Horas mais tarde, quando Porcelana deveria estar na escola e Amaldiçoado dormia para fugir do mundo, a mãe dela e o pai dele se reuniram na cozinha e se sentaram na mesa.
— Eu não suporto mais viver nessa agonia todo dia por causa do seu filho, Adilson. — confessou a mulher. — Ou você sai daqui com ele, ou ele vai ter que sair.
— Mas... — o homem olhou para baixo, triste. — Ele é o meu filho...
— Um meio monstro!? Você já viu o estado dele?! Porcelana disse que ele parece um urso, de tão grande e peludo que está!
— Continua sendo meu filho, Nazaré!
— Então se você se importa com seu filho mais do que com sua mulher e a sua outra filha, vá embora com ele!
— Como?! Eu não consigo viver sem você! — olhou para os olhos da esposa, mas não conseguiu manter a postura, e os baixou de novo.
— Mas é claro! Tudo o que é seu hoje era meu quando nos casamos. Essa casa, o carro, o dinheiro pra pagar as contas! Não aguento mais ter que sustentar você e esse seu monstro que você chama de filho! Quer saber?! Suma da minha vista!
Adilson ainda olhava para o chão. Nazaré olhava para ele com desprezo e ódio, esperando que ele reagisse, que fosse corajoso, pelo menos daquela vez. Mas ele apenas virou para ela com os olhos marejados, e disse:
— Adeus.
Ela fechou os punhos com raiva, arrancou o anel de ouro da sua mão direita e o jogou pela janela. Sem palavras, a mulher gritou e saiu batendo os pés pela casa, e pouco depois se ouviu o som forte dela batendo a porta da garagem. O motor do carro foi ligado, e, em seguida, o veículo foi se afastando em alta velocidade. Deixado sozinho, Adilson suspira com o fato de que agora não teria mais dinheiro além do que havia escondido nos seus sapatos.
Foi até o seu quarto, que agora não iria mais ser seu, abriu o lado do guarda-roupa com suas coisas, pegou um punhado de casacos, camisas, calças e meias e os jogou na cama. Depois escavou mais o mar de coisas lá dentro e achou um enorme moletom grosso de um azul profundo, e um gorro inocente de lã com um tom de azul mais suave. Puxou uma calça e meias feitas por alguém não tão habilidoso com a costura (ele mesmo), um par de galochas, e um cachecol verde, antigo. Jogou essas roupas do outro lado da cama, para diferenciá-las das suas.
Depois de vestir-se, preparando-se para sair de casa, ele pôs todas as roupas em uma mala, foi até a porta do porão, e encarou a fechadura reforçada. Respirando fundo, ele a abre.
— O que você quer, Porcelana? — ouviu a voz do seu filho.
— S-se vista. Nós dois vamos viajar de trem. — diz o homem, se esforçando para não tremer.
— E as outras?
— Que o fogo do inferno aqueça seus corações de gelo.
Um pouco assustado, Amaldiçoado se virou para a silhueta covarde do pai. Ela não mudou em nada. O rapaz não entende. Mas mesmo assim, o admira.
— Finalmente alguém que me entende. — diz ele, se levantando na escuridão.
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A Cidade do Sol
Bilim KurguEm um continente que só chove, o sol é a única esperança. Desde que os céus fecharam, as vidas dos habitantes de Belarus se tornaram frias e sem sentido. Numa busca desesperada por propósito, adolescentes começam a desenvolver o que chamam de "maldi...