Capítulo 29

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A neve brilhava sob o céu cinza-prateado e flocos grandes desciam flutuando e derretiam na pele de Lisa conforme ela atravessava o campo aberto.

Os sapatos achatados e compridos que havia feito facilitavam a caminhada pelo solo congelado sem afundar na neve macia. Desejou ter pensado em fazer algo assim há muito tempo. Mas como poderia? Esses sapatos não eram… qual era a palavra? Não precisava tê-los, mas era legal tê-los.

Sua mente viajou, as palavras da mulher da foto flutuando em volta de sua cabeça. Conversava com ela, às vezes, fazia-lhe perguntas, tentava adivinhar quais seriam suas respostas.

Às vezes, como hoje, quando queria distrair a mente do frio do inverno, dizia as palavras que lhe traziam paz.

Ela as dizia repetidamente até seu coração se acalmar e, assim, encontrava algo de bom sobre o dia. Sobre a vida.

Sobre sua presença em um mundo que só fazia sentido de uma maneira física.

Para Lisa, os escritos da mulher eram seus amigos, ela era seu padre da história que ela nunca havia realmente lido e sua professora. Ela a amava, mesmo não a tendo conhecido. Ela também a visitava, às vezes, na base daquele desfiladeiro. Se sentava do lado de fora do carro onde ela morrera, dizia palavras para ela e para o homem. Ela se perguntava se haviam morrido na hora ou se haviam sofrido.

Se perguntava onde estava a filha deles ― a garota. Ela sentia tanta tristeza.

Queria poder tê-los salvado. Queria que estivessem vivos e pudesse conhecê-los. Ela faria à mulher todas as perguntas em sua mente e em seu coração. Ela tinha muito mais palavras do que Lisa conhecia.

Em seu faz de conta, ela respondia. Lisa fechava os olhos e a ouvia falar, mais claramente do que a voz embaçada de sua Yâa.

Fazia cinco invernos desde que encontrara o carro e a mochila azul, e por mais que não pudesse dizer que sua vida era fácil, os escritos que encontrara haviam deixados as coisas… melhores.

Não tinha certeza do porquê, exatamente. Só sabia que os escritos a fizeram mudar de ideia sobre querer morrer. Será que ela quis mesmo morrer? Não. Quis que a dor acabasse, a solidão. Os escritos a fizeram se importar com a vida.

Suas pernas musculosas empurravam uma tábua para frente, depois a outra, deslizando pela neve, sua respiração saindo em nuvens brancas um segundo antes de serem levadas pelo vento.
Um movimento chamou sua atenção e Lisa desacelerou, sentindo seus músculos tensionarem ao avistar uma pessoa ao longe, à sua direita. Se esconder? Escapulir? Não.

Agachou-se ao posicionar uma flecha no arco e mirar em direção à ameaça.
Era… uma mulher?

Lisa abaixou o arco e flecha, ficando de pé novamente, os batimentos de seu coração desacelerando, perguntas girando em sua mente. Medo.

A mulher estava andando rapidamente até ela, dando passos largos na neve, que afundavam e, com muito esforço, ela levantava seus pés um atrás do outro de novo e de novo. Lisa estava paralisada de choque e confusão. Conforme se aproximava, Lisa viu que ela não estava usando roupas de inverno e muitas partes de sua pele estavam à mostra. E ela parecia estar chorando, lamúrias que faziam seu peito subir e descer e que
Lisa podia ouvir de onde estava.

Lisa deu dois passos em direção à mulher no mesmo segundo em que ela a avistou. Ela parou e, então, moveu-se na direção de Lisa, acelerando seus passos, tropeçando, caindo e levantando-se novamente.

— Socorro! — gritou. — Socorro!

Lisa seguiu rapidamente em direção a ela, que tropeçou novamente, erguendo-se em seguida, seu choro ficando mais claro conforme se aproximava.

Selvagem - Jenlisa (G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora