O aviso de Marcelo, e a dificuldade de Valentina.

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♠ Marcelo Clark ♠

— Se quiser, pode me levar em seu lugar, trabalharei todos os dias até quitar a dívida de Jack, mas por favor… deixe a garota.

— Você não entendeu… Não se trata mais de dinheiro. Eu já tenho tudo planejado! Valentina vai para a América comigo, farei dela minha esposa. Receberá todo o luxo e a vida que uma mulher pode querer. Deveria estar feliz por eu estar tirando a garota desse buraco de rato.

Aproximei-me ainda mais ameaçador.

— E quando tudo for oficializado, quando sua garotinha for minha, vou torná-la minha mulher de todas as formas possíveis. Não há nada que você possa fazer para me impedir. E um dia, talvez, se eu for paciente o suficiente, ela pode até passar a me amar.

— Você é louco, não pode estar em seu juízo normal. Como pode obrigar uma menina a satisfazer seus planos absurdos? Esses são seus planos não os dela. Como acha que pode surgir algum amor disso? Você não faz ideia do que é amar alguém.

— Os sentimentos dela não serão problema meu, mas é uma possibilidade muito bem considerada, e eu não me preocupo se isso não acontecer.

Deslizo um dedo sobre a face de Ilana, quase com carinho. Ela está aterrorizada.

— Ou ela vem para mim por bem, ou algo bem ruim vai acontecer a sua amada mamãe. Pense nisso Ilana, ela irá se culpar para o resto da vida. É o que você quer?

— Não…

Recebo uma mensagem de John me pedindo para voltar ao hotel, resolver coisas do outro continente. Fecho meu sobretudo, coloco minhas luvas e ela assiste apreensiva. Não parece a mesma mulher de quem já ouvi falar tanto…

— Eu sei quem você é, Ilana. Ou quem você foi. Sei que não vai me entregá-la tão fácil e até agradeço por isso — digo, pronto para sair. — Será bem mais interessante poder persegui-la.

Antes de ir embora, paro à porta somente por prazer:

— Os sentimentos dela irão surgir aos poucos. Você vai ver que nada resiste ao tempo. E você mesmo será minha isca. Tenho certeza disso! Não se engane, sua liberdade acabou, meus homens estarão na sua cola!

♥ Valentina Becker ♥

Uma semana inteira se passou, e a cada noite que chega eu fico mais apreensiva com a escuridão. Quando olho a rua por trás das cortinas com cheiro de poeira, posso jurar que há um carro preto do Marcelo Clark parado do outro lado. Então eu fecho os olhos por um segundo e repito para mim que é apenas a minha imaginação. Só que as dúvidas continuam. Será que eu estou fazendo direito? Eu estou realmente escondida?

A viagem de trem foi a parte mais assustadora de todas. Parecia que todos me conheciam, mesmo que sendo completos estranhos.

Todos os passageiros pareciam que tirariam um telefone e ligariam para Marcelo, entregando aonde eu estava.

Porém, consegui chegar até a casa, consegui passar todos esses dias fazendo tudo o que mamãe especificou em suas instruções numa folha amassada.

“Não saia até que Giulia venha até você”, “não chame atenção”, “mude sua aparência se puder”...

Olhei-me no espelho, analisando meus longos cabelos e penso se pintá-los seria a melhor opção. Porém, todas as cores que eu tento visualizar parecem tirar de mim a minha própria essência.

Experimentei roupas mais folgadas, combinações diferentes das que eu já tinha, qualquer coisa que pudesse me diferir de mim mesma se precisasse.

— Devo estar paranoica — digo para o meu reflexo.

Giulia não apareceu nessa semana, e isso me deixa ansiosa. Quando a comida deu sinais de que acabaria, a urgência em ganhar dinheiro para sobreviver aumentou.

Eu já tinha feito alguns bicos para ajudar mamãe quando os meses ficavam apertados demais. Agora é diferente, eu preciso de dinheiro apenas para não dormir com um buraco no estômago.

Isso significa me expor à procura de um serviço. Fazer meu nome circular pela enorme Genebra. Tenho medo que apenas por ter tentado comer, Marcelo me encontre.

Eu tenho uma ideia de que tipo de pai venderia a própria filha, mas tenho uma ainda pior do homem que aceita comprá-la. Mesmo assim, eu me sinto aliviada em estar livre daquele homem.

Estou preocupada com a minha mãe. Ela me pediu para não ligar, devo obedecer. Ela é uma mulher inteligente, forte e sabe o que fala.

Mas eu estou muitíssimo preocupada com ela. Antes de vir pra cá, ela me disse que o homem que veio atrás de mim era um tipo de “don”, um criminoso.

Um homem tão poderoso teria meios de me encontrar em qualquer lugar, então se ainda estou aqui é sinal de que estou fazendo algo certo.

Após boas andanças pelo mercado, e algumas respostas duras, do tipo: “não estamos contratando” ou “não preciso de ninguém que consegue entrar pela portinhola do cachorro” — minha magreza sempre provocou esse tipo de agressão — Quase desisti.

Até que uma senhora me ofereceu uma pequena remuneração para ajudá-la a vender globos de neve na feirinha turística.

Eu não preciso interagir muito com os fregueses, apenas cuidar dos pagamentos, dar trocos e ajudá-la a arrumar a barraca.

Quando ela perguntou meu nome, fiquei apreensiva, mas dei algum que fosse fácil de lembrar – embora a senhora tenha pronunciado errado o resto da tarde inteira. Isso não é um problema, ela só quer ajuda e nada mais.

Nunca fiquei tão feliz na minha vida. É apenas um emprego de meio período, mas graças a ele eu posso comer!

Hoje é minha folga, vou aproveitar e arrumar a casa. Protelei por tempo demais eliminar o cheiro de poeira. Estou tendo uma nova experiência com isso tudo. Vou até à lavanderia, pego alguns produtos de limpeza e começo a faxina.

A casa fica próxima a uma fazenda de gado que levanta muito pó quando o tempo fica seco.

Enquanto estou limpando e cantarolando, a campainha toca. Meu coração dispara e não consigo me mover.

Encaro a gaveta de talheres, lembrando-me de uma faca levemente enferrujada.

♣ ♥ ♠ ♦ Contínua no próximo capítulo. ♣ ♥ ♠ ♦

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