· 24 · Lar Doce Lar

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"(...) Lembrem-se de Cedrico Diggory. Lembrem-se, se chegar a hora de terem de escolher entre o que é certo e o que é fácil, lembrem-se do que aconteceu com um rapaz que era bom, generoso e corajoso, porque ele cruzou o caminho de Lorde Voldemort. Lembrem-se de Cedrico Diggory."

O diretor Dumbledore encerrou seu discurso. O ano letivo chegara ao fim, mas o a morte de Cedrico era uma lembrança vívida cruel demais.

Emily passou tanto tempo no dormitório encarando o teto, que acabou decorando cada fragmento, mancha e rachadura presente nele. Ela nunca chegou a se lembrar como fora o restante daquela fatídica noite, ou dos dias que seguiram-se. Aquela semana se tornou um espaço em branco em sua memória. Todas as vezes que pensava sobre os seus primeiros dias vivendo o luto, não havia nada além de fragmentos, manchas e rachaduras... Vestígios de sua perda.

Ainda não tinha se recuperado da dor de perdê-lo, é claro, embora estivesse aos poucos se recompondo. Tinha trocado cartas com os pais de Cedrico para verificar como estavam. Amos Diggory manteve o convite para visitá-los no verão, como sempre faziam, temendo que este ano a casa ficasse vazia sem a presença de Cedrico. Esperava que com as amigas dele ali, houvesse parte de seu filho também.

Os alunos começavam a se despedir das delegações estrangeiras, de malas prontas para voltar para casa. O céu estava limpo, sem nuvens e o ar era fresco e agradável. Fazia um belo dia de verão, ainda que nem todos pudessem aproveitá-lo realmente...

Os céus não se importam com o luto de ninguém. O sol não vai deixar de brilhar só porque uma nova estrela surgiu.

Na viagem para King's Cross, Anabel, Emily e Francis deram a sorte de conseguir uma cabine vazia em um dos vagões e prontamente a ocuparam.

– Como estão? – Francis perguntou com a voz mansa. Sabia que era um assunto delicado, mas precisava se certificar de que não guardassem as dores para si.

– É péssimo. – Emily contemplou o assento livre ao seu lado. Cedrico gostava de reunir-se à elas no vagão em que estivessem, mesmo que ficasse somente por alguns minutinhos livres entre as rondas como monitor. – Como se eu ainda pudesse vê-lo bem aqui conosco.

– Vai levar um tempo pra nos acostumarmos... Se é que isso é possível. – Anabel disse. – Argh! Não consigo ficar aqui dentro. Preciso dar uma volta, respirar um pouco.

– Eu te acompanho. – Francis ofereceu gentilmente. – Quer alguma coisa do carrinho, Emily? Podemos ir buscar para você.

Ela negou. Quando os dois deixaram a cabine, Emily começou a brincar distraidamente com o pingente de camafeu pendurado no colar em seu pescoço. Dentro dele, a silhueta minúscula de um Cedrico sorridente acenava para ela. Um sorriso cujo brilho cessou, apagou-se e perdeu-se, para todo o sempre.

Lembrou-se de todos os planos e promessas que fizeram juntos. Cada um daqueles momentos vividos com Cedrico, especialmente os últimos. As coisas que apenas ele sabia, porque Emily achou que não poderia confiar à mais ninguém. Segredos, abraços, conversas, risadas e até as lágrimas.

A ironia residia no fato de que Cedrico, a pessoa que odiava vê-la chorar, fora justamente a causa de uma de suas maiores lamentações.

A porta foi aberta numa pequena fresta e Lee enfiou a cabeça por ela tentando espiar lá dentro. Ele soltou uma exclamação e empurrou o restante da porta, ao que ele, George e Fred entraram sem formalidade alguma e tomaram conta dos assentos restantes.

– Por que está aqui sozinha? – Lee Jordan perguntou.

– Anabel e Francis foram juntos comprar doces. – Emily disse.

– Não quis ir? – ele insistiu. – Não está deixando de se alimentar outra vez, está? – ela negou veemente.

– Credo, Lee. Você por acaso tem vocação pra babá? Ela está bem. – Fred disse casualmente, tentando aliviar o clima desconfortável que começou a surgir. – Não é, Emily?

Embora Fred estivesse usando seu costumeiro tom brincalhão para camuflar sua verdadeira intenção, a pergunta era um questionamento genuíno. Ele realmente estava interessado numa resposta honesta. Emily sentiu-se tentada a dizer à ele que não, que estava despedaçada e vazia, mas optou por uma versão mais simples.

– Já estive pior. – ela deu de ombros.

– Viu só? Não tem motivo algum para se preocupar. – disse Fred, embora estivesse sim preocupado.

– Eu? Preocupado? Humpf... Não fui eu quem passou o último mês contrabandeado tortas de limão da cozinha para um certo dormitório da Lufa-Lufa, foi? – a fala fez os gêmeos instantâneamente amarrarem a cara para Lee.

– Estive mesmo me perguntando onde é que Anabel estava arrumando tantas tortas de limão, se não sabe como entrar na cozinha. Imaginei até que Dobby estivesse envolvido, mas isso – apontou de um ruivo para outro. – faz muito mais sentido.

– Vejam só! Melhor irmos dar uma olhada naqueles três ali, George. – Fred desconversou, apontando para Draco, Crabbe e Goyle, que haviam acabado de passar pelo corredor. Ele saiu da cabine sem pensar duas vezes.

– É... Não é bom deixá-los sozinhos por muito tempo, entendem?– George seguiu o irmão.

– Se não os conhecesse, poderia até acreditar que estavam com vergonha. – Emily disse assim que os dois desapareceram dali.

– Não se engane, Emily. – Lee se espreguiçou no assento confortávelmente. – Sei que esses dois podem parecer panacas insensíveis, mas tem lá seus sentimentos. Quando você fica mal, eles definitivamente se importam. Fizeram o melhor que podiam... Do jeito esquisito deles, é claro. Mas foi o que aconteceu.

Lee e Emily continuaram a conversar pelo resto da viagem. Anabel e Francis retornaram à cabine pouco depois, carregando uma variedade de doces que despejaram ao lado da garota.

Emily achava que faltava uma parte de si ali, mas estava feliz por ter a companhia dos demais. O silêncio que preenchia os lugares quando estava sozinha era bom para pensar, mas trazia uma melancolia com a qual ainda não aprendera a lidar.

O barulho do apito do trem e as engrenagens lentamente parando, anunciaram a chegada à plataforma. Os alunos se atropelaram pelas saídas, carregando bagagens pesadas, amontoados de doces pendendo dos bolsos e gaiolas com bichos de estimação reclamando, à sua maneira, da correria  que balançava-os de um lado para o outro. Quando a jovem finalmente conseguiu desembarcar, seu pai e sua irmã já a esperavam acenando, seus semblantes tranquilos e receptivos. Ela correu em direção à eles e abraçou-os, com o coração aliviado por se livrar de um pouco da saudade que sentira.

"Como é bom estar em casa." Emily pensou, ainda envolta naquele abraço reconfortante e protetor.

As pessoas que amamos sempre serão nossos lares.

The Castle On The Hill | Fred WeasleyOnde histórias criam vida. Descubra agora