5 - "Temos cinco anos?"

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Minha busca pela residência de Ambika podia não ter rendido os frutos que eu esperava, mas encontrar Eric e uni-lo com o pai garantia um quentinho no meu coração. E ter a presença de uma criança tão animada quanto ele era animador. E depois de tudo que havíamos passado, precisávamos de coisas animadoras por perto. Eu precisei mais ainda depois que papai descobriu que o rastreador de Ambika havia parado em minhas mãos.

- Você está louca?! – papai irrompeu pela porta do meu quarto no inicio de uma noite.

- Você precisa ser mais especifico. – resmunguei para seu rompante de raiva.

- O rastreador, Alicia. Estou me referindo ao rastreador. – explicou bufando. – Você só pode estar de brincadeira se acha que vou permitir que você ande por aí com um dispositivo que pode levar sabe-se-lá-quem direto para você.

- É o meu coração que eles querem, vão vir atrás de mim com ou sem o rastreador. – dei de ombros. Não havia nenhuma mentira ali.

- Sim, é o seu coração que eles querem. – concordou e eu podia ver a raiva cintilando nos seus olhos que eram espelhos dos meus. – Mas nós não vamos facilitar. Me entregue o rastreador e vou providenciar para que seja destruído.

- Não é justo. Vocês sempre decidem tudo, desta vez eu vou decidir. Vou ficar com o rastreador e quando chegar o momento, vamos saber quem está atrás de mim.

- Não sabemos se realmente há alguém atrás de você.

- Ambika não colocaria um rastreador nela própria, não faz sentido. Tem mais alguém nessa com ela.

- Mesma que tenha, Alicia, é perigoso. Não vou por a vida da minha filha em risco apenas por uma hipótese. Se, realmente, existe outra pessoa por trás de Ambika ela é muito poderosa, mais do que possamos lidar, talvez. Ambika era poderosa demais para ser controlada facilmente, se havia alguém por trás dela, temos que temer do que essa pessoa é capaz.

- Eu sei, papai. – levantei da cama e caminhei até ele. – Eu tenho noção do perigo e do que estou me metendo, mas pela primeira vez, eu tenho certeza que manter o rastreador comigo é o correto. Essa pessoa está atrás do Coração Azul há séculos, vamos acabar com isso de uma vez. Deixe ela vir, vamos lidar com ela.

- E se não conseguirmos lidar com ela? – perguntou papai cansado.

- Se não conseguirmos lidar com ela, vou parar meu coração antes que ele possa ser tomado. – revelei em voz baixa.

Eu sabia que não era isso que papai esperava ouvir. Nem eu queria pronunciar aquelas palavras, mas elas eram verdadeiras. Se algo fosse acontecer e perdêssemos meu coração, eu não ia permitir que ele caísse em mãos erradas. Ele pararia de bater antes mesmo que alguém pudesse gritar "não". Haveria outros Corações Azuis depois de mim, mas quem sabe até lá Fantasiverden já estivesse preparada para lidar com a ameaça que ele representava.

- Nunca mais diga isso. – papai aproximou-se e segurou meus ombros. – Antes de qualquer coisa, vamos proteger você acima de tudo. Você é a Princesa de Dois Mundos, não vai ser morta apenas para deter o Apocalipse.

Abracei papai e contive uma risada. Não era uma risada divertida, era uma risada para não chorar. Papai estava errado, eu pararia meu coração para deter o Apocalipse sem pensar duas vezes. Eles podiam proteger a minha vida o quanto quisesse, mas eu não deixaria de proteger a deles também.

Eu não tinha noção da proporção de poder do Coração Azul, não fazia ideia das coisas que era realmente capaz, mas eu sabia que ninguém iria machucar minha família enquanto eu pudesse evitar. Eu não sabia se sobreviveria ao Apocalipse ou não se não conseguisse deter meu coração de parar nas mãos erradas, mas não chegaríamos ao ponto de descobrir, porque antes disso eu tinha um plano que não iria falhar. Não era possível existir Apocalipse se não existisse Coração Azul.

- De qualquer forma, eu vou levar o rastreador, Alicia. – disse papai me soltando e indo em direção a caixa de joia que estava sobre a penteadeira.

- Como você sabe onde está? – perguntei cruzando os braços.

- Esse é o meu castelo, eu sei de tudo que acontece aqui. – respondeu apoiando o dedo na fechadura que se abriu para ele. – E eu tenho acesso a todas as coisas aqui.

- Guilherme me dedurou. – acusei sentando emburrada na cama.

- E isso também. – respondeu papai com um sorriso divertido e deixou o quarto com o rastreador em mãos.

Minutos depois da saída do meu pai, a porta do meu quarto foi aberta e Guilherme entrou lentamente no quarto. Ele sabia que estava encrencado. Eu não ia facilitar para ele. Me dedurar para papai havia sido um jogo baixo, ele sabia que não havia como o Rei não conseguir o que queria. Papai tinha todos os meios para sempre conseguir o que queria. E descobri isso mais tarde do que gostaria.

- Você me dedurou. – o acusei assim que a porta do quarto foi fechada.

- Você não ia desistir do rastreador facilmente, achei melhor usar a arma mais poderosa que tinha. – defendeu-se Guilherme dando de ombros.

- Contar para papai? – olhei para ele com um sorriso debochado. – Temos cinco anos agora? Você conta para o meu pai minhas travessuras e eu deduro você pelas suas?

- Não contei ao seu pai, contei para o Rei.

- O que dá na mesma, você não acha? Uma vez que papai e o rei são a mesma pessoa, você contou para o meu pai. – cruzei os braços sobre o peito e olhei feio para ele. – Achei que havia convencido você sobre isso.

- Estou fazendo o melhor para você. – afirmou sem se abalar.

- Não aguento mais ouvir essa frase! – explodi levantando da cama e começando a andar pelo aposento. – Eu só escuto isso de vocês. "Estamos fazendo o melhor para você, Alie", "É para protegê-la, Alie". Vocês acham que eu sou algum tipo de retardada? Eu sei me cuidar. Eu não sou mais criança, eu sei no que estou me metendo. É a minha vida em jogo. Eu tenho o direito de decidir como vou cuidar dela. Eu decido o que é melhor para mim. Eu vou ser encontrada, com rastreador ou sem.

- Não vamos facilitar isso com o rastreador, não é? – disse Guilherme apoiado na parede com as mãos no bolso enquanto me observava andar furiosa.

- Vão me encontrar, Guilherme. – afirmei. – Ambika me encontrou por mais que vocês tentassem me esconder. Seja quem for que está por trás disso, é muito mais poderoso que Ambika. Provavelmente, ele já deve saber onde estou.

- Ninguém vai passar por nós.

- E se passar? Não é melhor que eu tenha controle dessa situação? Se eu souber quando ele vai vir, eu decido as circunstancias com que vou lidar.

- Alie, eu entendo seus argumentos. Você não está errada. – eu estava prestes a questionar quando ele ergueu um dedo e se aproximou. – Porém, não vamos usá-la como isca. Não vou amarrar você na ponta de uma corda e ficar esperando que venham. Eu sei, você vai reclamar que eu sou super protetor, mas isso é mais que o meu trabalho. Você é minha vida, não posso arriscá-la de forma alguma.

- Se você está tentando me deixar mais calma, você está conseguindo. – resmunguei encostando minha cabeça no ombro dele e deixando-o me levar para cama.

- Só quero que você perceba que não posso colocar você em risco. É importante de mais para mim e para os outros também. – ele beijou meus cabelos e me embalou para um sonho nos seus braços.

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