· 29 · Pesadelo

956 90 103
                                    

Em setembro, a estação de King's Cross encheu-se de jovens bruxos e bruxas. Os acontecimentos terríveis no último semestre de fato afetaram o ânimo de alguns deles, criando terreno fértil para fazer brotar uma pequena semente de desconfiança, plantada pelas matérias sensacionalistas do Profeta Diário ao longo das férias de verão.

Apesar das palavras de sabedoria proferidas por Dumbledore, alguns ainda teimaram em acreditar na versão contada pelas manchetes, segundo a qual o Ministério da Magia assegurava a segurança inabalável do mundo bruxo e negava a volta do Lorde das Trevas, descredibilizando Harry Potter e taxando-o como louco.

Emily encontrava-se entre a multidão esperando o trem na plataforma. O novo físico dava-lhe um ar atlético, já que passara o verão inteiro treinando incansávelmente para os testes do time. Até os traços do rosto pareciam mais definidos e ressaltados pelos novos piercings e brincos nas orelhas. Seu olhar era vago, como se estivesse constantemente entediada. A jovem bruxa transparecia frieza.

O homem ao seu lado tinha a pele queimada de sol, cabelos castanhos bem curtos e a barba por fazer. Os óculos quadrados estavam presos numa cordinha pendurada ao redor do pescoço, para que não os perdesse por aí. Apoiado no carrinho, batucava uma melodia alegre no malão da filha.

A garotinha entre os dois deveria ter no máximo uns dez anos, vestida com seu casaco azul turquesa e agarrada à um gato preto inquieto, tentando escapar de seus braços. O animal tinha um discreto lacinho amarelo amarrado no pescoço, ao qual mordiscava a fim de arrancar à qualquer custo.

Quando os vagões do trem começaram a ser ocupados, Emily despediu-se do pai e da irmã. O gato finalmente foi colocado no chão, seguindo obediente e desviando dos pés afobados que ainda procuravam por cabines vazias. Depois de algum tempo, a porta de uma delas se abriu logo à frente.

– Emily! – Lee Jordan colocou metade do corpo pra fora e chamou, depois saiu e ofereceu passagem para que ela entrasse. – Sente-se conosco. Ainda temos um assento vago. – a jovem espiou lá dentro brevemente e viu os gêmeos conversando.

– Não, obrigada. – ela disse rispidamente.

– Pode entrar... A gente não morde. – George apareceu e tentou fazer carinho no gato, que mostrou os dentes pontudos e guinchou, querendo atacá-lo com suas garras afiadas. – Opa! Mas parece que não é o caso desse camarada aqui.

– Eu já disse que não quero, você é surdo por acaso? – Emily retrucou impaciente e ajustou a bolsa sobre o ombro.

– Nem chegamos à Hogwarts e ela já está irritada. O que foi que fizemos dessa vez, querida? – Fred recostou-se no batente da entrada da cabine, numa pose bastante despreocupada.

– Vou te dizer o que foi – Emily avançou na direção dele e encarou o ruivo. – As coisas vão mudar, Weasley. Pretendo ficar bem longe de idiotas como você. – mas os dois estavam, na realidade, bem próximos.

Ela se afastou com prepotência, jogando uma mecha de cabelo para trás. O gato mostrou os dentes e guinchou para o trio, arrepiando-se por inteiro antes de sair atrás da dona, dessa vez se enroscando entre as pernas de quem passava como se achasse graça em fazê-los tropeçar.

– Agora sim essa garota enlouqueceu. – Fred assoviou e jogou-se no assento, esticando as pernas preguiçosamente no lugar vago ao seu lado. Lee fechou a porta da cabine.

– Não sei, Fred. – George sentou-se à frente do irmão – Mas não se preocupe... Com certeza não tem nada a ver com o fato de você tê-la beijado e desaparecido sem dar satisfações.

– Ou ter feito isso justamente depois que a coitada perdeu o melhor amigo num acidente trágico, em circunstâncias misteriosas. – Lee acrescentou.

Os dois lançaram olhares feios para Fred, que apenas balançou a cabeça e cobriu o rosto, preparando-se para tirar um cochilo. Mais adiante, Emily observava a paisagem das colinas pela janela da cabine, devorando sapos de chocolate e bolos de caldeirão.

No jantar, após a seleção e o banquete, o diretor Dumbledore posicionou-se ao centro do salão para falar com os alunos, como de costume. Entretanto, uma irritante mulher de casaquinho cor-de-rosa interrompeu-o rudemente, a fim de iniciar o próprio discurso com sua voz aguda.

"(...) Vamos caminhar para a frente, então, para uma nova era de abertura, eficiência e responsabilidade, visando a preservar o que deve ser preservado, aperfeiçoando o que precisa ser aperfeiçoado e cortando, sempre que encontrarmos, práticas que devem ser proibidas."

Emily, que prestara atenção em cada palavra, ficou quieta absorvendo as informações. Definitivamente algo sobre aquela situação incomodava-a e em breve descobriria o porquê. A mulher com cara de sapo e olhos saltados certamente representava uma ameaça, silenciosamente se infiltrando na escola.

– O que acha que ela quis dizer com "práticas que devem ser proibidas"? Não deve ser nada extremo, certo?

Anabel e Emily especulavam as verdadeiras intenções de Dolores Umbridge enquanto se acomodavam no dormitório feminino da Lufa-Lufa.

– Reparou como os outros professores também não pareciam gostar dela? – Emily comentou, sacudindo e arrumando os lençóis da cama para deitar-se. – Vai ser um ano escolar bem interessante.

– Talvez com alguém do Ministério da Magia por perto, Harry Potter não tente se aventurar outra vez.

– Anabel...

– Sei que discorda, mas é a verdade. – ela fechou o malão e passou as mãos pelos cabelos. – Eu só queria ter um ano escolar tranquilo e normal, mas desde que ele chegou, parece que esse lugar se tornou um campo de batalha.

– Ainda que Harry Potter nunca tivesse vindo à Hogwarts, tenho certeza que jamais teríamos um ano normal ou tranquilo com os gêmeos Weasley estudando aqui.

– Falou com eles no trem? – Anabel questionou.

– Não foi nada demais. Como eu disse, estudamos na mesma escola. Querendo ou não, vamos acabar nos esbarrando por aí.

– Eu entendo... Mas desde que você tente manter uma certa distância, vai ser o suficiente.

– Sabe Anabel, seria bem mais fácil evitá-los se houvesse uma razão de verdade pra isso.

– Eu já disse tudo o que precisa saber.

– "Se afaste" e "confie em mim", não são exatamente as melhores explicações que alguém gostaria de receber numa situação como essa. – Emily reclamou, guardando os coturnos num canto do quarto e se deitando na cama.

– Quanto menos você souber, menos envolvida vai estar. E não me faça essa cara... É assim que deve ser. É mais seguro assim.

– Eu vou dormir. – ela rolou e embolou-se nas cobertas. – Me avise se alguma coisa mudar no plano infalível que tramou nessa sua cabecinha extraordinariamente meticulosa.

Mas pouco importava. Independente do número de vezes que Anabel tivesse aquela visão, tudo sempre se repetia da mesma maneira...

E ela faria qualquer coisa pra impedir que aquele pesadelo se tornasse realidade.

The Castle On The Hill | Fred WeasleyOnde histórias criam vida. Descubra agora