Capítulo 101

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Visão de Lohan: O Passado...


— Quem te machucou assim? — Eu ansiava por saber quem era o meu inimigo, mas ao mesmo tempo não podia ignorar o estado dela e ainda precisava ser cuidadoso para não a assustar. Sua pele estava fria e suas mãos trêmulas. Rapidamente ajeitei a manta em torno dela e a abracei contra o meu corpo para aquecê-la. Poder tocá-la e senti-la assim ainda era surreal demais para mim, e me vi em conflito enquanto tentava me convencer de que era real.

— Senhor fantasma, de onde você é? — perguntou-me enquanto se aconchegava em meus braços. Parecia bem mais calma, indícios claros do quanto confiava em mim. Eu não queria desapontá-la.

— Do outro lado, em um mundo que existe além daquilo que vocês chamam de fronteiras sombrias.

— E como você chegou aqui? — sua voz doce quase me tirou do foco do que vim fazer. Senti como se ela estivesse me enrolando e coloquei na lista de coisas que eu pediria prestação de contas quando ela estivesse melhor.

— Não vim falar de mim — repreendi-a. Eu estava preocupado demais para permitir que ela continuasse se desviando do assunto. — Preciso entender o que se passa dentro de você. Não quero que me diga só as coisas boas, mas que me conte as ruins também. Quero que desabafe comigo suas tristezas e que não sorria para mim se não estiver bem.

— Você realmente quer saber? — perguntou-me com a voz um pouco ansiosa.

— Sim! — não imagina o quanto...

A respiração dela acelerou no momento em que começou a me falar sobre seus pais e sobre a sua origem. São coisas que ela nunca tinha me revelado e fiquei surpreso em saber que ela é uma amaldiçoada da lua nova, um novo enigma a ser desvendado dentre todas as surpresas que essa garota me trouxe. Os colegas dela não a evitavam só porque era uma recém-chegada no clã, mas também porque pensavam que ela não tinha e que nunca teria sua loba.

Eu não conseguia assimilar essa informação. Ela era tão jovem, conseguira a Lisa tão cedo e, ainda assim, sentia um vínculo do companheiro. Isso não deveria ser possível. Essa garota definitivamente não é normal.

Ray estava certo de que ela é a nossa rainha, e quis muito tirar minha mão de seus olhos para ter uma confirmação, mas não consegui. Eu estava inseguro e com medo, sentimentos que, por quase nunca os ter tido, não sabia lidar.

Foi então que ela começou a contar sobre o seu suposto companheiro e a forma estúpida como ele agia com ela. Tomei cada uma de suas dores, imaginando como me sentiria se fosse comigo. Me irritei por saber que ela cogitou dar uma chance ao cretino, mas eu compreendia que havia o poder do vínculo agindo e ela não tinha culpa de se sentir confusa.

Embora a história tivesse sido bem resumida, ela o fez de uma forma em que tudo fazia sentido. Ela me deu nomes, motivos e circunstâncias. Ela explanou seus pensamentos de forma clara e compreendi que a maioria dos seus hematomas viera de alguém em quem eu não podia simplesmente descontar minha ira. Isso não significava que eu não poderia protegê-la. Eu faria absolutamente tudo por ela se ela me permitisse.

— Lobinha branca, você quer vir comigo? — Ray queria que a levássemos de qualquer jeito, mas sentia que ela ainda não estava preparada. A forma como ela hesitou e se calou provava isso. Eu provavelmente não conseguiria lidar com a sua rejeição se ela começasse a me odiar por forçá-la. O que ela pensa sobre mim me importa demais!

"Ela está dormindo!", comentou Ray. A respiração da garota estava suave e a expressão em seu rosto serena. Coloquei-a cuidadosamente de volta no saco e deslizei meus dedos suavemente em seu rosto, completamente maravilhado em poder tocá-la assim.

— Eliza, você é minha! Não se esqueça disso! — falei enquanto me agachava para beijar seus lábios. É algo que eu queria muito fazer há tempos. Antes de cumprir meu objetivo, senti o poder que mantinha o portal aberto vacilar. Era como se eu estivesse perdendo a conexão com o outro lado. Rapidamente tirei os brincos da garota e corri para o portal.

Não tive dúvidas de que, por pouco, não fiquei preso do outro lado. Marquei o tempo em que isso aconteceu e comecei a fazer uma análise detalhada tentando encontrar o motivo pelo qual eu estava perdendo a conexão com esse mundo. O tempo coincidiu exatamente com o fim do eclipse lunar.

No meio das minhas ponderações e anotações, o dia estava clareando e isso me fez voltar a atenção novamente para a garota, arrependido de tê-la deixado. Quando o fiz, estava seguro de que, se eu pude ir até ela uma vez, poderia voltar novamente, mas agora estava com receio de que não fosse tão fácil, de que o milagre pudesse não se repetir. Eu não pretendia desistir de qualquer forma, ainda mais agora que via uma possibilidade real onde antes não existia.

Eliza estava tão feliz se agarrando à manta que eu dei a ela que me senti um tolo por achar que ela poderia me desprezar. O sorriso deslumbrante em seu rosto enquanto se aproximava da água me dizia que ficaria bem.

— Você realmente veio, não é? Ficou me esperando acordar? O que nos separa? Por que não podemos nos encontrar sempre?

— É mais complicado do que imagina, pequena!

Queria muito que ela pudesse me ouvir. Eu sequer tive a chance de lhe dizer como vir até mim. Estava tão focado em compreendê-la e consolá-la que esqueci de lhe passar a informação mais vital.

Ela se calou por um instante, como se estivesse conversando mentalmente com a sua loba e, elevando as mãos até as orelhas, finalmente notou que eu levara seus brincos.

— Então foi uma troca? Meus brincos são valiosos, então cuide bem deles. — O sorriso no rosto dela fez valer a pena todo o risco que corri por ir até ela. — Em troca cuidarei bem disso.

Ela apertou as mãos em torno da manta com mais força, como se eu tivesse lhe dado algo de valor inestimável. Uma simples manta ganhou um enorme significado para a garota simplesmente porque fui eu que lhe dei. Como meu coração não se derreteria?

— Minha pequena, você realmente consegue me tirar do sério! — Enquanto eu me perdia nela, recebi um aviso telepático do meu avô me lembrando que eu já estava atrasado para a reunião. Queria ficar mais tempo com minha pequena, mas não podia.

— Já sinto sua falta! — disse-me ela docemente. — E nem posso te chamar de senhor fantasma mais, porque sei que é alguém de carne e osso. Me sinto muito melhor graças a você. Obrigada!

Me senti imensamente feliz, tanto por ela dizer que sentia minha falta quanto por saber que eu cumprira meu objetivo de consolá-la.

— Também sinto sua falta! — respondi com sinceridade enquanto me virava, pronto para cumprir com as minhas obrigações. Olhei para os brincos na minha mão. Os peguei da garota porque a pedra neles não existe em meu mundo. O conselho não queria uma justificativa para o meu atraso? Eu a tinha e com provas!

Destino: O Rei AmaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora