Obras de arte

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(Por Patthama - Homenagem a todas as mulheres que são guerreiras)

Decidi não interferir no envolvimento das meninas, desde que a minha neta estivesse feliz, isso me tranquilizava.

Eu não perdi nada quando me casei com o avô de Yoko e sofri muito quando os pais dela morreram, o meu marido e eu a criamos e poucos anos depois ela precisou cuidar de mim.

Às vezes a culpa me consumia por ter roubado a infância da minha menina, eu não escolhi isso pra ela e quando a Yoko cresceu se tornou tão responsável que me enchia de orgulho.

Eu a amava muito, mas sabia que ela estava sofrendo e isso me quebrava por dentro.

Quando soube que tinha câncer, já era tarde demais, resolvi me calar e continuar vivendo, aquela doença me mataria em mais ou menos dias, só precisava criar coragem de contar a Yoko.

Pensei em fazê-lo depois do centro cultural, contudo desisti ao encontrarmos com as amigas da minha menina, foi um bom dia... Aproveitei-o para jogar todas as minhas lamentações fora rabiscando em um painel em branco cores que simbolizavam algo e para a minha surpresa, a professora de artes adorou a minha pintura.

Iria pedir para a Yoko comprar tintas e telas, ao menos isso me distrairia dos momentos ruins que com certeza viriam.

Mas percebi que a minha menina estava mais dispersa, ela chegava mais cedo em casa e sorridente, olhava todos os dias pela janela um carro preto que só partia quando ela se afastava de lá.

Isso foi estranho.

Yoko já tivera um namorado, um delinquente paquerador, não gostava daquele rapaz e discutia diversas vezes com ela por causa disso, não sei se dou graças a Deus por ela ter enxergado o tipinho de homem que o garoto era ou se chorava com ela por descobrir que foi traída.

Joguei uma indireta à minha neta para ela revelar quem era a pessoa no carro e quando ela me respondeu que era uma médica, os seus olhos brilharam de uma forma que não tinha visto antes, perguntei se elas estavam se relacionando e ela negou, resolvi pressiona-la para que me contasse sobre os próprios sentimentos e só assim ela confessou.

A médica... Uma mulher mais velha que a Yoko, com a vida bem estruturada e uma boa profissional, um ser humano que aos meus olhos era iluminado, eu me lembrava dela da última vez que tive uma crise e fui atendida por ela.

Pesquisei o endereço da clínica e sem avisar ninguém fui pra lá, a Yoko já se encontrava na faculdade e não descobriria a minha fuga já que a tonta da cuidadora ficava mais preocupada em paquerar pelo celular do que cuidar dos afazeres.

Eu confrontei a doutora, mesmo ela sendo gentil comigo, necessitava acalmar os pensamentos, quando o assunto era a Yoko eu não conseguia dar voz totalmente a razão.

Mas a doutora me garantiu que gostava da minha menina e eu vi em seus olhos sinceridade, também notei que ela era uma mulher digna e inteligente, "se eu falasse toda a verdade das minhas condições ela manteria o segredo?", pensei...

Ela me trouxe em casa e a convidei para entrar e tomar um café comigo e a doutora aceitou, falei sobre a Yoko e o meu ex marido, contei sobre a juventude da minha neta, das suas lutas e de seus medos, ao menos os que eu sabia.

Ela me escutou de boa vontade e por fim contei sobre o meu amor pela pintura e a minha doença.

Seu rosto corado ficou pálido assim que terminei a minha confissão e pedi a ela que não falasse nada a Yoko, eu tinha que saber se ela manteria a boca fechada.

Neste dia Yoko demorou pra chegar e quando entrou não esperou o carro preto sair, esperei ela me ver na mesa, ela caminhou na minha direção e por fim dei a notícia.

Só vi a minha neta um dia após eu ter falado tudo e para a minha surpresa, a doutora Faye a acompanhava, notei que elas estavam de mãos dadas, o que significava que elas se acertaram.

Eu me sentia tranquila por saber que a Yoko não acabaria sozinha e em paz, mesmo com a morte me rondando, já não precisava esconder da minha menina as dores e o cansaço, às vezes fingir estar forte pode ser mais exaustivo do que a própria doença.

E durante aquela semana que se seguiu, as amigas de Yoko vieram mais vezes em casa me visitar, a doutora também e trouxe com ela várias telas, pincéis e tintas, de acordo com ela, a pintura era uma boa forma de passar o tempo e de expôr o que rondava a minha mente.

Eu amei o presente e Yoko ajeitou um canto da casa para eu usar.

Enquanto a minha menina continuava a sua rotina, adquiri uma nova, acordava cedo, tomava o café da manhã e já partia para o meu canto, as primeiras telas que criei foram de paisagens de lugares que visitei, eu fechava os olhos e lembrava deles, os cheiros e as pessoas.

Passei então a pintar pessoas, Yoko uma noite posou junto com a doutora e fiz o retrato delas, a Marissa também quis um e eu a presenteei.

Na semana seguinte, recebi mais telas e tintas da doutora, a Yoko reclamou no início, mas com jeitinho conseguimos dobra-la. Yoko passou a sair do trabalho e ficar algumas horas com a doutora e eu apreciava isso, dava para notar que elas se completavam:

- Vovó - Yoko tocou em meu ombro para me chamar a atenção - A Faye quer levá-la em um restaurante hoje, vamos?

- Se ela não se importar de esperar alguns minutos - Respondi voltando a pintar.

Yoko foi chamar a doutora e quando entraram, elas foram olhar os meus quadros, elas conversaram tão baixo que não pude ouvir, então Yoko a levou para a sala.

...

- Espero que a senhora goste de massas, aqui eles tem um cardápio variado - A doutora falou assim que fomos pra mesa.

- Eu amo... Macarronada, lasanha... Mas a melhor de todas é a pizza de mussarela.

- Concordo vovó - Yoko falou.

- Bom - Ela pegou o cardápio com uma garçonete e o olhou, Yoko e eu fizemos o mesmo - O que vocês vão querer?

Escolhemos os nossos pratos e aguardamos, eu pedi um suco de laranja por causa dos remédios não deveria consumir álcool, as meninas vinho tinto. Ficamos conversando até que a garçonete voltou a mesa com os nossos pedidos.

Foi uma noite extremamente agradável, a doutora Faye era uma mulher incrível, não era a toa que a minha menina ficou apaixonada por ela, contudo a beleza dela chamava bastante atenção dos homens e das mulheres e às vezes eu via a Yoko se contorcer na cadeira controlando-se para não falar demais... Era óbvio que ela estava ficando com ciúmes.

Isso ficou mais evidente quando a garçonete que nos atendeu trouxe a conta e ao pegar o cartão da doutora, pegou em sua mão com um sorriso sínico de quem gosta de provocar.

A doutora nem deu importância, mas a Yoko quase esbravejou, lhe segurei a mão e sussurrei pra ela ter calma, no final tudo deu certo e voltamos pra casa.

Após ficarmos sozinhas, a minha neta e eu, fomos para o meu quarto, me sentia muito cansada:

- Vovó, preciso te falar uma coisa - Yoko disse enquanto eu me ajeitava na cama.

- Não pode deixar para amanhã filha?

- É rápido... Prometo.

- Está bem, o que foi?

- A Faye quer fazer uma exposição com as suas pinturas, ela disse que a senhora é uma artista e merece ser reconhecida.

- Ela está sendo gentil.

- Acredito que não seja apenas gentileza vovó, a família dela é rica e ela sempre teve convívio com obras de arte.

- Não sei se aguentaria ficar de pé por muito tempo ou ter muitas pessoas ao meu redor Yoko.

- Pensei nisso vovó, se você topar fazer a exposição, a gente vai dar um jeito nessas questões.

- Vou pensar, está bem?

Yoko me deu um beijo na testa e depois de me desejar boa noite se retirou para o seu quarto, a ideia de ter as minhas telas exibidas era até interessante, mas eu fiquei com medo de ser rejeitada ou criticada e isso eu não iria tolerar.

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