Capítulo 104

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Visão de Lohan: O Passado...


Na primeira madrugada em que Eliza não veio me encontrar sem aviso prévio, comecei a procurá-la em todas as zonas dentro das fronteiras de Siram. Logo descobri que uma invasão de média magnitude estava acontecendo, típica de envio de tropas de controle. Convoquei imediatamente os meus guardas que servem próximos à fronteira com o território dos monstros para irem até lá averiguar e fazê-los recuar. Caso não fossem acatados, ordenei que matassem qualquer um que se aproximasse da barreira sombria. Eu não podia ir pessoalmente até ela, mas a ajudaria da forma que pudesse.

Não consegui pregar o olho e ignorei completamente meus afazeres reais enquanto permanecia procurando-a. Quando finalmente a encontrei, fui tomado por uma angústia sufocante. Ela estava lutando sozinha contra duas bruxas zumbis do elemento fogo. Vi-a se ferir na minha frente sem conseguir fazer nada para evitar, e isso era aterrorizante.

— Ela até que é forte! — comentou Ray orgulhoso ao vê-la arrancar habilmente a cabeça de uma das bruxas. Ela parecia estar assumindo o controle da luta, prestes a arrancar a cabeça da outra bruxa, mas então recuou, claramente tonta. Seus movimentos estavam muito mais lentos e ela parecia ter dificuldades em se concentrar. Quando mudei o ângulo de visão, percebi que uma terceira bruxa zumbi estava se aproximando.

"Psíquica!", concluí comigo mesmo, vendo minha lobinha perder o controle e se atirar na água. Incapaz de reagir, ela estava afundando para a morte, e isso me levou ao limite da loucura. Eu faria absolutamente qualquer coisa para salvá-la.

— Willow, Eraply, Lucon! — pronunciei, invocando por conta própria a pedra e concentrando todo o meu poder nela em uma tentativa desesperada de abrir uma brecha para atravessar. Por mais poder que o meu lobo me transmitia, o portal não se abria de jeito nenhum. Essa não era a primeira vez que eu tentava fazer isso, mas me empenhei como nunca, disposto a dar todo o meu poder por uma única chance.

"Eu a sinto!", disse Ray, conectando-se à loba dela. O portal não se abriu, mas de alguma forma a conexão entre nossos lobos voltou a ocorrer misteriosamente.

"Lute!", ordenei à minha lobinha, enviando minha força a ela e trabalhando para desfazer todos os zumbidos em sua mente. Mantive-me focado em manter a mente dela livre e em lhe emprestar o máximo de poder que conseguia por essa fraca conexão. "Estou com você!"

"Estou exausto!", comentou Ray, encolhendo-se dentro de mim após cumprir seu papel. Sentei-me aliviado assim que minha lobinha branca derrotou sua última adversária. A conexão era ruim, não tinha sintonia, e meus poderes não tinham a mesma força do outro lado. Isso demandou tanto poder que precisei pegar emprestado muito mais do que geralmente fazia.

— Como você está aqui? — perguntou a garota, se aproximando da água. Ela estava chorando. Por que está chorando, minha lobinha? Queria tanto colocá-la em meu colo e abraçá-la, dizer que o pior já passou e que tudo ficaria bem. — Você veio me procurar porque não fui te encontrar na cachoeira? Aconteceu uma emergência, uma invasão massiva pelas fronteiras, e acabei tendo que vir lutar. Não sei por que as bruxas estão atrás de mim. Já acabei com quatro delas. Espero que não tenha mais.

Quatro? Por que tantas bruxas atravessaram? Senti que precisava entrar em contato com Willow o quanto antes, mas não conseguia tirar os olhos dela. Ela parecia cansada, e eu sabia que o que vi era apenas uma fração de tudo o que ela já tinha enfrentado.

— Oh, eu sei que falei que não podia me espiar sem roupas, mas vou abrir uma exceção desta vez porque você me salvou.

Eu amava admirar seu corpo, mas era a última coisa em que eu pensava nessas circunstâncias. Analisando os danos que ela sofrera, atentei-me à queimadura em seu braço, preocupado com a dor que pudesse estar sentindo. Eu detestava vê-la se machucar!

— Ainda não acabou. Preciso continuar lutando. Muito obrigada pela ajuda, senhor misterioso!

— Não faça isso! Não lute mais! — Eu estava atribulado. Não basta o que já passou? — Ao menos fique por perto onde eu possa te ver. Por favor, eu imploro!

Infelizmente, meus apelos não a alcançaram. Ela vestiu um daqueles trajes estranhos antes de sair correndo. Não consegui parar de olhar para a imagem, ansiando por atravessar e ir atrás da minha lobinha. Eu não podia perdê-la! Por vezes, já começava a duvidar de que conseguiria fazer a brecha funcionar de novo, e isso só me deixava mais estressado e extremamente arrependido de não tê-la trazido quando tive a oportunidade.

Meu coração se encheu de fúria quando a vi novamente, momentos depois, com uma marca vermelha em sua face esquerda. Pior do que vê-la voltar ainda mais machucada do que quando partiu, foi descobrir que isso fora feito pelo homem que deveria tê-la protegido. Ele não só não fez nada para salvá-la como ainda a machucou mais. Como se isso não bastasse, ele ainda teve a coragem de tratá-la de forma rude e desrespeitosa na minha frente.

— Esse moleque realmente está implorando pela morte! — rugi. Ray concordou prontamente, louco de vontade de estraçalhar aquele tolo. Acho que eu nunca tinha sentido tanta raiva em toda a minha vida.

— Viu, senhor misterioso? Ele nunca acredita em mim! Ainda bem que tenho você! Ai! — Assim que aquele homem forçou o rosto dela a se virar para ele, senti o sangue escorrendo pelas minhas mãos. O ódio foi tanto que acabei infligindo dano a mim mesmo para me conter.

— Volte para a base! Não precisamos mais de você aqui. — disse aquele homem friamente.

— Você não vai me bater porque saí sozinha? Vai mesmo me mandar voltar desacompanhada? E se eu for atacada de novo? — Lágrimas e mais lágrimas, e tudo o que eu podia fazer era ficar olhando, impotente.

— Você não é forte o suficiente para lidar com tantas bruxas sozinha? Precisa de reforço para quê? — Assim que ele a soltou, Eliza se virou e saiu correndo sem nem olhar para trás. Enquanto eu observava aquele rosto desprezível, jurando a mim mesmo que iria vingá-la, um dos guardas se aproximou dele.

— Senhor, não acha que está pegando pesado demais com a garota?

— Eu preciso. — Toda frieza no olhar daquele homem se foi no mesmo instante, seus olhos ficaram vermelhos enquanto ele tentava conter as próprias lágrimas. — É o único jeito de fazê-la desistir disso. Ela é importante demais para viver uma vida se arriscando em batalhas. Um susto agora a salvará no futuro.

"Ele se importa!", falei com Ray. Isso me deixou atordoado. Se ele se preocupa com ela, por que age de forma tão incoerente? Entrei em conflito comigo mesmo, temendo que ela percebesse isso e se reaproximasse dele. Eu deveria ser egoísta e torcer para que ele continuasse sendo um estúpido? Ou deveria torcer para que ele agisse bem e correr o risco de perdê-la? Ele ainda é o companheiro dela afinal, e eu, um simples observador, o intruso.


Destino: O Rei AmaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora