NÃO DISFARCEI A MINHA insatisfação pelo convencimento descabido do filho mais velho do Clã do Fogo, Jason. Enquanto a plateia ao meu redor gritava, eu tentava discretamente pôr as mãos nos ouvidos para poupar minha audição daquela barulheira descontrolada. Será que era mesmo necessário fingir que nos dávamos bem? Porque eu realmente achava que não.
Inclinei a cabeça para baixo, com o intuito de sussurrar para Claire, minha melhor amiga e dama de companhia, o quão ridículo eu tinha achado o discurso que Jason havia acabado de fazer para a multidão que nos cercava, mas me deparei com o assento dela vazio ao meu lado. Tentei olhar ao redor, mas mesmo se não estivesse presa em meu lugar, seria impossível encontrá-la entre o número absurdo de pessoas na plateia. Suspirei, resignada. Já que ela tinha saído do meu lado, eu esperava que pelo menos soubesse o caminho de volta.
Meu olhar foi atraído para o palco, onde Jason acenava antes de perceber que eu estava olhando e me encarar de volta, os olhos antes castanhos cintilando em sutis labaredas laranjas, até que eu desviei de nosso contato visual e o fogo em suas órbitas cessou. Uma das coisas que mais me faziam ficar desconfortáveis perto do herdeiro do Fogo era o fato de que toda vez que eu olhava em seus olhos, algo estranho acontecia: meus olhos azuis se tornavam da cor violeta, enquanto os castanhos dele simplesmente pareciam entrar em combustão.
Pior ainda era o fato de todo mundo adorar quando isso acontecia.
Comemorávamos o primeiro dia de verão em Goddess Falls, que também estava marcado em nosso calendário como sendo a reunião dos Clãs para a abertura dos Jogos. Entretanto, essa não era uma ocasião qualquer. Hoje eu, a única herdeira do Clã da Água, completava 90 anos – idade que era esperada desde o meu nascimento, já que significava que eu finalmente poderia me candidatar para o Jogos Elementais. Os demais filhos mais velhos, - da Terra, do Ar e do Fogo, - já participavam desde as edições dos anos anteriores, porque tinham a obrigação de se candidatarem assim que chegassem aos noventa.
Jason era o mais velho de nós, por isso era o favorito do povo. Thomas, da Terra, tinha uma boa colocação, mas não tanto quanto Aurora, do Ar. E só de pensar que ninguém me tinha em mente quando o título de vencedor dos Jogos Elementais era pronunciado, uma sensação de fracasso me tomava por completo. Meus pais viviam dizendo que era necessário preparação para ter pelo menos alguma chance de ganhar, e eu tentava ser a melhor, mas eu havia treinado apenas com Thomas, que me deixava ganhar quase sempre. Aurora eu só conhecia de rosto, e Jason só servia para tirar sarro da minha cara em todos os momentos que estávamos no mesmo cômodo.
Ouvi gritos de ansiedade e olhei novamente para o palco, onde o príncipe do Fogo erguia uma taça dourada na minha direção. Mesmo que meus olhos pinicassem só de olhar para ele, eu olhei assim mesmo. O quê você está fazendo?, indaguei silenciosamente.
— Dedico este brinde para minha nova concorrente, que com certeza vai ferrar com a minha vida nos Campos Aquarianos. — ele deu um sorriso torto para a plateia, que só podia ser constituída de pessoas fanáticas por ele. — Para a minha noiva, Ágata.
Uma série de aplausos enlouquecidos e tão surpresos quanto eu foram enviados para mim, que sentia o chão se abrindo sob meus pés. Meus pais tinham se aliado a todos os Clãs, e o do Fogo foi o mais recente. Eles tinham me dito que foi uma negociação mais séria, mas não tinham dito que a negociação era a da minha mão em casamento ao cara que tinha me feito parecer uma palhaça em tudo que era importante para a minha imagem. Se eu não era levada em consideração pelo público, a culpa era dele, do idiota que estava estendendo a mão para mim, esperando que eu a pegasse e subisse para ser o centro das atenções ao seu lado.
Quando eu não respondi ao seu gesto, ele simplesmente me puxou para si, pisando acidentalmente na barra do meu vestido, fazendo o tecido arder em chamas no mesmo segundo. Gritei, e antes que pudesse tentar fazer alguma coisa a respeito, uma rajada de ar tão forte quanto um tornado veio em nossa direção, fazendo o fogo em minhas vestes se apagar no ato e Jason dar um passo para trás, os cabelos negros azulados contra seu rosto. Vendo o quão pouco esse ataque o afetara, ele com certeza já tinha uma certa imunidade contra esse tipo de investida, mas eu, que era totalmente despreparada, tombei para trás. "É preciso preparação", o ditado de meus pais surgiu em minha mente, enquanto eu caía em cima de Jason.
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Crônicas de Água e Fogo: O Elemental
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