Capítulo 16

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Uma voz sussurrava meu nome constantemente no meio do caos sonoro. Era uma voz doce, gentil e, ao mesmo tempo, sedutora. A forma como me chamava me fazia querer segui-la, mas ela insistia em se manter no escuro.

— Eliza! Eliza! — continuou me chamando.

— Onde? Onde você está? — gritei com todas as minhas forças. Meus sentidos sempre foram bem aguçados, mas isso fugia completamente das minhas capacidades. Não parecia ter uma direção certa, mas também não parecia vir de mim como quando falo com Lisa.

— Eliza! — chamou novamente, mas desta vez foi diferente. Ela estava cantarolando meu nome.

"A música..." pensei, focando no som e reorganizando-o mentalmente. Aos poucos, os ruídos ao meu redor começaram a se ajustar, alinhando-se e formando uma harmonia sob meu comando.

Tudo começou a fazer sentido quando aquela voz tornou a me chamar. Era a minha própria voz! Assim que a reconheci, vi a mim mesma na minha frente. Estiquei minha mão em direção a ela e minha própria imagem fez o mesmo. Diferente de mim, ela tinha um sorriso iluminado.

— Eu sou você! Me encontre! — disse meu reflexo para mim. Assim que nossos dedos se tocaram, uma forte luz tomou conta de tudo.

— Quente — sussurrei. Tudo na minha cabeça estava muito confuso quando abri meus olhos.

— Finalmente! — Era a voz de Lohan. Sua respiração estava pesada enquanto ele me apertava contra ele. — Minha pequena, o que aconteceu?

— Companheiro, eu estou sufocando — falei, tentando sair de seu aperto. Imediatamente ele afrouxou os braços. Enquanto eu puxava o ar para dentro, olhei o ambiente em volta. Estávamos no quarto dele e eu estava presa no meio de um casulo de cobertores. Me esgueirei para fora dos cobertores e enxuguei o suor do meu rosto.

— Você estava gelada, por isso te cobri — explicou ele. Será que ele precisava mesmo me envolver com tantos cobertores?

— O que aconteceu? E a reunião?

— Você não lembra? — perguntou-me em um tom sério. Isso me fez puxar da memória os últimos acontecimentos. Um aperto grande tomou conta de mim enquanto eu olhava para o meu companheiro e me lembrava que foi a minha família a responsável por dar cabo no pai dele.

— Eu sinto muito! — Senti as lágrimas escapando e baixei a cabeça. — Sinto muito pelo que aconteceu com o seu pai!

— Você não tem culpa — disse ele ternamente, colocando a mão sob o meu queixo e elevando o meu rosto para que eu pudesse olhá-lo nos olhos. — Não foi a sua família que o matou, foi o Devorador. O que seus ancestrais fizeram foi libertá-lo para que ele pudesse partir em paz. Sou grato a eles por isso!

As palavras dele me acalmaram um pouco. Ele tinha razão, o lobo sombrio era só um zumbi controlado pelo Devorador. O pai dele já havia partido antes disso. Mesmo sabendo disso, eu não conseguia não ficar triste.

— Lohan, por que o seu pai atravessou a barreira? Ele não sabia que morreria se fizesse isso?

— Ele sabia, mas pensou que pudesse ter uma chance. — A voz de Lohan se tornou séria e sombria. Ele apertou mais os braços à minha volta e eu sentia a dor emanando dele. Uma ferida ainda não cicatrizada...

— De quê? — Tudo que eu queria era compreendê-lo. Não podia mais fechar meus olhos se quisesse ajudá-lo de agora em diante.

— De acabar com o Devorador. — Era como se o ambiente tivesse esfriado alguns graus enquanto eu compreendia aonde ele queria chegar. Se o projeto dos portais fracassasse, só haveria mais uma forma de acabar com o Devorador.

— Ele queria matar a todos do outro lado? Por quê? Ele não queria resgatá-los? — Afastei-me de Lohan e encarei-o novamente nos olhos. Era horrendo pensar que Lucon recorreria a algo assim.

— Não havia perspectiva de que o plano dos portais daria certo. Eu estava doente naquela época. Não suportava mais ficar sozinho e não tinha mais vontade de viver. Minha mãe não conseguiu lidar com a situação e acabou morrendo primeiro. Ela se culpava por gerar a criança amaldiçoada e por não dar o filho que meu pai merecia. Tudo o que aconteceu foi demais para o meu pai suportar. No dia em que enterrou minha mãe, ele me fez prometer que continuaria vivendo e jurou que acabaria com a maldição para que eu pudesse encontrar a minha felicidade. Eu não fazia ideia do que ele pretendia fazer, ninguém fazia...

— Ele provavelmente pensou que com o poder de um rei, conseguiria fazer isso sem envolver sacrifícios — ponderei, imaginando como a história continuava. Lucon era gentil demais para mandar um exército de lobos se matar na barreira só para exterminar o outro lado. Seriam mortes demais, então preferiu lidar com tudo sozinho.

— Ele não estava pensando direito e acabou se aliando às criaturas erradas. Além disso, o poder do rei foi transmitido para mim assim que ele morreu no Devorador. Mesmo que ele pudesse atravessar com os poderes, não conseguiria usá-los devidamente já que perderia o acesso à principal fonte dele.

— E qual é a fonte do poder do rei? — perguntei intrigada.

— De onde vem o poder dos alfas? — perguntou de volta.

— Do juramento — respondi confiante. Ele acenou negativamente a cabeça, me deixando um pouco confusa.

— Devoção pela lealdade e obediência — respondeu-me seriamente. — O juramento é só uma forma de forçar a conexão primária do bando ao seu líder. Uma vez ligados, o sentimento de submissão e afeição nasce e isso une a todos em prol do coletivo. O alfa, como o cabeça, é quem controla isso, bem como o poder mágico que recebe do bando. Para o rei isso é diferente. Não preciso da submissão e da lealdade de ninguém, apenas preciso que eles existam. O poder mágico de cada lobo de Éldrim está ligado a mim e é isso que me torna tão poderoso. Só que no outro mundo, eu perco acesso ao poder que emana de Éldrim.

O número de lobos da Terra é extremamente inferior ao de Éldrim. Além disso, a geração de lobos que vive do outro lado é muito mais fraca devido à hibridização com humanos. Isso torna o poder do rei insuficiente para magias mais poderosas no outro lado, algo que Lucon não sabia.

— O que te fez continuar com o projeto dos portais? — Não pude deixar de questionar. Se até mesmo Lucon tinha jogado a toalha, Lohan, como a principal vítima, tinha tudo para desistir e recorrer a medidas mais extremas.

— Esperança! Meu pai cumpriu o que me prometeu quando trouxe esperança para a minha vida, então decidi honrá-lo mantendo o seu desejo de resgatar a todos. Até o último momento, não desistirei de fazer isso da forma correta.

Destino: O Rei AmaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora