha vida era te-lá de volta pra mim, eu a entendia. Até porque a minha prioridade também era o bem estar do meu filho e se pra isso acontecer, eu tenha que ficar sem ela aqui, que seja o preço a se pagar. A prioridade da minha vida deixou de ser o meu bem estar e passou a ser o bem estar dele.

E quem decidiu terminar foi eu, então tenho que agir como um adulto e aceitar as consequências das minhas atitudes.

- Acho que está tarde, melhor irmos dormir. — ela disse quebrando o silêncio entre nós e sentando na grama.

Amanda levantou-se e saiu em direção a parte interna da casa, quando ela estava prestes a subir a escada, eu falei:

- Amanda, me desculpa! — disse com as mãos na cabeça.

- Você não precisa se desculpar, você só fez o que era melhor pra você e agora é a minha vez de fazer o mesmo.