Capítulo 34 - seguindo em frente

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Camille está sentada mirando a chuva que cai no jardim em frente à casa de seus pais. A xícara de chá esfriando entre suas mãos, apoiada no colo. As lágrimas, subitamente secaram desde que ela teve de começar a pensar no que fazer com as coisas de sua mãe. Isso tudo era tão injusto... Já havia se passado uma semana da morte dela, mas a casa ainda parecia conter um tipo de vibração, como se ela ainda estivesse viva. Apenas tivesse saído de férias...

- Sua mãe adorava as orquídeas que dão nessa época do ano. - Edson se aproxima com sua cadeira de rodas silenciosa e Camille quase leva um susto com a voz dele.

Ao olhar para o pai, ele está olhando diretamente para o jardim. Camille assente e volta seu olhar para lá também. Os dois ficam num silêncio por alguns instantes até que Edson suspira fortemente e bate com a mão em seu colo. Um barulho oco que chama a atenção de Camille e só então ela nota que há dois diários de capa de couro no colo do pai.

- Sabe, sua mãe me amou com um amor sem igual. Eu só lamento que eu tenha conseguido dizer isso só agora que ela se foi. Mas quando eu achava que ela havia morrido sem saber disso, eu encontrei esse diário. - ele passa a mão com delicadeza sobre a capa. - Nunca imaginei que ela também fizesse um. Aliás, tem mais de um. Esse foi o último. - Camille olha para o diário e tem vontade de arrancar das mãos do pai, mas se contém. - Ela se foi, mas deixou para mim os vídeos e as anotações necessárias para que eu não precise de ninguém para me ajudar com as lembranças e as consequências da minha doença. Quando eu vi o vídeo pela primeira vez, perguntei a ela de onde ela tinha tirado aquela ideia. Ela respondeu: de um filme que eu vi... de um livro que eu li... E hoje eu sei que mesmo que ela tenha copiado uma ideia da fantasia, ainda assim era original, pois ninguém no mundo se daria ao trabalho de fazer algo tão delicado.

Camille sente uma lágrima rolar pela face direita e ergue o olhar para seu pai. Edson está encarando-a e Camille tem a sensação de que ele a está vendo pela primeira vez.

- Você tem muito de sua mãe. - ele continua. - E eu gostaria que você ficasse com isso. - Edson retira o diário debaixo e entrega a Camille.

- Mas... - Camille franze o cenho quando vê que o que ele deu a ela não era o diário de sua mãe, mas sim, um dos dele.

- Precisamos nos conhecer. Mas antes, eu gostaria que você lesse isso primeiro. E eu espero que você encontre a força necessária para saber a hora de fazer a coisa certa.

"Bom, eu espero que na hora certa você saiba o que fazer". - Camille se lembra das palavras de sua mãe ao telefone. Ela aperta o diário do pai com as duas mãos.

- A única coisa que eu e sua mãe sempre quisemos era...

- Que eu fosse feliz. - Camille o interrompe e completa.

Edson sorri.

- Exatamente. Eu errei muito com seus irmãos. Pretendo ligar para eles, entrar em contato, conhecer meus netos... Sei que não posso apagar anos e anos de ausência... Mas o que tenho visto com essa doença, pelo menos a minha que é um caso raro, é que as novas coisas eu não esqueço. Então, eu posso fazer novas lembranças.

Camille, se não estivesse tão emocionada, iria gritar com o pai. Jogar na cara dele tudo o que ele fez desde que ela nascera. Das surras, das proibições injustas... Mas quando ele disse ter errado com os irmãos, aqueles que ela achava que o pai considerava como sendo perfeitos, ela soube imediatamente que não havia motivos para gritar com seu pai. Simples e unicamente por um motivo, dentro de si, uma nova flor brotou e essa flor se chamava perdão.

SensatrixOnde histórias criam vida. Descubra agora