Capítulo 13

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A recomendação de Lohan foi tão boa que rapidamente me vi imersa em uma leitura que durou quase três dias. Os reis mais poderosos de Celestria se uniram para criar uma magia de fenda artificial. O rei das fadas, a rainha das bruxas, o rei dos tritões, a rainha das ninfas, o rei dos elfos e o rei celestial. O objetivo era trazer os descendentes dos lobos de volta por eles para que o Devorador pudesse ser erradicado. Rapidamente perceberam que era inviável. Demandava-se muito poder mágico para abrir uma fenda, e mantê-la aberta, mesmo que por poucos segundos, era quase impossível.

Após isso, a rainha das bruxas Willow, o rei das fadas Eraply e o novo rei dos lobisomens, Lucon, se uniram para formular uma nova estratégia em torno da criação dos portais. Levou-se centenas de anos para o projeto ser concluído. Para que pudesse dar certo, os recursos certos deveriam ser enviados para o outro lado e as águas que se conectariam ao lago prateado deveriam ser demarcadas por meio de uma fusão mágica.

A ideia era como pescar peixe. Lança-se a isca e puxa-se o peixe que a fisgar. É por isso que Lohan falou que os portais só funcionavam para um lado. A estrutura inteira tinha sido projetada para isso, mas, para que eu e Lohan conseguíssemos estar juntos, uma brecha surgiu magicamente.

"O poder do amor", pensei comigo mesma. Nosso amor nos conectou um ao outro e ele pôde vir me buscar. Isso era tão especial! Balancei minha cabeça algumas vezes afastando meus pensamentos de garota apaixonada e voltei a devorar a história no livro.

Para o projeto dar certo, Lucon reuniu os recursos. É o que Éldrim, com sua vasta extensão territorial, podia oferecer. A rainha das bruxas, especializada em joias, criou os artefatos mágicos, implementando os selos e magias necessários em vários objetos que, quando tocassem as águas, liberariam a magia de Eraply, marcando a fonte e criando a conexão. É assim que a rede de pesca seria criada.

Para que o plano desse certo, alguém precisaria ser o responsável por levar os artefatos para o outro lado. Mais uma vez, os principais reis se uniram, e estes foram convencidos de que criar a fenda artificial resolveria todos os problemas. O primeiro emissário foi escolhido, e por unanimidade, decidiu-se que deveria ser um lobo de grande confiança. Apenas um lobo poderia ganhar a confiança de outro lobo. A missão não era difícil. Ele precisaria passar pela fenda, marcar as fontes de água e anunciar o comando a todos para que soubessem como atravessar.

Com as fontes demarcadas, seria muito mais fácil saber o que se passa do outro lado sem usar magias complexas provenientes de poderes espirituais. A conexão seria possível por meio do sistema de reflexão mágico, e é dessa forma que o lobo de confiança enviado se comunicaria com o seu rei.

Os artefatos estavam prontos, tudo estava preparado. Através da união dos grandes reis, a fenda artificial foi criada e o primeiro emissário atravessou. O nome dele era Rowan, herdeiro alfa do clã dos lobos vermelhos. Logo no primeiro dia, a primeira fonte foi demarcada. Assim que a conexão foi estabelecida, os primeiros testes foram realizados e eram promissores. O projeto tinha tudo para funcionar.

Como não se esperava que os descendentes de Luna viessem por bem, a ideia era usar a crença deles a favor do projeto. Rowan se anunciaria como um sacerdote vindo dos céus a mando da deusa Luna e profetizaria as invasões. Com a comunicação entre os lados, os monstros certos seriam enviados pelo Devorador para que a mensagem de Rowan fosse vista como divina. Após ganhar a confiança deles, ele os convenceria de que a "Grande Mãe" os esperava do outro lado do portal.

Sorri enquanto admirava a astúcia desses reis envolvidos. Com uma estratégia dessas, como o plano não deu certo? Descobri isso algumas páginas depois.

O primeiro problema surgiu dias depois, ao perceberem que não havia mais fontes sendo demarcadas. Os dias se tornaram semanas, as semanas se tornaram meses, e o ritmo de demarcação das fontes era demasiadamente lento. Após mais de um ano, apenas quatro fontes haviam sido demarcadas, e não fora algo proposital.

Através do sistema de observação das águas, descobriram que Rowan havia perdido todas as memórias. Assim que atravessou a fenda artificial, ele não se lembrou mais de quem era ou por que estava lá. A mensagem nunca foi transmitida, e isso levou os reis a se reunirem mais uma vez. A escolha de um segundo emissário foi feita e novas medidas para a preservação de memórias foram implementadas. Dessa vez, o lobo a ser enviado foi escolhido pela bruxa Willow. Segundo ela, o lobo em questão era um dos poucos nas condições mágicas necessárias para a implementação de um selo de preservação de memórias. Seu nome era Cian, um jovem que descendia de uma mulher do clã dos lobos sacerdotais e de um homem do clã dos lobos nevados.

Como já se pode imaginar, Cian levou vários artefatos com ele, mas assim como Rowan, ele nunca completou a missão. O selo de preservação de memória não funcionou. A vida de ambos foi relativamente curta. Ambos os emissários morreram assassinados. Rowan, cerca de vinte e dois anos depois, vítima de arma de fogo humana, e Cian, cerca de seis anos depois, condenado pelo próprio clã por traição, por se juntar aos rebeldes que queriam destronar o alfa da época. Em teoria, ambos sobreviveram por tempo suficiente para gerar descendência, lobos mais poderosos e puros, e isso acabou piorando drasticamente o problema com o Devorador.

Foi após os emissários que o Devorador cresceu até chegar no território das bruxas. A ideia das fendas artificiais caiu em descrédito perante os reis e foi abandonada. O custo-benefício de se enviar mais lobos ao outro lado não valia a pena.

Comecei a comparar as informações que eu tinha daqui com as que estudei do outro lado. Ao longo da história do meu mundo, os genes mais fortes sempre acabavam encontrando companheiros entre os mais fortes, o que me faz acreditar que uma das coisas que determina o companheiro predestinado seja o fator genético. Provavelmente todas as famílias principais dos clãs, alfas, betas e gamas descendem de Rowan e Cian. A julgar pelo meu pelo branco, eu tinha quase certeza que descendia de Cian. O pelo castanho avermelhado de William veio de Rowan.

Fechei o livro com a sensação de que havia alguma coisa errada. Mesmo que com o passar dos anos mais e mais fontes fossem demarcadas até que quase toda a área fosse coberta, não havia como a informação sobre o comando para se abrir os portais chegasse ao outro lado. Por que, mesmo depois que tudo deu errado, o projeto permaneceu ativo? Aproximei-me cautelosamente do meu companheiro. Ele estava sentado em sua poltrona analisando uma série de documentos. Passei os braços em torno do pescoço dele e beijei várias vezes sua bochecha, tentando chamar a atenção para mim.

— Diga, companheira. — Ele parou o que estava fazendo e pegou o meu braço direito, puxando-me para o colo dele.

— Companheiro, terminei de ler o livro.

— E o que quer saber?

— Há alguma profecia sobre o retorno dos lobos? — Para mim, é a única coisa que justificaria a criação e manutenção do projeto. — Você é o rei que trará os lobos de volta?

— Minha pequena, por que você é tão esperta? — Embora suas palavras fossem gentis, havia tristeza em sua face. — Eu não sei a resposta para isso, a profecia não é clara.

— E qual é a sua profecia? Vai me dizer dessa vez? — Algo nos meus olhinhos curiosos o convenceu.

— Eu sou o rei destinado a destruir o Devorador!

Destino: O Rei AmaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora