Capítulo 103

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Visão de Lohan: O Passado...


Tal alegria que ela me dera foi rapidamente substituída por um sentimento de preocupação profunda, quando ela parou de me ver dois dias depois. Ela sempre me avisava quando não viria, e por não o ter feito, eu só conseguia pensar que algo muito errado havia acontecido. Ray estava me deixando doido, e por mais que eu quisesse ir atrás dela, não conseguia. Se o cristal de invocação fosse um de meus súditos, já teria sido executado por insubordinação e traição.

A cada dia que se passava sem notícias, mais preocupado eu ficava. Comecei a procurá-la em outras zonas enquanto mantinha a imagem da cachoeira aberta em um canto. Fiz isso inutilmente por vários dias, até que um dia, uma canção suave trouxe novamente um pouco de alívio ao meu coração. Desfazendo todas as imagens inúteis, foquei meu poder na garota que estava sentada no lugar de sempre, balançando os pés dentro da água.

— Senhor misterioso, que bom que veio! — disse ela, sorrindo e chorando ao mesmo tempo. — Me perdoe por não ter podido vir te ver nos últimos dias e por não ter avisado antes. Também peço desculpas se lhe preocupei com o meu sumiço. Senti muito a sua falta!

— Se sente muito, então não faça mais isso! — ordenei. Ela não deveria assustar o rei assim! — Você também me fez uma tremenda falta, pequena! Estava quase enlouquecendo aqui!

Meu lobo que o diga. Essa garota realmente conseguia trazer à tona todos os meus sentimentos de forma extrema. A mais intensa alegria, a mais intensa dor, a maior preocupação de todas, bem como o maior alívio.

— Aconteceu uma coisa alguns dias atrás e eu perdi o manto que você deixou comigo. Sinto muito por isso também. Eu disse que ia guardá-lo com cuidado, mas falhei — disse-me ela, com os olhos se enchendo de lágrimas.

— Se for por isso, não se preocupe! Te darei quantos mantos você quiser! — Eu odiava vê-la chorando, odiava o sentimento de impotência de não poder fazer nada! — Por favor, me conte o que aconteceu! Preciso saber!

— Eu fui seguida? — perguntou ela, assustada, intensificando os sentidos. Antes de ter certeza, pulou na água e nadou até a queda. Enquanto deslizava para dentro da caverna, um lobo macho de coloração castanho-avermelhada apareceu.

— O que aconteceu? — rosnei inquieto, vendo a garota se esgueirar para dentro da água apavorada. Parecia tão vulnerável que meu instinto era querer envolvê-la protetoramente. Em vez de me responder, ela sussurrou um pedido.

— Você pode me avisar quando ele se for? Saia por um momento quando o lobo que me seguiu for embora, assim saberei que a área está segura.

— Por você, faço qualquer coisa! — respondi, mudando meu ângulo de visão. Eu não poderia ver ela e o lobo pela imagem ao mesmo tempo, mas escolhi uma zona em que pudesse pelo menos ouvir minha garota enquanto vigiava o lobo.

Quem quer que fosse, sabia exatamente quem estava procurando e era persistente. Ele sondou minuciosamente toda a área e, por ter encontrado vestígios da Eliza, recusou-se a ir embora. Certo de que ela estava em algum lugar nos arredores, até mesmo saltou na água procurando entre as rochas a presença dela. Após voltar para a margem, tomou forma humana. Quando vi que usava uma bermuda feita a partir dos próprios pelos, concluí que poderia ser o tal suposto companheiro da minha garota, o filho do alfa.

Gravei nitidamente o rosto dele enquanto meu lobo se enchia de fúria por dentro. Por menosprezar minha garota, por assustá-la, pretendia puni-lo devidamente um dia.

— Eliza! Eu sei que está por aqui! Apareça! — gritou aquele homem.

— Por que ele? — ouvi a voz da minha garota choramingar e voltei novamente o ângulo de visão para ela. Ela estava extremamente pálida e tremia muito. Estava congelando, e vê-la naquele estado deixou o meu lobo maluco.

— Foi esse o idiota que roubou meu manto. Ele é o herdeiro alfa, o companheiro de quem te falei — sussurrou enquanto tremia de frio. — Usei o seu manto para me proteger de ser abusada por ele, mas não acho que terei mais truques para usar se ele me emboscar de novo. Estou com medo!

— ELE TENTOU ABUSAR DE VOCÊ? — rugi. A energia de Ray explodiu enquanto ele tomava o controle. As garras dele se fincaram com força contra o chão só por imaginar o que minha pequena deve ter passado para estar dessa forma.

"Se esse homem ousar tocar na minha fêmea, ele morre!", rosnou Ray furioso, andando de um lado ao outro nervosamente.

— Eliza, eu ordeno que apareça agora! Eu prometo que não lhe farei nada! — aquele homem gritou.

— Será que devo acreditar nele? — ela perguntou para mim, criando coragem de sair da água gelada. Ao vê-la de pé, tive certeza de que não aguentaria mais se esconder daquela forma. Ela estava tão apavorada que preferiu congelar na água para mascarar ao máximo o seu cheiro e reduzir riscos. Eu queria muito estar lá para aquecê-la e protegê-la, queria muito evitar que aquele homem a encontrasse e a machucasse.

— Vai! Se ele descumprir sua promessa, lhe darei a morte mais longa, dolorosa e cruel de todas! — exclamei enquanto reprimia o meu lobo. A vida dela era prioridade e estava claro que ela não estava pensando direito quanto a isso.

— Ele não vai desistir. Se eu não aparecer, tenho certeza de que as coisas ficarão piores para mim. Preciso aceitar a oferta de paz. Tentarei voltar o mais breve possível e te explicarei tudo com calma, prometo — falou-me com suavidade, mais preocupada em me tranquilizar do que a ela mesma.

Estive tão focado nela, acompanhando seus movimentos, que não reparei no que acontecia atrás de mim. Assim que ela saltou para fora, o movimento que fez chamou a atenção do homem, que pulou na água atrás dela. Pegando-a com cuidado, nadou de volta para a margem e, tirando-a da água, fez o que eu não conseguia fazer daqui: abraçou-a contra ele para tentar aquecê-la.

— Eliza, por que fez isso? Você está congelando! Ficou o tempo todo escondida na água? — A voz do homem, bem como toda a postura corporal, era a forma correta de um macho se preocupar com sua fêmea. Senti-me inquieto ao perceber que, por mais que ele tivesse tido atitudes incoerentes, parecia realmente se importar com ela. No fim das contas, eles tinham algo que eu não tinha: o vínculo!

"Ela é minha! É minha!", reclamou Ray, irritado. Ele odiava ver outro homem tocando nossa garota dessa forma.

A garota se transformou sem tirar as roupas, estilhaçando-as em pedaços só para não se mostrar para ele. Após isso, começou a correr. O homem se transformou logo em seguida e ficou de forma protetora na retaguarda dela. Se ela ficasse segura até eu poder buscá-la, talvez eu pudesse mostrar alguma misericórdia a ele.

Assim que ela se foi, virei-me enquanto desfazia a magia de projeção consciente. Foi quando notei que o cristal de invocação estava ali.

— Não! — implorei enquanto corria até ele. Ele já não respondia mais, enquanto retrocedia ao seu lugar. A brecha havia novamente surgido e eu não a enxerguei a tempo. Senti-me extremamente frustrado imaginando que eu poderia tê-la encontrado novamente e não aproveitei.

Como ele se ativa? Por que ele se ativa sem o comando? Eu não podia deixar de pensar que tinha algo a ver com a ligação que eu e a garota tínhamos, como se os céus quisessem nos dar uma chance de fazer a nossa história acontecer.

Para o meu alívio, a garota voltou a me encontrar regularmente depois disso e estava feliz. Conseguira se livrar de seu companheiro indesejado ao mesmo tempo que atingia uma posição de destaque dentro do clã, provando-me mais uma vez o quanto ela é especial.

Queria dizer que tinha muito orgulho dela pela posição que alcançara, mas não podia. Eu não queria que ela se arriscasse com um trabalho tão perigoso. A vida e a segurança dela eram mais importantes para mim do que qualquer outra coisa. Ela me avisou que, se não aparecesse para me ver nos dias combinados, seria por conta de alguma convocação de emergência. Esperava que isso nunca fosse acontecer, que eu encontrasse uma forma de trazê-la para mim primeiro, mas nesse ponto os céus não me foram favoráveis.


Destino: O Rei AmaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora