Sem Escolha

NO COMANDO l.

   ♥️ Valentina Becker ♥️

Saber que Marcelo vai se ausentar por uns dias me deixou super feliz. Mas estou preocupada. Por que deixar Luke ao invés de Erik? Será que ele desconfia de nós? Não, não... não pode ser. Tomei todo cuidado para não levantar suspeitas.

Saio do quarto e o homem que seria o responsável por mim não está na porta. Vejo dois seguranças desconhecidos, o que me deixa com muito medo. Marcelo sempre disse que Erik era o único que poderia me proteger. Me tranco de volta em meu quarto e vejo que há uma movimentação grande no jardim.

Meu marido vai aprontar algo grande pelo jeito...

Erik, por favor, tenha cuidado e volte para mim.

Não demorou muito e vejo alguns carros saírem acelerados da casa. Passo o dia inteiro no quarto, só abro a porta para receber o jantar que Arlete me traz.

— Luke já assumiu seu posto?

Ela coloca a bandeja em minha frente e balança a cabeça negando.

— Eu ouvi uma conversa. Dizem que Marcelo colocou ele à frente de uma missão. Deve ser algo sério.

Claro que é, ele não me deixaria sem Erik se fosse coisa simples.

— Erik está em casa? Ou ele estava em algum daqueles carros?

— Eu não vi o Erik, minha menina, talvez ele tenha ido com o patrão. Algo mais que eu possa fazer por você?

Assim como no dia em que cheguei nessa casa, me sinto completamente sozinha outra vez.

***

Não consegui pregar o olho. Saber que os três que sempre estão à minha volta agora encontram-se longe, me causa uma insegurança, e tenho a sensação de que a casa possa ser invadida a qualquer instante. Continuo trancada em meu quarto, como se aquela porta pudesse impedir alguém de entrar. Não ter o Erik e nem mesmo o ogro para discutir faz com que as horas custem a passar. Então, decido ir para o quarto da mãe dele, para então continuar a leitura do diário e conhecer mais sobro seu passado.

***

15 DE OUTUBRO DE 2000

Durante sua infância Marcelo sempre presenciou cenas muito repugnantes para uma criança, mas isso não justifica seus atos, mesmo que o pai seja um monstro ele tem a mim que sempre o repreendo e ensino que o que faz é errado, mas ainda assim faz coisas que me causam medo e me deixam muito angustiada para a idade dele. Presenciei uma cena que me deixou apavorada, uma das empregadas trouxe seu lanche no quarto, mas ele não gostou do suco, então jogou a bandeja na moça e não satisfeito com isso a seguiu até a escada e, sem que ela percebesse, a jogou lá de cima.

15 DE OUTUBRO DE 2000

Eu tentei impedir, mas já era tarde demais. Ele me olhou com arrependimento nos olhos e disse que foi um acidente, mas não foi, eu vi o prazer em seus olhos. Fico imaginando onde errei com meu filho para está se tornando um monstro como o pai. E me pergunto se ele vai aprender um dia amar de verdade ou será como o carrasco que só tem a mim ao seu lado porque sou obrigada e ameaçada todos os dias.

20 DE OUTUBRO DE 2000

Aturar isso como esposa é difícil, mas como mãe me sinto ainda pior. O fracasso como ser humano é esfregado na minha cara e não tenho como impedir. Não reconheço mais o meu filho. Erik tem passado mais tempo comigo tentando me animar, e até tenta afastar Marcelo do pai. Tenho medo que ele também seja contaminado pela maldade que vejo crescer em meu menino. Marcelo não aceita rejeição e quer dominar tudo e todos, vejo a maneira que passou a tratar os empregados, e isso me deixa arrasada. Ver meu anjinho que criei e cuidei com tanto zelo e muito amor se tornar exatamente aquilo que não queria é devastador. Tentei conversar com ele diversas vezes, mas ele se manteve afastado de mim. Talvez o erro seja meu por não conseguir disfarçar minha decepção. Eu precisava fazer meu Marcelo enxergar que suas ameaças só o levariam para própria destruição, conquistar as coisas na base do terror não é duradouro. Quando ele menos esperar as coisas vão se dissipar por meio de seus dedos e acabará sozinho. E temo que nem mesmo eu esteja aqui para ser o seu suporte no momento de sua angústia.

22 DE MARÇO DE 2001

Hoje como todos os dias desta minha vida, desde que vim pra está casa, não foi diferente. Mais uma vez o troglodita chegou nervoso e mais uma vez descontou em mim. Já não tento fugir, aceitei meu destino, mas mesmo assim sou obrigada a fazer sexo com ele sem querer. É sempre com violência. Não ligo mais com as marcas no meu corpo. Marcelo sempre pergunta por que estou machucada, e sempre dou uma desculpa, mas seu olhar pro pai também está mudando, antes olhava com admiração, agora vejo indiferença. Caesar também percebeu e como sempre me culpa.

***

Mais e mais páginas rasgadas, o que tanto você queria esconder, senhora Clark...

26 DE AGOSTO DE 2001

Marcelo está feliz com a chegada de mais um aniversário. Meu rapazinho está completando 13 anos, o tempo passou tão rápido. Já está tudo preparado, vai ser uma grande festa, ele me pediu para ir comprar um presente e fomos ao shopping. Depois, quis sair levá-lo até o túmulo de seus avós que não o conheceram, e isso não foi uma boa ideia. Caesar chegou e não estávamos, quando voltei, vi a fúria estampada em seu rosto. Ele veio com tudo pra cima de mim, mas Marcelo se pôs em minha frente pra me proteger, o que não foi o suficiente. Caesar o jogou no chão e depois me espancou. Dessa vez sua ira era maior, nem mesmo meu filho escapou de ser espancado. Depois que o maldito se retirou, a expressão do meu menino menino está mais aterrorizante que a do pai. "Mãe eu prometo que foi a última vez que esse verme tocou na senhora. Mais um vacilo que ele cometer contra você, eu vou matá-lo." As palavras de ameaça do meu filho foram a confirmação da besta adormecida dentro dele, que está sendo acordada e se tornando meu pior pesadelo.

Essa foi a última anotação dela. O aniversário de 13 anos de Marcelo ...
Ele confessou na piscina que, depois de aproveitar a festa, sua mãe foi brutalmente assassinada, salvando sua vida e a de Erik... o que me faz pensar: Por que a irmã que ele mencionou não estava na casa? Porquê meu marido não sabe da existência dela? Erik disse que a mãe e a irmã são seus grudes, por qual razão uma delas estaria longe?
Quando ele chegar eu preciso me informar sobre isso e compreender melhor o tamanho do abismo que é a vida de Ludwig, para que eu possa tentar ajudá-lo.

Folheio o diário até o fim, para ter certeza que não há mais anotações. Então encontro uma foto de uma mulher linda, ela tem a pele clara, cabelos encaracolados castanhos claros. Olhos verdes, está abraçada a Marcelo. Seu sorriso ensaiado mostra o quanto era oprimida dentro da própria casa.