21 - Chuva de pensamentos

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Caminhei pelo enorme corredor evitando olhar para os enormes quadros que pareciam me reprovar apenas com o olhar. Desci as escadas e me vi mais perdida do que nunca. Por um instante parei e procurei algum cheiro que me guiasse ou um som, qualquer coisa. Mas tudo era tão silencioso, todos se moviam silenciosamente por ali, tão silenciosamente que era quase impossível meus ouvidos sensíveis captarem sons. Quase impossível, não completamente.

Ouvi a voz de uma criança, uma voz baixa que parecia estar distante de onde me encontrava, mas ainda era auditiva. Comecei a caminhar cautelosa na direção do som. Vi-me descendo mais um lance de escada e parando em uma sala enorme com dois tronos gigantescos incrustados com pedras preciosas. Ignorei os tronos por não querer aceitar que aquele era meu trono e continuei a seguir o som da voz da criança.

Virei em uma esquina no corredor e me vi entrando em uma parte um pouco mais modesta do castelo. Provavelmente a parte onde os empregados deveriam ficar. A voz do menino ia aumentando e meu passo era cada vez maior quando eu pensava em encontrar alguma pessoa que poderia me ajudar.

De trás de uma porta a voz do menino era facilmente ouvida e as palavras já estavam bem claras.

- Mamãe, eu vi. Ela tinha um monte de papel com umas imagens, parecia ser uns quadros pequenos, mas não tinha molduras e não parecia ser pintado. – disse a voz da criança.

Rapidamente, após ouvir a frase, minha mente voou para as fotos no meu quarto, escondidas na minha mala. Senti um frio na pele e rapidamente bati na porta querendo interromper o assunto que a criança estava tendo com a mãe. Se alguém soubesse daquelas fotos e isso chegasse aos ouvidos de Declan, seria um desastre na certa.

- Só um instante! – gritou a mãe. – Agora escute, pare de imaginar coisas e não quero que você comente isso com ninguém, entendeu? Ninguém.

- Mas, mamãe... – começou a menino, mas foi interrompido rapidamente pela mãe.

- Ninguém, ninguém mesmo.

Bati outra vez na porta querendo chamar a atenção novamente avisando que havia alguém do lado de fora que exigia atenção, evitando que o menino pudesse dizer mais alguma coisa.

- Keile, quantas vezes eu já disse para não ficar batendo na porta toda hora? – dizia a mulher enquanto abria a porta do quarto olhando para o menino.

- Desculpe. – falei cruzando meus dedos na frente do corpo.

- Oh, Majestade. – disse a mulher quando virou para mim parada na porta, ela fez uma reverência e ainda sem olhar para mim, falou: - Desculpe, Majestade, mas pensei ser uma das empregadas. Não me entenda mal, mas não é comum ver uma nobre na área dos empregados.

- Sem problemas. – respondi dando de ombros e observando um pouco mais as feições da mulher. – Você me parece familiar.

- Sou Marguerite, Majestade. – lembrou-me olhando para seus pés em sinal de respeito.

- Não a reconheci, me desculpe.

- Olá. – disse o menino que antes falava com Marguerite.

- Oi. – cumprimentei com um aceno de cabeça.

- Joseph, tenha mais respeito. Esta é a Rainha. – repreendeu a mãe.

- Desculpe, Majestade. – disse o menino abaixando a cabeça.

- Tudo bem. – respondi observando a fisionomia da criança.

Ele tinha os cabelos pretos cortados na altura do ombro, mas sem nenhuma simetria, como se tivessem pegado uma tesoura e cortado de qualquer forma. A pele um tom mais escura que a da mãe estava suja de pó, os ombros pequenos e ossudos cobertos por uma camiseta feita à mão com um tecido grosseiro. Os pés descalços eram grandes para uma criança e estavam pretos de tão sujo.

Coração AzulOnde histórias criam vida. Descubra agora