Fragmentos de quem éramos (parte 2)

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Kenny não conseguia sequer respirar. Aquele diante dele não podia ser Rivaille.

"Eu o deixei no acampamento." Repetia para si mesmo. "Esse não é ele. Ele nunca me olharia assim."

Sim, aquele cara jamais seria seu sobrinho. Aquela coisa parecia o ressentir como se sequer fossem família, mas mesmo assim, o fato de ter alguém com o rosto e voz do baixinho ranzinza a quem tanto amou empunhando uma arma para ele o despedaçava por dentro de tal forma que não conseguiria colocar em palavras, nem se lhe pedissem.

Quando viu as inúmeras estacas se formando no ar e aquele espectro azul surgir, concluiu que era definitivamente seu fim. Estava preso e impossibilitado de se defender aos pés daquele majin então apenas resignou-se a fechar os olhos não querendo ver o que viria a seguir.

"Sei que parece covarde, mas não me atrevo a olhar... Não quero que minha última lembrança seja a desse monstro me atacando com o mesmo rosto do meu menino..."

E entretanto o tempo passou sem que nenhuma dor o atingisse.

Ele continuou esperando. Gritos, gemidos e o som de carne rasgando alcançaram seus ouvidos sem que conseguisse abrir os olhos e quando finalmente ousou espiar por pensar que estava demorando muito para que o outro o atingisse, deparou-se com o cenário macabro das estacas ainda flutuando e movendo-se com rapidez, mas agora com diversos corpos de humanos empalados tingindo-as de vermelho vivo. Alguns ainda respiravam, encarando-o e lhe esticando a mão numa vã tentativa de se agarrar a algo inexistente, como se ele pudesse os salvar de um inevitável fim.

Seus olhos lacrimejaram. A raiva que aquele massacre lhe causava se misturava com o medo de ser o próximo e a angústia de não saber o que viria a seguir.

Estava suando frio. Olhando para os lados pode ver os poucos sobreviventes ao redor tremerem de medo pouco antes de serem atingidos também, mas agora por estacas vindas do chão que os partiam, rasgaram e desmembravam da mesma forma que ele antes havia feito com os majins:

- Você é um monstro... - sua voz soou em um fio.

- Foram vocês que pediram por isso - Levi rebateu decidido, embora hesitasse em encarar o resultado de seu ataque vil. Eram pessoas afinal, mesmo que fossem seus inimigos e Ymir sabia o quanto queria ter encontrado outra solução para aquele conflito, só que essa solução não existia.

- Maldito...

- Eu pedi...! -exaltou-se choroso diante do insulto- Eu realmente pedi para que desistisse, tio. Mas o senhor não quis me ouvir!

- Você não é meu sobrinho! - respondeu exaltado causando ainda mais lagrimas no rosto do herdeiro de Ymir.

- Acho que realmente não sou mais, não é? -murmurou sorrindo amargamente- Depois que me tornei isso, no seu ponto de vista eu já não sou mais digno de ser parte da família... Hanji estava certa em nunca ter te contado que tinha sangue majin. O senhor nunca a aceitaria se soubesse!

As palavras fizeram os olhos de Kenny se arregalarem. Hanji era meio majin? Por isso ela os tinha abandonado? E como aquele ser diante dele sabia daquilo? 

Será que... Ele era realmente Rivaille? 

O que tinha acontecido para que seu menino terminasse assim? Como ele havia chegado ali tão rápido? O que tinha realmente acontecido com ele no tempo em que ficou preso dentro da floresta labirinto? 

Será que ele havia realmente sido enfeitiçado em algum momento ou tudo era apenas um grande mal entendido?

De repente era como se a realidade tivesse lhe dado um tapa violento e ele era incapaz de lidar com isso. A imagem de Yamar dizendo que cuidaria do rapaz horas antes tomava sua mente fazendo-o refletir sobre o quão pouco sabia.

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