38: Traição no Ar

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Aurora


A PRINCESA DO AR AINDA não podia acreditar. Ela havia mesmo se declarado para Jason. Finalmente. Depois de anos estando apaixonada em segredo por ele. E tudo que vira em seus olhos fora puro choque e pesar, porque ele não sentia o mesmo por ela.

Não que fosse surpresa. Ele se casara com Ágata. Mas mesmo assim... Dizer o que sentia por Jason tinha feito com que um peso fosse retirado do peito de Aurora. E ela podia dizer com clareza, que aquele peso havia ido embora para sempre.

E mesmo que ela não pudesse apagar o tempo em que passou amando-o, sentia que agora tudo estava se dissipando, como as nuvens que se esvaíam depois de uma grande tempestade. E mais que isso, ela sentia que precisava se desculpar com Ágata. Sempre fora tão má com ela por causa de Jason, e agora que estava deixando esse amor platônico para trás, via que talvez as duas pudessem ter sido amigas. Boas amigas.

Mas Aurora fora tão... absurdamente estúpida e cega de ciúme que não enxergara nada disso antes. E agora estava sozinha. Sim, sozinha, pois Thomas não se importava com ela, não de verdade, não depois do modo como ele a tratara na frente de Jason.

E por uma aliança forjada por pura sede de vingança, ela traíra a própria mãe. Contara de seu caso com Steve para o pai, e agora ela teria que arcar com as consequências dos atos de sua filha, que não tinha o menor senso de decência de proteger a mulher que lhe dera a vida e que sempre lutara por ela. Até mesmo durante todos esses anos de mentira, em que sua mãe lhe escondeu a identidade de seu verdadeiro pai e lhe impôs uma vida à sombra das humilhações de Otto, tudo o que ela estava tentando fazer era protegê-la.

E foi só Thomas chegar rastejando como uma serpente astuta, sussurrando seus planos malignos para separar Ágata e Jason, e modos de fazer com que Aurora e ele conseguissem ter tudo o que quisessem que ela jogou tudo para o ar em questão de segundos.

E agora estava tão, tão arrependida.

Ela tinha que impedir. Tinha que impedir seu pai de fazer qualquer mal contra sua mãe; tinha que impedir Thomas de ir atrás de Valerie e trazê -la até Ágata, para sugar todo o seu poder. Ela tinha que fazer isso, e o quanto antes.

Mas ao se virar, deu de cara com Thomas observando-a, o rosto coberto por curativos, vestígios de seu confronto com Jason.

- Thomas. - Aurora começou, limpando a garganta e assumindo seu ar de superioridade usual. - O que ainda faz aqui?

O príncipe da Terra moveu a cabeça, deixando-a pender para o lado.

- Jason recuperou os poderes dele. - disse.

O coração de Aurora deu um salto. É claro. Com aquela confusão, ela nem havia se dado conta de que Jason não poderia ter queimado o rosto de Thomas de forma tão grave se não houvesse reavido seus poderes.

E isso queria dizer que...

- Ele vai voltar aos Jogos. - Thomas cuspiu. - Depois de tudo que eu fiz... De tudo que eu planejei... Ele sempre vai se levantar. Enquanto ele tiver Ágata, nunca conseguirei derrubá-lo de verdade. Mas eu ainda estou um passo a frente. - cerrou os punhos, erguendo o olhar para o dela. - E vou usar essa vantagem para destruí-lo.

- O que você está querendo dizer com tudo isso? - Aurora perguntou, cautelosa.

Thomas deu um risinho, como se estivessem contando piadas um ao outro.

- Tive que recorrer à Valerie mais cedo do que o esperado. E descobri - disse, tocando a parte do rosto coberta por curativos. - Que não fui o único a sair queimado de uma briga com um certo príncipe de Fogo.

Aurora ficou pálida.

- O quê? Você falou com ela? - indagou, andando até ele. - E ela... concordou em ajudar você? Assim, tão facilmente, sem pedir absolutamente nada em troca?

Thomas colocou a mão sob o queixo, como se pensasse sobre o assunto.

Estalou a língua.

- Bem, você melhor do que ninguém sabe que não se ganha algo sem se dar algo primeiro.

Aurora trincou os dentes, sentindo o Ar rodopiar sutilmente em sua mão, pronto para ser usado do modo que ela bem entendesse.

- E o que você prometeu à ela?

- Você. - disse uma voz feminina encoberta pelas sombras, o rosto envolto sob uma capa cinza. - Ele me prometeu você.

E então baixou o capuz, deixando uma Aurora boquiaberta e horrorizada.

- É feio, não é? - Valerie perguntou, saindo das sombras. - O que o Fogo faz contra a carne humana? Queimando e dilacerando, como os dentes de uma fera faminta. - a antiga Deusa olhou de lado para Thomas, algo que poderia ser chamado de sorriso estampando seus lábios rasgados. - Ela é bonita. Vai servir.

Aurora desviou o olhar para o Príncipe da Terra.

- Você prometou o meu corpo a ela? - ela berrou. - Nunca. EU NUNCA ACEITAREI ISSO! - e então lançou uma tempestade de Ar que o jogou longe, abrindo o caminho que ela precisava para fugir.

Mas Valerie ergueu a mão e as portas que haviam se aberto trancaram-se novamente, deixando Thomas do lado de fora e prendendo Aurora com a ladra de poder Elemental.

- Você não precisa aceitar. - a bruxa disse, se aproximando. - Ninguém aqui falou em pedir sua permissão.

Aurora recuou, preparando-se para atacar novamente.

- Você não irá vencer.

Névoa negra começou a surgir entre os dedos de Valerie, conforme ela entoava seu feitiço amaldiçoado.

- Eu lutarei... - Aurora disse, invocando o Ar dentro de si, só para senti-lo se esvaindo de seus pulmões pouco a pouco. - Eu lutarei... - segurou o próprio pescoço, sufocando. - Até o meu último... suspiro.


- Lutará. - Valerie balançou a cabeça em concordância, seu rosto começando a se transformar em outro, um espelho da princesa a sua frente, que também tinha sua aparência alterada.

- E morrerá lutando.

E assim foi feito, enquanto Aurora caía sem vida no piso gelado do Palácio do Ar, o rosto tomado por queimaduras que não eram suas e pecados que nunca seriam perdoados durante a eternidade.

Crônicas de Água e Fogo: O ElementalOnde histórias criam vida. Descubra agora