Capítulo 22

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Nossa ida ao shopping poderia ter sido considerada um pequeno pesadelo se ele não estivesse lá. 
A primeira coisa com a qual tive que me preocupar eram as pessoas. 
Tomada por um pânico crescente à medida que caminhava pelos corredores, eu mantinha a cabeça sempre abaixada e os olhos no chão, com receio de que no momento em que olhasse para algum rosto, o reconheceria como um antigo cliente. Para piorar as coisas, nós estávamos em um shopping daquela região, onde todos eram da classe alta, aumentando minhas chances de ser identificada. 
E uma coisa era ser reconhecida como uma puta estando sozinha. Outra coisa era ser reconhecida como uma puta com Bruno Coolin ao meu lado, o que provavelmente faria com que eu desejasse morrer de forma rápida e indolor.
Felizmente, isso não aconteceu. 
No início, Bruno fez menção de entrar em determinadas lojas que eu sabia serem absurdamente caras, só de olhar para a vitrine e para as caras das atendentes, que me olhavam de cima a baixo como se eu fosse algum animal de esgoto. Para cada uma das lojas, eu tentava dar uma desculpa e desviá-lo de seu caminho, mas foi quando eu disse, na sua terceira tentativa, que não queria entrar porque parecia frio lá dentro, que ele entendeu minha tática. 
Pedi pelo amor de todos os deuses para que fôssemos em uma simples loja de departamentos, e obviamente ouvi reclamações de Bruno. Ele parecia decidido a comprar coisas com preços exorbitantes, então quando notei que meus pedidos não estavam surtindo efeito, garanti a ele que algum dia poderíamos voltar e escolher as lojas que ele quisesse, contanto que aquele dia fosse meu. 
Ele acabou aceitando, a contragosto, então fomos parar em uma Macy’s. Como queria ir embora logo, escolhi aleatoriamente peças de roupas de diferentes estilos e cores. Não experimentei nada, alegando que qualquer coisa do tamanho P serviria em mim. Por vezes, tentei me separar dele para poder pesquisar preços, mas quando ele me encontrava, já nervoso com o receio de que eu pudesse ter fugido dele, ficava mais furioso ainda quando me via olhando as etiquetas. 
Quando decidi que já havia coisas demais, informei-o de minhas escolhas, mas ele não reagiu como o esperado. Parecendo decidido, Bruno me avisou de que não sairíamos dali sem, no mínimo, o triplo de peças que eu havia escolhido, e então eu quase quis agredi-lo. 
Já era de noite quando chegamos ao apartamento dele. O porteiro foi, mais uma vez, incumbido de levar todas as dezenas de sacolas para cima, provavelmente pensando que eu era algum tipo de aproveitadora barata, me beneficiando da ingenuidade de Bruno. 
Quando o elevador chegou ao último andar, imediatamente voltei aos meus dilemas e preocupações.
Bastou passar pela porta para que eu me lembrasse de me perguntar como seria aquela noite - mais uma noite ao lado dele.
Era o segundo dia completo que eu passava na sua companhia, e ainda assim as coisa pareciam estranhas. Felizmente, a quase casualidade daquela tarde de compras no shopping fez com que um pouco do gelo que existia entre nós fosse derretendo, mas o bloco gelado, maciço e invisível ainda estava lá.
Nós não éramos um casal normal, de namorados ou amantes. 
Éramos duas pessoas vivendo no mesmo ambiente e sem ter ideia de como fazer essa coexistência funcionar confortavelmente. Éramos duas pessoas com muito medo de causar dor uma a outra, de dizer coisas que pudessem ser tomadas como insultos. Éramos pessoas em constante tensão, quando juntas. Em constante agonia de não saber como agir, como olhar, como tocar, como sorrir direito.
– Fome? 
Me assustei com sua voz grave me tirando de meus devaneios. Não sabia quanto tempo havia se passado desde que chegamos ali. Notei que estava sentada na cama do quarto de hóspedes, já podendo considerá-lo como meu por me sentir tão mais à vontade ali, sozinha, do que no quarto de Bruno, em sua companhia. O que não significava necessariamente que eu me sentisse melhor. 
– Não. Não costumo jantar. 
Notei que sua expressão parecia levemente decepcionada, mas antes que pudesse dizer a ele que eu não estava negando tudo que ele me oferecia de propósito, Bruno falou outra vez. 
– Ah… Tudo bem então. Se mudar de ideia me avise. Eu preparo alguma coisa. Tem frutas na geladeira também. 
– Ok. - Falei de forma simples. 
– Ok… - Ele começou, com aparência cansada - Eu vou tomar um banho e me deitar, então. Não estou acostumado a ficar andando por tanto tempo em um shopping. Acho que só as mulheres têm esse dom. 
Vi um sorriso tímido se formar em seus lábios, como se estivesse tentando me mostrar que tinha acabado de tentar ser engraçado. Continuei séria, não com o intuito de magoá-lo, mas porque eu não conseguia sorrir de forma verdadeira. 
Não ainda.
Ele voltou a ficar sério ao ver que sua brincadeira não surtiu efeito em mim, e quando falou outra vez, pude notar em seu nervosismo evidente que tudo o que havia dito até agora era só uma desculpa que levaria o tempo necessário para que ele me sondasse. 
– Você vem? Quero dizer, agora ou depois? 
Ele tinha receio que eu quisesse dormir no “meu” quarto, por isso se apressou em me dar apenas uma opção: Não se, mas quando.
Sem o menor motivo, estava cada vez mais evidente agora que vê-lo nervoso e inseguro me divertia de certa forma, por mais cruel que aquilo pudesse parecer. Era como se me consolasse o fato de saber que ele também tinha suas fraquezas, e que, principalmente, sua maior fraqueza era eu mesma. Era como se, de repente, eu não me sentisse tão pequena, tão diminuída perto dele. Era como se eu fosse um pouco mais importante do que eu sempre imaginei ser. Ser valorizada por um homem era uma sensação desconhecida para mim, mas ser valorizada pelo homem que eu amava, se era isso que estava acontecendo, era melhor do que qualquer coisa. 
– Não sei. - Me esforcei para dar a resposta mais ambígua possível - Acho que também preciso de um banho. - E, dizendo isso, olhei para o banheiro à minha frente. 
– Claro… - Ele começou, um pouco distraído - Vou deixá-la à vontade… 
Bruno permaneceu no lugar, me encarando sem dizer nada, mas seus olhos eram expressivos, e de repente quase pude ouvi-los pedir para que eu não o negasse. Não sabia quando havia adquirido a capacidade de lê-lo com tanta clareza, mas o fato era que eu sabia exatamente o que ele queria dizer.
Finalmente, ele se deu conta de que estava demorando mais do que o normal ali, então se retirou do quarto, me deixando sozinha outra vez.
Então, eu me perguntei: Até onde iria o meu contentamento? Até onde eu chegaria para vê-lo perder o controle?

De repente, Amor.Onde histórias criam vida. Descubra agora