Já é uma da tarde e eu ainda não tive notícias da minha mãe. Ao meu redor, a casa está em completo silêncio, a não ser pela respiração de Cassie, que passa pela porta aberta do seu quarto e chega até a sala, de tão pesada e profunda.
Ela está cansada. Eu consigo ver que há algo a sugando por dentro, tomando as forças dela para si e não devolvendo absolutamente nada para o seu corpo pequeno. Eu preferi não falar nada, porque acho que a sua cabeça já está confusa demais para que ela tenha que ouvir mais alguma coisa, mas estou preocupada. Ela está dormindo há mais de dez horas, interrompeu seu sono apenas para se levantar, comer algo e dormir de novo.
Entretanto, nem se eu quisesse dizer algo eu conseguiria. Eu me sinto responsável por ela e completamente perdida nisso tudo. A minha mãe saberá exatamente o que dizer quando chegar.
O problema é que a minha mente está tomada por uma ansiedade sufocante desde a noite passada. Eu mal consegui fechar os olhos, imaginando mil coisas que podem dar errado não comigo, mas com as pessoas que eu amo. Estou sentada de barriga vazia em frente a um telefone que torço para tocar, esperando alguma notícia da minha mãe, e os meus pensamentos judiam da minha sanidade. Pode ter acontecido algo com ela no caminho para cá, naquela casa ou até se for só um atraso, poderá acontecer aqui.
E eu me sinto tão perdida sozinha, sem alguém dizendo o que eu tenho que fazer ou me orientando um caminho para seguir. Estou tentando ocupar o meu tempo com coisas fúteis como a limpeza desse lugar, mas não adianta de nada. Infelizmente Ana deixou esse lugar perfeito para a gente.
Se passa uma, duas horas, e quando já são três da tarde eu não me aguento mais. Disco os números da casa onde vivi com as feras e espero por longos minutos, mas ninguém me atende.
Passo a mão pela testa, suando frio. Meu joelho treme freneticamente e eu pisco inquieta. Tento controlar a minha respiração antes de discar os mesmos números que decorei. O telefone chama até o último segundo, até que alguém finalmente o atenda. Pensei que nessa situação eu gritaria e perguntaria o que está acontecendo por lá, mas eu simplesmente congelo e não sei o que dizer, esperando a minha mãe se pronunciar primeiro e me tranquilizar. Ingenuidade minha.
Do outro lado da linha, alguém arfa pesadamente e se mexe enquanto segura o telefone, parecendo arrastá-lo até que para. Fecho os olhos com força e tento me concentrar, algo no fundo dos meus ouvidos palpita e eu imagino a pessoa se sentando encostada em uma parede, com o telefone ao lado da bochecha. Ele respira fundo e funga, esperando alguma coisa
Eu sinto que há qualquer momento o meu coração vai sair pela boca ou eu vou morrer sufocada com a minha própria respiração. Quero falar alguma coisa, mas não sei o quê. Não consigo.
Nós ficamos assim por algum tempo, até que ele suspire por uma última vez antes de se pronunciar.
— Você já consegue falar, Elisa? — eu tremo, confusa.
— Como você... Como você sabe que sou eu?
— Eu reconheceria a sua respiração de qualquer forma. Você não tem ideia de quantas noites eu passei a ouvindo. — Arthur não diz isso para me amedrontar, mas é inevitável.
O meu peito dói tanto que faz com que meus olhos se encham de lágrimas. Eu escorrego até encolher no sofá, deitada de lado, e fecho os olhos com o telefone ao lado do meu rosto.
Ouvi-lo dizer o meu nome é tão doloroso. Por um lado, é horrível. Eu sinto tanto medo dele ou do que ele pode fazer. Só que por outro, eu amo a sua voz e a forma como ele diz o meu nome. Tudo isso é tão errado, mas eu não consigo ter outra reação a não ser essa; como é possível alguém tão frio me aquecer por dentro?
Eu sinto tanta, mas tanta vontade de chorar, daquela forma que a gente deixa tudo ir para fora e só para depois que está soluçando.
Só queria que tudo fosse diferente e ele não estivesse se tornando alguém tão mau.
— Elisa?
— Não diz o meu nome, por favor. — tento não deixar a minha voz soar tão trêmula, mas não consigo.
— Por quê?
— Eu só queria um abraço seu.
É tão ruim que a pessoa que me faça mal é a única para quem eu consigo me abrir.
— Eu sou um monstro... — digo, sentindo tanta culpa que meu peito parece estar sendo rasgado de dentro para fora.
— Por quê?
— Por gostar tanto de você.
— Por que você gosta de mim? — eu não consigo responder, o remorso me machuca — Se te conforta, eu sou pior do que você.
Algo me diz que essa não é aquela versão dele falando.
— Não sei como alguém como eu pode conseguir que alguém como você goste de mim, Elisa.
— Dói em você como dói em mim?
— Não. Isso te assusta?
— Tudo em você me assusta.
— E o que te atrai? — as lágrimas escorrem pelo meu rosto até tocarem o sofá.
— Tudo.
— Às vezes sinto que você é a única pessoa que sente algo bom por mim.
— Isso não é verdade, a Cassie ama você.
— Não é real. Ela tem que me amar.
— Mas...
— Ouça, eu tenho que dizer duas coisas a você.
Eu o interromperia, diria alguma coisa, mas há um bolo formado na minha garganta e eu sei que qualquer coisa que eu tentar falar não será entendível por se perder no meu choro.
— Você vai se sentir melhor. Tudo isso vai passar.
— P... Por quê? — eu gaguejo.
-— Depois de hoje você deixará de gostar de mim. — ouço a sua risada fraca e sei que ela é forçada, talvez até triste.
— Arthur...
— Eu tive que fazer o que fiz, porque ela tirou vocês de mim.
— Do que você está falando? — eu perco a cor do meu rosto e sinto um baque gelado tomar conta do meu corpo.
Eu ainda ouço a respiração serena de Cassandra, então isso quer dizer que ela está segura, e nada faz sentido, mas então percebo que ele disse vocês e não você.
— Eu ainda tenho que te contar a outra coisa.
— O que você fez?
— Ela te amou, Elisa. Te amou muito.
De repente a sua voz não se torna mais aquilo que eu admiro.
— Onde está a minha mãe?
— Ao meu lado.
O telefone cai no chão ao meu lado e eu me levanto automaticamente, saindo de casa depois de bater a porta.
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Achei melhor não revisar pra postar logo, então me desculpem algum erro. Essa é a terceira versão desse capítulo, pq eu perdi tudo oq escrevi e acabei desanimando depois do período de provas por esse motivo. Espero q gostem e me desculpem se não deu pra passar as emoções que eu queria. Também peço desculpas pelo tamanho
<3
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A Fera
RomanceEle sempre esteve por perto. Sempre. Ele nunca parou de me observar, cuidando para que eu nunca ficasse em perigo, para que nada de mal acontecesse comigo. Se algo desse errado, simplesmente aparecia, me ajudava e, então, sumia outra vez. Ele me pr...