Capítulo 30

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Suspirei outra vez, olhando os mínimos detalhes de cada centímetro de sua pele exposta. Ele secava com a toalha seus cabelos úmidos, e parecia extremamente confortável em aparecer daquela forma na minha frente. Era claro que àquela altura eu já deveria ter me acostumado em vê-lo nu, mas… Bem, eu não estava.
– Devo fazer algum comentário quanto à ausência de roupas em você? - Perguntei, trazendo o edredom até o rosto e deixando apenas os olhos à mostra, ainda varrendo-o de cima a baixo.
– Depende. Se for algo que vá me ridicularizar, não. Se for pra me chamar de gostoso, então tudo bem. - Ele respondeu com um sorriso cansado mas sincero, enquanto deixava a toalha molhada embolada em uma cadeira próxima e se aproximava de mim como um leopardo se aproxima da presa. 
– Hmmmmmpf… - Consegui dizer quando ele puxou o edredom e se deitou em cima de mim. 
– Eu costumo dormir assim. Achei que seria melhor deixar esse hábito de lado até você se acostumar. Mas agora já deu tempo, né? 
– É… - Respondi desatenta, fazendo que não com a cabeça. Ele riu da minha incoerência - Não está com frio? 
– Estou. Quer me esquentar? 
Não tive tempo de responder. Bruno me beijou calmamente, mas com um fogo que era difícil conter. Suas mãos voaram para minha barriga, por baixo do casaco de moletom. Senti cada centímetro da minha pele arrepiar com o toque, e instintivamente abri as pernas para que ele se acomodasse entre elas. Seus dedos enrolaram o casaco até meu pescoço, e foi só quando senti a falta da língua dele na minha que entendi que estava agora nua da cintura para cima. Não demorou muito até que minha calça fosse removida também, e então tudo se resumia ao seu corpo cobrindo o meu, um edredom macio nos envolvendo e os beijos dele. Fui virada de repente na cama, ficando agora por cima dele, em seu colo. Era possível já sentir a sua ereção contra a pele da minha barriga, e eu me perguntava se ele poderia bater algum tipo de recorde com a rapidez com que ficava excitado. Suas mãos passeavam pelas minhas costas com gentileza, sem nenhuma pressa, enquanto sua língua fazia um tipo de carinho na minha. Respirei fundo o perfume do sabonete no rosto dele e tive vontade de atacá-lo, mas me contive. Senti seu braço esquerdo se esticar por um momento, mas não abri os olhos. Não ia interromper aquele momento só porque Bruno havia resolvido fazer ginástica - toda vez que ele me beijava eu me negava a prestar atenção em qualquer outra coisa. Quando seu braço voltou para perto de seu corpo, senti a cabeça de seu membro na minha entrada e, como se me pedisse permissão, parou ali. Movi meu corpo devagar contra ele, fazendo-o entrar em mim e me permitindo sentir cada centímetro que me invadia.
– Você confia em mim, né? - Ele perguntou de repente ao pé do meu ouvido, e então fiquei um pouco surpresa. Do que ele estava falando? 
– Confio. - Respondi, um pouco vacilante. Não porque não confiava, mas porque não estava entendendo onde ele queria chegar. 
– Eu queria te mostrar uma coisa…
Pulei de seu colo e me afastei imediatamente, quase caindo ao ficar de pé fora da cama e encostar na parede oposta com um lençol, cobrindo meu corpo exposto.
– Não! - Eu queria falar, mas acabei gritando. Fiquei parada, encarando-o ainda na cama, sentado com o corpo apoiado em seu antebraço. Ele me olhava com uma expressão indecifrável. Tentei conter o susto, me acalmando para que meu coração parasse de bater rápido. Ele havia me pegado desprevenida. Ao seu lado, um tubo com algum tipo de lubrificante e a gaveta do criado mudo aberta. Eu não estava pronta para aquilo.
– Por que agiu assim? - Ela falou, em um tom muito sério. Seus olhos estavam frios, ele me encarava como se estivesse ofendido
– Eu não… 
– Por que saiu correndo de mim? E por que está se cobrindo como se eu fosse um qualquer que não pudesse te ver assim? 
Ele estava puto. Inconfundivelmente puto. E eu não sabia o que responder a ele. Não sabia o porquê de ter agido daquela forma, fugindo dele como o diabo foge da cruz. Não sabia o porquê de estar evitando que ele olhasse para mim nua, como já havia feito tantas vezes. Não sabia o motivo de estar tão nervosa e até um pouco receosa. 
– Você não confia em mim. - Ele falou calmamente, mas em um tom claramente irritado. 
– Eu só… Eu não estou pronta… 
– Bastava dizer “não” e eu me afastaria. Bastava você negar e eu não tocaria em um fio de cabelo seu.
Eu sabia disso. Eu tinha certeza. Confiava nele, isso era indiscutível. Então por que havia agido daquela forma? Como se ele estivesse tentando me estuprar? 
– Me desculpe… Eu… - Eu não sabia o que dizer, mas sabia que tinha que me explicar de alguma forma - Eu só fiquei nervosa… Mas eu confio em você! Só preciso de algum tempo… 
– Você tem o tempo que quiser. Mas não diga que confia em mim. 
– Mas… Eu confio… - Falei, muito baixo. Ele não ouviu, se levantando abruptamente e pegando uma boxer e uma calça no armário perto da cama. Jogou o lubrificante dentro do criado mudo outra vez e bateu a gaveta com força. Tremi com o barulho.
– Me desc… 
– Não peça desculpas. - Ele disse secamente, me interrompendo - E pode voltar a respirar, não vou tocar em você. 
Bruno passou por mim, saindo do quarto e me deixando sozinha ali, debilmente agarrada a um lençol. Meu corpo tremia, e eu não sabia se era de nervoso ou de frio. Talvez um pouco dos dois. Meu coração ainda estava acelerado.
Por que infernos eu agi daquela forma? Por que fugi dele? Eu não precisava fugir dele, e sabia disso. Bruno era a pessoa que eu mais amava e na qual eu mais confiava. Por isso, minha atitude não tinha a menor explicação. Fui até a cama e vesti minhas roupas outra vez. Sentei, ainda me sentindo culpada, e esperei até que ele voltasse. Mas isso não aconteceu. Caminhei até a sala e o achei deitado no sofá vendo tv. Algum filme qualquer. Me perguntei se ele havia me visto ali, parada a alguma distância dele. Se viu, não fez nada para me deixar ciente disso. Entendi então que ele não queria ficar perto de mim, e me senti pior. Queria pedir desculpas pela minha atitude, embora eu não tivesse feito por mal. Queria dizê-lo que confiava nele, e que em momento algum tive medo de que ele passasse dos limites comigo. Mas ele não parecia disposto a ouvir, e eu respeitaria isso. 
Com o objetivo de devolver seu espaço, me retirei silenciosamente, caminhando para o meu quarto e ficando por lá pelo resto da noite. 
… 
Em situações normais, eu não conseguiria dormir sem Bruno ao meu lado. Mas aquela não era uma situação normal, simplesmente porque eu me sentia exausta. Por isso, a impressão que tinha era de que haviam passado apenas alguns segundos desde o momento que fechei os olhos, e então já havia amanhecido. 
Olhei ao meu lado e constatei que ele não estava lá. Senti um aperto no peito. Tomei coragem para me levantar e me levantei. Depois da higiene matinal feita, me arrumei pelo menos de forma a ficar apresentável, e então saí do quarto à sua procura. Era domingo. Ele deveria estar em algum lugar, mas eu não o encontrava. Fui até seu quarto, cozinha e sala. Nada. Bruno parecia ter simplesmente desaparecido. Procurei-o no resto da casa, na área da piscina, adega, biblioteca e demais salas. Tudo isso para constatar o que eu já sabia: Ele não estava ali. 
Me senti mal. Não por estar sozinha, mas porque saber que estávamos daquela forma me angustiava. Eu odiava estar separada dele, fosse pela distância física ou por qualquer barreira entre nós. Naquele momento, eu sabia que Bruno estava me evitando porque ainda estava magoado, e isso me fazia muito mal. Sentei na sala e esperei. Uma hora ele teria que voltar de onde quer que estivesse. Liguei a tv e busquei qualquer canal de desenho, pensando nos vários possíveis lugares em que ele poderia estar. Será que ia demorar? Será que não falaria direito comigo quando chegasse? Será que ele estava sozinho? O tempo passou e eu não notei.
Quando o sono pelo tédio começou a me tomar, fui despertada pelo barulho de chave na fechadura da porta da sala. Me endireitei no sofá, um pouco tensa, pensando em como agir. Queria pedir desculpas por tê-lo feito pensar que eu não confiava nele, mas não queria que minhas desculpas parecessem forçadas ou falsas, como ele havia pensado na noite anterior. Decidi ficar calada e falar apenas quando ele me dirigisse a palavra. Bruno entrou com um conjunto azul marinho e tênis, tudo próprio para corrida. Encarei-o um pouco receosa, não desviando o olhar um minuto sequer. 
– Bom dia. - Ele disse, em uma voz que eu ainda não conseguia identificar como hostil ou apenas sem emoção. 
– Bom dia. - Respondi baixo. 
– Já tomou café da manhã? 
Ele não parecia puto, mas também não estava feliz. Bruno estava empregando uma certa formalidade na voz que me incomodava. 
– Não. 
– Quer que eu prepare alguma coisa? 
– Não precisa. Eu me viro.
Ele assentiu. 
– Bom, vou tomar um banho então. 
E assim, de forma simples e um pouco fria, se retirou para o quarto e me deixou ali, eu no sofá e o Scooby Doo na TV.
Pensei que não conseguiríamos manter aquela situação dessa forma pelo resto do dia todo, mas me enganei. O máximo de interação que tivemos foi quando pedi que ele me ajudasse com a arrumação das minhas roupas no closet, lembrando de suas palavras na noite anterior. Fiz isso propositalmente, tentando retomar o ritmo entre nós dois. Ele me ajudou, mas assim que pôde arranjou a desculpa de que tinha muitas coisas do trabalho para fazer para o dia seguinte, “principalmente por ser fim de ano e tudo ter que ser resolvido com urgência”.
Ele não me tratou mal, mas também não fez questão alguma de mostrar que sabia que eu estava ali. A forma como me ignorava e fazia parecer que não estava acontecendo nada entre nós me abalou. Pensei em tocar no assunto da noite anterior, mas sabia que ele me interromperia e não conversaria comigo. Talvez eu estivesse mal acostumada em tê-lo me mimando demais, e sentir um pouco da sua indiferença era algo para o qual eu não estava preparada.
– Posso entrar? - Perguntei baixo, abrindo a porta do seu quarto e esperando uma resposta dele.
– Pode.
Bruno estava sentado com as costas nos travesseiros da cabeceira da cama e o laptop em seu colo. Já passavam das 22h.
Caminhei devagar até a cama, esperando que ele desviasse os olhos da tela e olhasse para mim.
– Se incomoda se eu dormir aqui? - Perguntei. Não sabia exatamente o que ele queria, mesmo porque não falava. Mas embora ele continuasse frio comigo, não queria passar outra noite longe dele.
– Claro que não. Essa é a sua cama.
Eu vestia um outro conjunto de moletom, esse escuro. A noite estava fria, por isso corri para debaixo das cobertas e me enrolei como um casulo no edredom preto. Bruno permaneceu digitando no laptop, apenas se acostumando com minha presença lá.
Virei de costas para ele e esperei. Pelo quê, eu não sabia. De qualquer forma, nada aconteceu. Por isso, depois de algum tempo, o sono finalmente chegou e eu adormeci, apenas para acordar algumas horas depois, no meio da madrugada, e senti-lo dormindo agarrado a mim com força, como se eu fosse seu urso de pelúcia em tamanho real.
Acordei também quando, às 6h da manhã, ele levantou para ir trabalhar. Fingi continuar dormindo, mas o observava passear pelo quarto de um lado ao outro, enquanto se arrumava para a manhã gelada lá fora. Quando se aproximou para se despedir, fechei os olhos e esperei. Senti-o beijar meu pescoço com carinho e respirar por algum tempo em meus cabelos. Senti vontade de abraçá-lo, mas tinha a sensação de que se o fizesse ele se afastaria. Então me mantive imóvel, simplesmente por querê-lo ali por mais alguns segundos.
Bruno finalmente me beijou outra vez e se levantou, caminhando para fora do quarto e me deixando sozinha pelo resto da segunda-feira.
Os três dias que se passaram - segunda, terça e quarta-feira - se mostraram incrivelmente vazios. Minhas manhãs e tardes eram solitárias, e quando Bruno chegava em casa - muito mais tarde do que o normal - os diálogos eram tão discretos que pareciam estar ali por pura educação. Ele não estava sendo de forma alguma rude, mas estava tão distante que me fazia mal. Tentando não ser egoísta, quis acreditar que seu afastamento se dava porque, como ele mesmo havia dito e mostrado, muitas pendências da empresa teriam que ser fechadas até o final do ano. Isso provavelmente justificava o fato de chegar em casa depois das 22h e, enquanto não dormia, falar ao telefone com algumas pessoas diferentes sobre contratos e outras coisas que eu não entendia.
Ainda assim, era impossível deixar de sentir sua falta. Não era a falta de sexo que me incomodava, mas sim a falta de qualquer tipo de interação entre nós. E eu tinha medo de tomar alguma atitude quanto a isso simplesmente porque tinha medo de ser rejeitada, mesmo que o motivo fosse o trabalho.
Mas quarta-feira a noite, dia 30 de dezembro, o laptop havia finalmente sido deixado de lado.
– Vou ficar sem camisas desse jeito.
Eu havia roubado mais uma de suas camisas sociais. Me sentia à vontade com elas. A que eu vestia agora era vermelho escuro, quase sangue. Eu assumia a culpa de estar me apossando das coisas dele, mas ainda assim não deixei de corar ao ouvir suas palavras. Talvez estivesse mesmo sendo um pouco abusada, mas pelo menos teríamos algo pelo qual discutir.
– Ah… - Ele se pronunciou, me vendo vermelha - Não estou reclamando, de forma nenhuma. Foi só um comentário.
– Tudo bem. Eu deveria ter pedido antes de pegar…
– Não, eu não me importo. E essa ficou melhor em você do que a outra.
Notei que ele me olhava de cima a baixo, avaliando cada detalhe. Me senti feliz não por seus olhares indiscretos, mas porque parecia que, pela primeira vez desde que voltamos de Londres, ele estava realmente me vendo.
– Só porque você gosta de vermelho… - Falei calmamente, indo sentar ao lado dele na cama e me cobrindo rapidamente até os olhos para que o frio passasse.
– Não gosto de vermelho em geral. Gosto de vermelho em você. Fica interessante contrastando com o tom da sua pele. - Ele disse calmamente, agora me encarando nos olhos, já que eram as únicas coisas que o edredom não cobria em mim.
Continuei encarando-o, desejando que ele estivesse mais perto.
– Onde você costuma passar as viradas de ano? - Perguntei de repente.
– Com Duda. Ela sempre dá uma festa na casa dela.
Assenti com a cabeça sem motivo, apenas para ter algo para fazer.
– Quer ir pra outro lugar? - Ele me perguntou, tentando entender meu silêncio.
– Não… Vão muitas pessoas?
– Só pessoas da família dela e amigos próximos. Ela evita convidar gente babaca pra esse tipo de ocasião.
Sorri contra a coberta que envolvia meu rosto. Continuamos nos encarando por algum tempo, sem dizer uma única palavra. Queria saber no que ele estava pensando, queria poder prever o que ele faria em seguida. Mas me mantive ali, apenas desejando que ele fizesse alguma coisa.
– Quer ver TV? - Bruno desviou seus olhos dos meus e se virou para pegar o controle no criado mudo, ligando a televisão logo em seguida.
Arranquei o controle de suas mão com raiva e desliguei outra vez o aparelho. 
– Por que está fazendo isso? Por que está me tratando assim desde aquela noite? Você nem me toca! 
Ele respirou fundo. 
– Não quero forçar a barra. 
Barra? Que barra? Que estupidez era aquela? 
– Do que infernos você está falando? 
– Quero tocar em você quando você estiver realmente à vontade comigo. Quando realmente quiser que eu a toque. 
Fiquei encarando-o com cara de “que-porra-é-essa?” 
– Você acha que eu não quero? - O tom de incredulidade estava claro e límpido na minha voz, e provavelmente na minha expressão também.
– Desculpa se passei dos limites sábado. - Ele falou, ignorando minha pergunta - Não queria que você ficasse com medo… 
– Eu não estava com medo! Só… Eu só não estou preparada… 
– Eu sei. Você desenvolveu um trauma, e eu entendo. E também sei que você me conheceu nas mesmas circunstâncias que aquele filho da puta, mas… Eu nunca, nunca faria nada… 
Me desvencilhei do edredom que ainda me mantinha embrulhada e, sem pensar, pulei no colo dele. 
– Por favor… - Comecei, agarrando seu pescoço e encostando minha testa na dele, prendendo seu olhar no meu propositalmente - Acredite em mim: Eu NUNCA compararia você a ele. É absurdo! Até colocar vocês dois na mesma frase é absurdo. Você é a pessoa que eu mais confio no mundo. Sei que nunca me faria mal por querer, e sei que sempre vai ser assim. Vou querer que você me toque sempre, e nunca soube o que era me sentir à vontade antes de estar com você. Não existe um único lugar no mundo melhor do que os seus braços, porque eu sei que estou segura quando você está tomando conta de mim. Desculpa ter agido daquela forma, foi involuntário. Mas, por favor, tire da cabeça que eu não confio em você. Por favor. 
Me calei e então notei que estava tremendo, tanto pelo frio quanto pela carga de emoção. Bruno envolveu seus braços quentes nas minhas costas e me puxou pra si, me aquecendo imediatamente com um simples toque. Estremeci ao me dar conta da falta que seu abraço fazia, e de como senti-lo tão próximo mexia com meu coração. 
Beijei-o lentamente. Como de costume, meus dedos agarraram involuntariamente os cabelos de sua nuca em um desespero acumulado. Inconscientemente, puxei a barra do casaco que ele vestia, na esperança de que houvesse outro método de tirá-lo sem que tivéssemos que nos afastar. Constatado o óbvio, cessei o beijo e puxei de qualquer jeito seu casaco pelo pescoço, voltando a agarrá-lo logo em seguida e trabalhando agora na calça.
Fui virada abruptamente entre os lençóis e o edredom. Bruno se posicionou de joelhos entre as minhas pernas, puxando de qualquer jeito minha calcinha até tirá-la completamente de mim e jogá-la em algum canto do quarto. Ele me olhou como quem pede permissão para alguma coisa, e qualquer que fosse a “coisa” em questão, eu permitiria.
Senti-o abrir botão por botão da camisa que eu usava. Quando suas mãos acabaram, senti um frio congelante contra meu peito exposto, mas meu desconforto foi resolvido logo que ele se deitou sobre mim, aplicando beijos molhados e apaixonados por toda a extensão do meu tronco, fazendo com que cada centímetro da minha pele pegasse fogo. 
Não consegui controlar os gemidos ao sentir sua língua passeando por todos os lugares acessíveis, suas mãos me tocando em pontos estratégicos e sua barba pouco crescida fazendo um certo tipo de cócegas nada inocentes em regiões sensíveis.
Quando seus beijos foram descendo, eu sabia onde iriam parar, mas não fiz menção de impedi-lo. Ao invés disso, abri mais as pernas para que ele tivesse um melhor acesso ao lugar que queria provar. Agarrei seus cabelos com força outra vez ao sentir a ponta de sua língua brincar de forma torturante hora em minha entrada, hora no meu clitóris. Fechei as pernas sem querer ao senti-lo me penetrar com a língua, mas Bruno abriu-as de volta. 
– Não me faça ter que te amarrar. 
Um calor de ansiedade percorreu meu corpo com a ideia então me assustei ao notar que eu adoraria ser amarrada por ele e deixar meu corpo simplesmente entregue ao que quer que ele tivesse em mente.
Revirei os olhos quando, outra vez, senti sua língua entrar em mim, só para segundos depois sair e repetir o movimento. Um gemido alto saiu da minha garganta sem que eu pudesse controlar o volume. Ele me chupava com força, mas o que eu sentia estava longe de ser dolorido ou desagradável.
Reunindo toda a força em meu ser, puxei-o pelos cabelos para cima com uma mão, enquanto com a outra tentava desesperadamente arrancar sua calça. Eu era simplesmente uma negação para despir pessoas, principalmente quando estava louca de tesão.
Beijei-o furiosamente, como nunca tinha feito antes. Nossas línguas não dançavam juntas - elas se agrediam, lutando pelo território alheio. Senti minhas unhas, um pouco crescidas, arranharem sua pele onde a barra da calça estava, e senti um mórbido prazer em machucá-lo daquela forma, marcando-o como meu. Suas calças finalmente foram, por algum milagre, jogadas para algum canto, e então notei que meus dedos já não pareciam ter cuidado algum com Bruno, puxando seus cabelos de um jeito agressivo, apertando e beliscando sua pele nos lugares mais indiscretos, arranhando suas costas e coxas como se ele não sentisse dor. Como resposta, ele pareceu também deixar de lado a cautela que costumava ter comigo, me apertando com tanta força que machucava. Quando dei por mim, estava sentada outra vez no colo dele. Não pensei duas vezes, e no segundo seguinte sentei em seu membro com tanta força que senti o colo do meu útero ser tocado pela cabeça do pau dele. Ele gemeu um som gutural, apertando minhas coxas com uma força absurda. Bruno estava agora me machucando de verdade, mas eu não conseguia sentir desconforto - a dor parecia ser afrodisíaca. Nossos corpos se moveram juntos de forma agressiva mas ritmada. Suas investidas eram incrivelmente violentas, principalmente porque, ao mesmo tempo que ele se enfiava dentro de mim, eu me forçava contra ele, chocando nossos corpos sem o mínimo medo. Meus lábios já ardiam pelas mordidas, meu couro cabeludo dolorido pelos vários fios de cabelo agressivamente puxados. 
Aquilo era sexo selvagem. Violento, agressivo e delicioso. Me surpreendi com o tempo que aguentamos evitando o clímax. Com a intensidade do ato e a pequena abstinência de alguns dias, era de se imaginar que qualquer coisa fosse o suficiente para nos tirar o controle, mas felizmente isso não aconteceu. Gozei dois segundos depois de Bruno, e talvez a simples imagem que se formou na minha cabeça do gozo quente escorrendo por dentro de mim como leite tivesse sido o suficiente para puxar o gatilho e fazer com que eu perdesse a consciência no que achava ser, até então, o melhor orgasmo da minha vida. Ele não ousou se mexer. Eu nem podia, porque sustentava o peso do corpo dele sobre o meu. Embora ele fosse pesado, isso não incomodava. Meu corpo parecia estranhamente anestesiado, mas ao mesmo tempo começava a ter consciência das dores e machucados daquela noite. Deixei que cada sensação de formigamento e dor chegassem lentamente a cada músculo e as aceitei, me castigando pela falta de controle e rebeldia. Tudo bem, não era um castigo assim tão ruim se fosse levado em conta tudo o que aquela noite foi. 
Ele adormeceu exausto algum tempo depois, agarrado ao meu corpo, sem sequer se retirar de dentro de mim. Não me incomodei, e o abracei tão forte quanto as dores musculares me permitiam. Dei graças a Deus pelo edredom de malha grossa ser suficiente para que o frio do inverno não nos atingisse, e me deixando relaxar também, caí no sono. 
...
– Argh… 
– Está tudo bem. 
– Arghhh!
– Bruno, respire. 
Minha cintura estava decorada em sua totalidade por manchas roxas e vermelhas. A parte superior das minhas coxas, perto da virilha, estava muito dolorida e com manchas verdes nas laterais. Meus antebraços tinham alguns arranhões e pude ver claramente uma trilha de chupões que ia do meu umbigo até meu seio esquerdo. Eu lembrava um pouco uma girafa albina. 
– Pelo menos não tem nada no meu pesc… 
– Aaaarrgh… 
– Quer parar de gemer? Eu estou bem! 
– Não está nada bem! Você parece ter sido espancada! Não vou mais tocar em você… 
Levantei uma sobrancelha encarando-o pelo reflexo do espelho enorme do closet, desafiando-o a prometer aquilo. 
– Pelo menos até essas manchas sumirem… - Ele se corrigiu rapidamente. 
– Sabe quanto tempo mais ou menos elas demoram a desaparecer? Três semanas. 
– Merda! 
Bruno estava puto porque sabia que meus hematomas eram culpa dele. Mas eu achava que talvez já estivesse na hora de superarmos isso, porque era um problema que sempre existiria: Toda vez que ele me tocasse intimamente eu acabaria marcada. 
– Você está preocupado comigo porque ainda não viu suas costas. 
Ele se virou de costas para o espelho, olhando para trás para ver o reflexo da parte de trás do seu tronco. 
– Uau… Parece que um gato amolou as unhas em mim… 
E parecia mesmo. Alguns arranhões eram apenas pele empolada, mas outros eram cortes visíveis e vermelhos que rasgavam suas costas da altura dos ombros até a lombar. Ele abaixou um pouco a barra da calça que vestia apenas para se certificar de que os arranhões não paravam por ali, mas continuavam em um caminho muito mais abaixo. 
– Viu só? Não sou tão indefesa. - Falei sorrindo, mas um pouco culpada também - Não ardeu no banho? 
– Um pouco, mas não dei atenção. 
– Temos que passar algum remédio aí…
– Não precisa, as roupas cobrem. 
Bem, isso dava a ele uma pequena vantagem sobre mim. Seria difícil achar alguma coisa própria para uma festa de Réveillon e que cobrisse todos os hematomas que contrastavam fortemente com a minha pele clara demais. Aliás, eu não lembrava sequer se tinha alguma roupa clara para vestir.
– Acho que dei sorte… - Ele disse, saindo do closet e indo para o quarto, me deixando na frente do espelho sozinha por algum tempo. Voltou alguns segundos depois, me entregando um embrulho. Encarei-o irritada, esperando alguma explicação. 
– Que foi? Você precisava de um vestido pro Réveillon…
– Eu duvido que não tenha nada que possa ser vestido no meio daquela tonelada de roupas que você comprou pra mim.
– Mas essa é uma ocasião especial, então eu tive que comprar à parte. Abra. 
Continuei encarando-o apenas para deixar claro meu descontentamento. Não queria ser mal educada, mas também queria que ele parasse de fazer aquilo. Desdobrei o embrulho e surgiu entre meus dedos um vestido branco de mangas até os pulsos e uma saia que, embora justa e não muito comprida, parecia ser do tamanho ideal para cobrir os hematomas especialmente roxos nas minhas pernas. O vestido era lindíssimo e parecia quente e fofo, com alguns brilhos perolados dispostos aleatoriamente pela extensão do tecido. E então eu tive certeza que pareceria um pequeno cisne plumado quando o vestisse. 
– É lindo. Obrigada.
– De nada. Acho que cobre toda a merda que eu fiz ontem em você. 
Ignorei seu comentário idiota, colocando o vestido na frente do meu corpo e me olhando no espelho, imaginando como ele ficaria em mim. Como acordamos ambos às 11h da manhã, tivemos que almoçar mais tarde do que de costume. Bruno preparou alguma coisa recheada com queijo e ervas finas para o almoço, e embora eu não soubesse exatamente o que era, não podia deixar de admitir que estava maravilhoso. Às 17h, assim que acabamos de almoçar, a campainha tocou, nos dando um leve susto enquanto eu lavava a louça e Bruno tentava me tirar à força da pia. 
– Acho que é pra você… - Ele falou olhando no relógio e indo atender a porta. Fiquei um pouco confusa, não vendo como qualquer visita que ele recebesse poderia ser para mim. A pessoa misteriosa falou alguma coisa e ele respondeu. Não entendi o que foi dito, mas consegui identificar uma voz de mulher. Segundos depois ambos entraram na cozinha enquanto eu secava as mãos em um pano de prato próximo. Bruno vinha na frente, seguido de uma moça negra muito bonita, alta e magra com um penteado black power para lá de estiloso, argolas douradas e uma bolsa grande nas mãos. 
– Olá, minha flor. Eu sou a Michele. - Ela disse, avançando para mim e me dando dois beijos em cada lado do rosto, enquanto mostrava um sorriso largo e sincero - Que bom, acho que não vou ter quase trabalho nenhum com você. 
– Oi… Ninha, prazer. - Respondi mecanicamente, olhando para Bruno com uma interrogação na testa. 
– Vocês mulheres gostam dessas coisas de maquiagem, unhas e tal, não? Pensei que você fosse querer pra festa de virada de ano, então chamei ela. 
– Vou te deixar ainda mais linda, chuchu. - Ela disse, piscando para mim. - Acho que seu cabelo deve ir solto mesmo. Nada a acrescentar. Uma maquiagem e esmalte claros e você vai estar pronta pra conquistar o mundo hoje à noite.
– Ah, sim… - Comecei, sem saber o que dizer. Os gastos de Bruno comigo continuavam crescendo, e isso continuava me incomodando - É, tudo claro, por favor. Nada de coisas escuras… 
– Nem combina, flor. Vou só dar uma iluminada no seu olhar, e o gato aqui vai ter trabalho com os gaviões de plantão. - Ela finalizou, apontando para Bruno e piscando para mim outra vez. 
– Ei! - Ele respondeu, fazendo uma careta para o comentário de Michele - Não é esse o objetivo! 
Ela me puxou pela mão, nos levando para fora da cozinha, enquanto ria da reação dele. 
– Ela é minha o resto da tarde, gato. 
… 
Michele falava muito. Devia fazer parte do seu trabalho falar sobre besteiras com clientes, mas como eu gostava de ouvir, não me incomodei. Em duas horas, ela havia contado tanto da sua vida que talvez eu pudesse dizer que a conhecia melhor do que qualquer pessoa no mundo. Minhas unhas já estavam feitas em um esmalte claro e discreto, combinando com o pouco comprimento delas. Meu cabelo já havia sido minimamente produzido depois do banho, apenas penteado para dar um melhor volume. A maquiagem recém terminada foi, como prometido, apenas o suficiente para iluminar meus olhos e torná-los um pouco mais fortes. Uma mistura bem dosada de sombras prateada e rosa dava o toque final que combinava com o que eu vestiria aquela noite: Vestido branco perolado e sapatos vermelhos. O delineador e rímel tornavam meu olhar mais sedutor, mas ainda discreto. O blush dava uma coloração muito suave ao meu rosto, e o batom, também muito suave, dava apenas um pouco mais de cor aos meus lábios. Estávamos trancadas no quarto de hóspedes, já que Michele se irritava com “interrupções de homens ansiosos”. 
– Pode me ajudar com o vestido? Não quero estragar as unhas. 
– Claro, coração. 
Sem pensar, desabotoei a blusa e chutei a calça para longe, ficando apenas de calcinha e sutiã. Imediatamente, lembrei de um detalhe importante, mas então já era tarde. Me virei para encará-la e, como imaginava, a encontrei me olhando como se eu estivesse sangrando por cada buraco do meu corpo. 
– Você… Está bem? - Ela perguntou, assustada e séria, percorrendo com os olhos meus vários hematomas. 
– Estou, isso não é nada. - Falei, tentando tranquilizá-la. 
– Ele… Foi ele quem fez isso em você? - Ela perguntou, apontando para a porta se referindo a Bruno. 
Ah, merda! Como eu ia explicar aquela situação? 
– Foi, mas… Não é o que você está pensando. Nós… tivemos uma reconciliação ontem à noite…
Ela parou de encarar meus machucados e me olhou nos olhos. De repente, sorriu de forma maliciosa, entendendo aos poucos o que eu estava querendo explicar. 
– Isso foi sexo?
Senti meu rosto ferver mais uma vez. 
– Foi…
Michele gargalhou. 
– A noite deve ter sido uma delícia, hein chuchu? 
Não respondi, mas minha tonalidade vermelho-camarão respondeu por mim.
– Vocês ainda estão vivas aí dentro? 
Me assustei com o berro de Bruno do outro lado da porta.
– Paciência é uma virtude! - Michele gritou de volta. 
– Devolva minha namorada! 
Ela me ajudou a passar o creme para os machucados e depois me ajudou com a roupa, passando com cuidado as partes mais justas do vestido pelo meu corpo. Calcei meus sapatos altos vermelhos e dei uma última olhada no espelho. Eu estava realmente linda.
– Não é por nada não, mas eu mando muito bem. - Ela falou atrás de mim, olhando para o meu reflexo e piscando. Sorri de seu comentário, agradecendo o quase-elogio. Quando abrimos a porta, levamos outra vez um susto ao dar de cara com Bruno apoiado na parede com cara de cachorro abandonado. Ele vestia uma calça jeans e uma camisa social branca dobrada até os cotovelos, ainda aberta. Aparentemente, a ansiedade em me ver não o deixou terminar de se arrumar. Ele me encarou com os olhos muito abertos, sem dizer uma única palavra, e ficou assim durante algum tempo. Me perguntei se ele poderia estar dormindo e ter esquecido de fechar os olhos. 
– E então? - Michele quebrou o silêncio - Valeu a pena a espera, sr. Impaciência? 
Ele continuou me encarando, como se ninguém tivesse dito nada. Então comecei a considerar a possibilidade de que talvez ele não estivesse muito contente com a minha aparência.
– Se não gostou de alguma coisa… - Comecei. 
– Você está perfeita. - Ele me interrompeu, ainda me olhando de cima a baixo. Não senti vergonha por um único motivo: os olhares dele não eram indiscretos ou inapropriados. Ele estava apenas me admirando, de forma verdadeira e até inocente. 
– Obrigada. - Sorri. 
– Pombinhos… - Michele interrompeu nosso flerte - Tenho que ir, me preparar pro meu Reveillon.
E então me dei conta de que eram 19h da noite do último dia do ano, e que provavelmente não havia cabeleireiras/maquiadores/manicures disponíveis a essa altura do campeonato. Isso deveria significar que ela tinha que ser muito bem paga para estar ali até aquela hora. 
– Michele… - Comecei - Você pode me dizer quant… 
– Não, ela não pode. - Bruno me interrompeu outra vez, virando-se para ela e entregando-lhe o cheque que trazia nas mãos - Obrigado, acho que isso cobre o seu trabalho. Ela leu o valor e tentou ser discreta, mas consegui notar que seus olhos se esbugalharam um pouco.
– Cobre três trabalhos meus. 
Olhei-o de forma assassina. 
– Então, boa virada de ano pra você e pra sua família. - Ele concluiu, apertando sua mão de maneira educada e ignorando meu olhar fuzilante. 
– Ah, pra vocês também. - Ela respondeu, com um sorriso radiante no rosto - Mas pega leve na comemoração depois, chuchu. A gata aqui é muito clarinha. 
Abaixei a cabeça, me amaldiçoando por não conseguir parar de sentir vergonha.
– É, eu sei. - Foi a única coisa que Bruno respondeu. Depois de levá-la até a saída, ele voltou ao quarto de hóspedes, onde eu procurava algum perfume para usar aquela noite. Pensei que quisesse dizer alguma coisa, mas tudo o que fez foi ficar me encarando da porta, ainda com a camisa desabotoada e sem os sapatos.
– Eu já te pedi algumas vezes… - Comecei. 
– Eu sei. 
Encarei-o tentando buscar as palavras certas para impedir que aquela discussão se tornasse mais uma vez cíclica, fazendo com que não chegássemos a lugar algum. 
– Eu vou te ajudar a conseguir um emprego. Você vai poder gastar tudo que ganhar comigo, se quiser se vingar. Mas, por favor, me deixe cuidar de você do meu jeito. É só isso que estou pedindo. 
Eu não sabia quantas vezes mais discutiria sobre gastos com ele. Mas independente do número, tinha certeza que nunca concordaríamos. Não por achar que o que ele fazia era absurdo - não era, e não havia problemas naquilo. Meus pais viveram daquele jeito, os pais dele viviam daquele jeito, e muitos casais do mundo sabiam lidar com aquilo - mas o fato era que ao mesmo tempo que eu não me sentia bem, ele adorava fazer aquilo.
Não era dos presentes que eu não gostava - porque eu gostava de todos - mas sim da situação de receber tudo e não poder dar o equivalente em troca.
Suspirei. 
– Só por favor me diga que você acabou de gastar um valor de menos de quatro dígitos. 
– Ah, sim. Foram menos de quatro dígitos. Um pouco menos, mas… 
Gemi alto. 
– Vá terminar de se vestir. - Falei, colocando um ponto final no assunto, pelo menos momentaneamente, e querendo esquecer daquilo.
Quando Bruno finalmente estava pronto, pude analisar seu conjunto completo. As calças jeans eram justas, muito diferente dos sacos de batatas que os homens costumavam usar naqueles dias. A camisa social branca estava finalmente abotoada, com as mangas enroladas pelo antebraço de qualquer jeito. Ele calçava um tênis meio branco meio azul, e os cabelos como sempre rebeldes terminavam de dar um ar incrivelmente despojado para um executivo cujo uniforme era invariavelmente ternos caríssimos. 
– Estou bonito? - Ele perguntou de bom humor, dando uma volta completa para que eu pudesse vê-lo de cada ângulo.
Suspirei. Eu suspirava muito quando ele estava por perto. 
– Sempre. - Respondi, observando-o melhor de frente.
Aquela noite, ele conseguia estar mais bonito do que qualquer dia em que eu já tinha o visto. Por isso, preparando as últimas coisas para irmos embora, eu me pegava admirando-o sem motivo, apenas para olhá-lo e lembrar a mim mesma de que ele era meu. Mas se minha indiscrição era visível, não era comparável à indiscrição de Bruno, que parecia entrar em algum estado de autismo toda vez que olhava para mim.
Em um desses momentos, o celular dele tocou dentro do bolso. 
– Alô? 
– Onde vocês estão, porra? 
Duda falava tão alto, tentando sobrepor sua voz à bagunça do ambiente onde estava, que eu podia escutar até a alguns metros de distância de Bruno.
– Estamos indo! - Ele respondeu, desligando logo em seguida. Bruno correu até a adega, escolhendo algum vinho e trazendo a garrafa consigo, provavelmente para levar à festa. Eu fui atrás da minha bolsa e do meu sobretudo vermelho, e quando cheguei na sala outra vez ele já segurava a porta para mim, vestindo seu próprio sobretudo bege e me encarando daquele jeito apaixonado. Sem dizer nada, o segui até a garagem e relaxei na viagem para a virada de ano, aliviada por ter sido incluída na pergunta de Duda - o que queria dizer que, dessa vez, eu não apareceria de surpresa como uma penetra de festa. 
… 
– Até que enfim! 
Duda nos atendeu com uma taça de vinho na mão, o que achei ser o motivo de vê-la mais sorridente nessa ocasião do que na última em que estivemos juntas.
Bruno entrou primeiro, dando um beijo e um abraço nela, enquanto entregava o vinho trazido e pedia desculpas pelo atraso. Ela pareceu não se importar. Quando me viu, não mudou em nada sua expressão simpática, indo me dar dois beijos de boas-vindas.
– Bruno conhece a casa, ele mostra o resto pra você. Mas essa é a minha sala. 
Tive tempo de dar uma olhada rápida em volta. O apartamento era muito grande - muito maior do que o que uma secretária poderia manter. O lugar estava cheio de gente que conversava de forma descontraída e ria de piadas soltas.
Um grupo de homens gritou alguma coisa ao ver Bruno, o que pensei ser também um urro de “olá”. Ele não se mexeu, mas sorriu de forma sincera de volta, e então me perguntei se o motivo de ter ficado imóvel era porque eu estava agarrando sua camisa por trás. 
– Como vai, Bruno? - Um deles disse, se aproximando e cumprimentando-o com alegria. 
– Tudo bem, Michael. E com você? 
– Bem, como sempre. 
O homem era negro. Não muito escuro, mas o suficiente para não ser considerado mulato. Ele tinha as feições incrivelmente fortes, mas muitíssimo belas. Seus lábios eram cheios e perfeitamente desenhados, as sobrancelhas muito escuras, cabelo muito rente à cabeça e olhos castanhos. Ele era tão alto quanto Bruno, e era possível ver que também era forte através do casaco branco justo que vestia. Seu sorriso era belíssimo. 
– Essa é Anne. Ninha, esse é Michael, marido de Duda. 
– Ah! Oi! - Falei surpresa, estendendo a mão para ele. Michael sorriu abertamente para mim. 
– Encantado, Anne. Estou acostumado com uma leve surpresa nas feições das pessoas para as quais sou apresentado como marido da minha mulher. Acho que ninguém me imagina assim. 
Ele estava certo, eu definitivamente não o imaginava assim. E o pior era que eu sequer sabia se isso poderia ser classificado como preconceito.

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