Lágrimas que apagam as chamas

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Repleto de ataduras, sendo injetado com dezenas de medicações e ouvindo uma enxurrada de palavras as quais não dava a mínima atenção, essa era a situação em que Kenny se encontrava.

A dor em seu corpo era excruciante, mas ele não parecia se importar. Sentia-se fraco e ofegante pela perda de sangue somada com a exaustão da batalha e mesmo a imagem de seu braço caído a alguns metros de seu corpo em meio a uma mancha vermelha era incapaz de lhe tirar alguma reação diferente daquele olhar que oscilava entre o apático e o magoado.

A lembrança do jovem com os olhos azuis luminosos passando direto por ele para socorrer aquele maldito majin se repetia em looping em sua mente deixando-o completamente perdido e, principalmente, inconformado. Aquele não era seu sobrinho.

Lágrimas vieram aos seus olhos conforme se lembrava da primeira vez que pegou o rapaz de olhos cinzentos nos braços, ainda tão novo, tão pequeno e frágil... Ele era um bebê lindo, com as bochechas gordinhas e rosadas. Lembrava-se de ter dito à irmã o quanto o garotinho se parecia com ela quando pequena e de receber de volta um sorriso radiante da mulher, um sorriso que nunca mais pôde voltar a ver, pois quando finalmente teve a chance de a encontrar novamente, ela era apenas mais um entre os muitos corpos que teve de empilhar.

Culpava-se tanto por isso...

Sempre tão ocupado... Sempre deixando as visitas para depois. Ele acreditava que sempre haveria um "amanhã" para voltar para casa e encontrar a irmã, o cunhado e seu adorável Levi brincando pela casa. Claro, ele correu para a vila quando soube do ataque, mas já era tarde demais. Ao menos lhe consolava saber que tinha chegado a tempo de salvar o sobrinho que, mesmo soterrado em meio aos escombros e com parte do corpo queimado, ainda respirava.

Arrependia-se muito de não ter passado mais tempo com a família, mas tentou compensar. Depois de tudo, dedicou-se completamente ao menino que criou como se fosse seu, afinal, Levi, ou melhor, Rivaille, era tudo o que lhe restava e esforçou-se para o educar da melhor forma que pôde, mesmo com toda a sua inexperiência nessa difícil tarefa de ser um pai.

Tinha tanto orgulho do seu garoto... Do homem que e se tornou... Ele era forte, gentil e dedicado, mas também sabia ser firme quando precisava. Cuidava das pessoas, mesmo quando não mereciam e não hesitava em defender aqueles que não eram capazes de o fazer por si mesmos, usando suas lâminas contra os impiedosos monstros mágicos que ameaçavam a humanidade.

Realmente, Rivaille era um exemplo de pessoa para se espelhar. Um bom caçador e um bom homem... Estava feliz com a possibilidade de se aposentar do cargo de chefe da guilda deixando o rapaz em seu lugar, mas então... Então aquilo aconteceu.

Greenwood. Aquela maldita floresta e o maldito majin que a controlava. Aquele lugar e os monstros que viviam lá tinham envenenado a mente de Rivaille o enfeitiçando.

"O que aconteceu com o meu moleque?" Ele pensava incrédulo com o rumo que as coisas tinham tomado. "Rivaille não é assim. Ele nunca escolheria um majin ao invés de um humano. Ele nunca me deixaria para trás... nunca..." uma lágrima escorreu a qual tentou enxugar com a mão direita. apenas para se lembrar que ela, assim como seu braço, já não lhe pertenciam mais.

"Meu Rivaille... Meu garoto... Que tipo de lavagem cerebral fizeram com você que te fez ignorar o meu estado para ajudar o monstro que tentou me matar? Como posso te trazer de volta? Eu só quero que tudo volte ao normal..."

-  Não acredito que ele realmente foi embora com aquela carcaça de majin e ainda nos fez gastar medicamentos com um seguidor de Ymir! - Erd reclamava deixando o chefe ainda mais abalado.

- Cala a boca, cara. Eu vou parar de tratar a sua perna! - Oluo respondeu apertando o tecido que usava para tentar imobilizar o tornozelo do colega fazendo com que os olhos do chefe finalmente se desviassem da poça de seu próprio sangue para os encarar enquanto discutiam como crianças.

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