Capítulo 35

3.3K 168 8
                                    

Bruno segurou minha mão outra vez, apertando-a com firmeza. Levantei a cabeça apenas para encarar o dr. Carlos, que também me olhava. Relaxei um pouco ao notar que seu olhar, de fato, não trazia nenhum pré-julgamento. 
– Ok… - Consegui dizer, enquanto me forçava a sustentar seu olhar. Como resposta, ele apenas sorriu. Bruno apertou minha mão com mais força. Mas eu sabia que não havia sido proposital.
– Bom… - Ele recomeçou - Vamos fazer alguns exames. 
– Que tipo de exames? - Bruno perguntou. 
– São muitos. Hemograma completo, grupo sanguíneo, glicemia, rubéola, hepatite B, sífilis, HIV… Mas isso é pra todos os casos. - Ele se apressou em deixar claro, vendo meu desconforto - Todas as grávidas precisam passar por esses exames. Mas, de fato, vou passar alguns mais específicos pra você. 
Eu pensava estar livre desse tipo de doença. Mas agora, depois dessa consulta, nem disso eu poderia ter certeza. 
– E se acusar alguma coisa? - Perguntei, deixando o desconforto de lado e fazendo a pergunta em voz alta, agora genuinamente preocupada. 
– Se acusar alguma coisa, nós vamos tratar. - Ele sorriu de maneira simples e contagiante, o que, de alguma forma, fez com que eu me sentisse menos mal - É pra isso que estou aqui, não é? 
Sorri em resposta, sem nem notar que o havia feito. 
– E o sexo do bebê? Ela vai fazer uma ultrassonografia? - Bruno perguntou, um pouco mais alto do que o tom habitual de sua voz.
– Ah, sim. Com um pouco mais de três meses, poderemos ter mais certeza do sexo através da ultrassonografia. 
– Mas ela está com quase três meses. - Sua voz saiu como se ele fosse uma criança cujos sonhos tivessem todos sido roubados dele de uma única vez. 
– Bem… Existem métodos em que é possível determinar o sexo antes desse período. Mas são todos caros… 
– Quanto é? - Perguntei, mas minha pergunta foi abafada pela indiferença de Bruno. 
– Quais são? - Ele perguntou. – Tem a sexagem fetal. É feita através de um exame de sangue, e identifica a ausência ou a presença do cromossomo Y no sangue da mãe. Como esse cromossomo é exclusivo dos homens, a presença dele indica um menino. A ausência, uma menina. 
– E quais são as chances de erro? - Ele perguntou, realmente interessado. 
– Muito baixas. - O dr. Carlos pontuou. 
– Ótimo. Pode pedir junto com os outros exames então. - Bruno finalizou a questão, com seu mais novo ar de “chefe de família”. 
O médico consentiu, anotando tudo em vários papéis. 
– Bom, Ninha. Quero fazer alguns exames simples com você agora. Pode tirar suas roupas e colocar o roupão no banheir… 
– Como? - Bruno interveio, e eu podia jurar que estava a ponto de agredi-lo fisicamente caso ele não parasse com aquele ciúme exagerado e desnecessário. O dr. Carlos parecia confuso. 
– Eu tenho que fazer alguns exames nela… - Ele começou. 
– E ela precisa tirar a roupa pra isso? - Bruno perguntou, mas pelo menos seu tom de voz não era rude. Ele sabia ser educado, mesmo puto.
– Bom, eu tenho que checar se há algum nódulo… 
– E ela precisa tirar a roupa pra isso? - Ele repetiu. 
– .Bruno? - Chamei-o, um pouco inquisitora. 
– Está tudo bem. - O dr. Carlos riu e olhou para. Bruno, como se estivesse pedindo permissão para fazer alguma coisa - Mas gostaria de pelo menos checar os lugares mais importantes. Ela pode manter a roupa. Tudo bem? 
Como ele iria tocar em mim, e isso não tinha nada a ver com nenhum outro corpo, me achei no direito de responder. 
– Tudo bem. - Respondi, já levantando e caminhando para a outra sala, onde ficava a cama para exames e equipamentos específicos. O dr. Carlos surgiu logo atrás de mim, me ajudando a subir até a cama alta e me deitando lá. 
Naturalmente, Bruno já estava ali, assistindo tudo com os braços cruzados afastado de nós, ainda na porta. O médico apalpou meu pescoço com cuidado, à procura de nódulos, e simplesmente foi fazendo isso em muitas articulações e quase todas as juntas do meu corpo, se prolongando nos seios, debaixo dos braços e na área da virilha. Por vezes, eu olhava para .Bruno, que parecia em cólicas, mas ainda assim acompanhava o movimento das mãos dele no meu corpo com um traço de preocupação, como se estivesse atento a qualquer reação estranha do médico. 
– Tudo bem. - Ele finalmente falou, me ajudando a levantar. - Você parece ótima. Mas quero que o seu ginecologista faça um exame apurado em você. Vamos acompanhar isso direito. 
– Claro. - Concordei, ficando de pé e seguindo outra vez para o escritório, com Bruno e o dr. Carlos atrás de mim. O resto da consulta foi preenchido com explicações do médico relacionadas à minha alimentação, dando ênfase nos alimentos que eu deveria evitar. Além disso, fui informada do que poderia ou não poderia fazer, além da frequência com a qual eu deveria manter as visitas ao obstetra, e alguns exercícios físicos aconselhados e os proibidos. 
– Conforme você for ficando maior - Ele começou, rindo -, eu vou ficando mais chato com a gravidez. Ok? 
Não sei por que demorei tanto para me lembrar de um pequeno detalhe, até então completamente ignorado não só por mim, como também por Bruno e até mesmo por Duda. 
– Nós vamos viajar. - Falei, sem me preocupar se aquela informação parecia repentina ou fora de contexto - Vamos nos mudar… Pra Londres. 
Encarei Bruno, perguntando-o silenciosamente porque ele não havia lembrado aquilo. Ele me olhou distraído no início, mas quando se deu conta de que eu estava certa, suspirou audivelmente e se recostou na cadeira. 
– Vamos ter que encontrar outro obstetra. - Ele falou, quase não contendo o sorriso no canto dos lábios.
– Ah, que pena. - O dr. Carlos falou, genuinamente sentido, e Bruno o encarou com uma cara de “‘Que pena’ é a puta que o pariu!” - Mas tudo bem. Conheço ótimos obstetras espalhados por Londres. Posso dar a vocês os contatos…
– Eles são da sua idade? - Bruno perguntou, e embora fosse perceptível que ele não quisesse soar rude, eu quis repreendê-lo. Encarei-o com ódio, mas ele me olhou como uma criança inocente.
– Desculpe, doutor. - Falei, me voltando para o médico e dando algum tipo de desculpa esdrúxula pela falta de educação - Bruno tem andado esquisito desde que soube da gravidez. 
– Sei que posso parecer novo - Ele começou, encarando Bruno e pronunciando as palavras de uma forma muito educada -, mas posso lhe garantir que levo a sério a minha profissão. Jamais deixaria sua futura esposa e mãe do seu filho carente de atenções médicas. Unicamente atenções médicas.
Eu poderia achar que ele havia entendido errado a hostilidade de Bruno, mas sua atitude deixou claro que ele havia entendido - e muito bem - o motivo daquelas pequenas grosserias. No momento seguinte, o médico levou a mão esquerda ao queixo, deixando-a lá como se estivesse apenas se apoiando, mas conseguiu deixar propositalmente em evidência a aliança fina e muito discreta no anelar. Além de ser um profissional ético, o dr. Carlos era casado. E aquelas verdades com certeza fizeram com que Bruno se sentisse um idiota. 
– Eu… sei. - Ele falou, abaixando a cabeça muito sem graça. 
– E então… - Me voltei para o médico, ignorando Bruno solenemente - Eu gostaria sim dos contatos, doutor. Se puder me passar… 
Bruno não falou mais nada durante a consulta. As outras dúvidas que eu tinha - algumas bem idiotas - foram respondidas sem que ele desse um pio, sequer para opinar. 
– Bem, mais alguma pergunta? - O dr. Carlos falou, tentando puxar Bruno novamente para a conversa. 
– Não. - Respondi, sem esperar por ele, que me seguiu na resposta logo depois. 
– Não. 
– Então, como é muito provável que vocês não estejam mais aqui no próximo mês da gravidez, desejo a você - ele falou, apontando para mim - uma ótima gestação. Tudo vai dar certo, não se preocupe. 
– Ok… - Comecei, já me levantando, e fazendo com que Bruno se levantasse também - Muito obrigada, doutor. E… Desculpe qualquer coisa. 
– Está tudo bem. - Ele sorriu, e se virou para Bruno, estendendo a mão - Parabéns pela nova família. 
– Obrigado. - Ele disse aceitando a mão estendida, e seu embaraço era evidente. Achei bem feito.
O caminho até o carro foi silencioso, com ele me seguindo, tentando caminhar na mesma velocidade que eu. Bruno não disse uma palavra, o que achei ótimo, porque não estava afim de discutir sobre a repentina crise esquisita dele. A viagem também foi silenciosa, embora, vez ou outra, eu notasse que ele me encarava quase que inocentemente.
– Não vai mais falar comigo? - Ele perguntou de repente, mas não me assustei. Me mantive calada, olhando a paisagem, fazendo questão de não esboçar nenhuma reação. Ele não insistiu, voltando a deixar a viagem silenciosa, então aquilo havia sido nossa única forma de interação durante todo o percurso. Quando chegamos no prédio dele, saí do carro sem dar a ele tempo de dar a volta e abrir minha porta, como eu sabia que faria. Caminhei teatralmente até o elevador, com Bruno me seguindo de perto, provavelmente em pânico que eu tropeçasse ou algo assim.
– Por que você não está falando comigo? - Ele insistiu assim que entramos no apartamento. Encarei-o com cara de bronca. 
– Você foi um idiota. Por que diabos agiu daquele jeito imaturo? - Perguntei, querendo que ele desse alguma desculpa que fizesse com que meu desgosto passasse. Ele fechou ainda mais a cara ao me responder: 
– Não posso ter ciúmes? Só você?
– Não, não pode, porque eu nunca te dei motivos pra isso. Não foi o seu caso. 
Me senti debilmente vitoriosa por deixá-lo sem argumentos. Ele me encarou, claramente tentando pensar em uma boa resposta, mas tudo que se limitou a fazer, depois de alguns segundos em silêncio, foi amarrar mais a cara. 
– Não preciso de motivos pra sentir ciúmes de você… - Ele começou, mas eu o interrompi: 
– Mas precisa de motivos pra ser rude com os outros. Nunca mais faça isso, foi vergonhoso. - Pontuei, dando as costas para ele e indo para o quarto me deitar. 
Ele não me seguiu. Depois de muitos minutos ali, sozinha, comecei a me criticar pela bronca exagerada. A crise idiota de ciúmes de Bruno havia, de fato, sido não só desnecessária como embaraçosa. Mas talvez eu não precisasse ser tão dura com ele. Ele só se sentiu ameaçado. O problema foi não saber lidar com a insegurança. 
Fui tirada de meus devaneios quando, momentos depois, Bruno surgiu no colchão ao meu lado, me abraçando, pedindo desculpas por ter sido idiota e se lamentando por ter me deixado irritada. Como era de se imaginar, não consegui ficar puta com ele por muito mais tempo, e segundos depois eu já estava ronronando contra seu peito como um gato manso. 
Deixei que o clima da nossa pequena reconciliação me deixasse mole como gelatina em seus braços, não me importando com mais nada. E então, quando eu já estava aceitando o fato de querer ser agarrada e devorada por ele, Bruno cortou meu barato mais uma vez.
– Vou preparar o almoço. - Ele concluiu, dando um beijo na minha testa, exatamente como antes. 
– Mas… - Comecei, querendo entender por que diabos ele havia jogado um balde de água fria no meu tesão. 
– Pode ficar deitada, quando estiver tudo pronto eu te chamo. 
E assim, sem mais nem menos, me deixando naquele estado deplorável, ele saiu. Bufei, amaldiçoando-o por ser um infeliz esquisito.
Meu terceiro mês de gravidez estava começando, e enquanto eu me preocupava unicamente com a minha barriga - que finalmente começava a dar sinais de crescimento -, Bruno se preocupava com absolutamente tudo: A empresa, a mudança e a gravidez. 
Sua preocupação era exagerada, como eu imaginava que seria. Mas foi só na segunda-feira depois da notícia que notei que seu comportamento super protetor me daria mais dor de cabeça do que imaginava. 
– O que está fazendo? - Ele falou, irrompendo pelo banheiro sem em momento algum pensar que talvez pudesse estar invadindo minha privacidade. 
– Escovando os dentes? - Respondi, levantando até a altura de seus olhos a escova de dentes que eu segurava.
– Por que acordou tão cedo?
– Acordei na hora que sempre acordo… 
– Exatamente. Acho que você deveria começar a acordar mais tarde… 
Olhei-o, genuinamente confusa. 
– Meu horário no trabalho não mudou… 
– Ahm? Você não pode ir trabalhar! - Ele falou um pouco desesperado, como se eu tivesse acabado de anunciar que estava indo praticar bungee jumping. 
– E por que não? 
Mas era claro que eu já sabia a resposta. Era a resposta-padrão, motivo de tudo a partir da sexta em que Bruno soube da notícia.
– Porque você está grávida! 
– E…? - Provoquei. 
– “E” que você não pode trabalhar grávida! 
– Você lembra que eu já trabalhei grávida durante dois meses, né? 
– Porque não sabíamos! Agora que sabemos, temos que fazer a coisa certa. Você e o bebê podem correr riscos! 
– Me explique como é que eu posso correr algum risco arrumando livros em ordem alfabética? 
– Tem escadas naquela porra! 
Bem, era óbvio que ele estava certo quanto a esse ponto. Mas eu não era idiota. 
– É claro que eu não vou subir as escadas. Vou fazer o trabalho mais leve. 
– Você não vai! - Ele me cortou, já tomado pelo desespero. 
– Eu vou! Pára de mandar em mim! 
– Não estou mandando! Estou pedindo! 
Sua voz saía esganiçada, o que seria muito engraçado se não fosse assustador.
– Bruno, pelo amor de Deus. É só no final da gravidez que o trabalho deve ser interrompido. E se isso não for o suficiente pra você, saiba que eu jamais colocaria nosso filho em risco. 
Ele parou, um pouco ofegante até, olhando de uma forma maníaca para minha barriga.
Cheguei atrasada no trabalho aquela manhã, por diversos motivos. Primeiro, Bruno insistiu para que eu levasse dois casacos, alegando que o tempo ainda estava muito frio, mesmo quando nos aproximávamos da primavera. Segundo, porque me fez tomar um café-da-manhã redobrado, dizendo que minhas energias deveriam estar a postos para o dia de trabalho. Terceiro, porque ficou insistindo em me fazer prometer, por todas as almas sagradas do universo, que eu tomaria cuidado. 
Quando finalmente me deixou na biblioteca - porque, mesmo tendo que ir pelo caminho inverso ao que ele fazia todos os dias para ir ao trabalho, Bruno se recusou a me deixar ir a pé ou de taxi -, ele parecia ainda mais temeroso. 
– Vou te ligar algumas vezes durante o dia, ok? 
– Contanto que “algumas vezes” seja um número normal… - Provoquei.
– Por favor, me atenda. Senão eu venho aqui ver por que você não atendeu. 
Eu prometi que o faria, mas minha intuição não havia falhado quando imaginei que aquilo não seria o suficiente. Por isso, antes da minha hora de ir embora, Bruno simplesmente se materializou ao meu lado, sem se importar se poderia ou não estar em uma área restrita apenas a funcionários da biblioteca. 
Sem cerimônias, foi atrás do sr. Blake, apenas para explicá-lo, teatralmente, que “havia uma vida dentro de mim, e que, por tudo quanto era mais sagrado, eu não poderia correr riscos”. O sr. Blake obviamente tentou explicá-lo que meu trabalho era tão monótono que nada poderia acontecer, mas Bruno parecia cético. Fiz uma careta atrás dele, apenas para informar ao sr. Blake que não adiantava discutir com um teimoso maluco. 
Seus exageros não melhoravam nem quando estávamos em casa. Agora que uma pequena barriga saliente começava a marcar minhas roupas mais justas, Bruno parecia fazer alguma associação bizarra disso com minha alimentação, dizendo que agora eu deveria comer também em dobro. Para não ouvir reclamações, comecei a adotar o hábito de jantar porções pequenas. Era claro que ele queria que eu comesse um boi a cada jantar, mas depois de convencê-lo (aos berros, quando minha paciência se esgotou) de que aquilo seria impossível, ele pareceu aceitar.
E dessa forma, Bruno passou a ser um verdadeiro perseguidor na minha vida. Todos os dias eu recebia, pelo menos, cinco ligações suas, me perguntando se havia algo errado e o que eu estava fazendo. Quando ficava exausta daquela perseguição, desligava o celular. Mas não adiantava, porque Bruno também tinha o número da biblioteca. E quando eu pedia para o sr. Blake dar qualquer desculpa para que eu não tivesse que falar ao telefone, ele simplesmente aparecia, minutos depois, esbaforido pela porta principal e fazendo um drama shakespeariano.
Sua preocupação e ansiedade aumentaram ainda mais quando fomos fazer os exames passados pelo obstetra - tanto os de praxe quanto o que indicaria o sexo do bebê -, mesmo sabendo que os resultados só sairiam uma semana e meia depois, além dos exames ginecológicos. Eu já me sentia um pouco sufocada, mas não o suficiente para me incomodar. Aliás, seria muito bom se Bruno me sufocasse em determinados momentos. 
– Hmmmpf… - Exalei, agarrada a ele na cama. Passava das onze da noite. 
– Que foi? Quer alguma coisa? - Ele perguntou, desviando os olhos da tv e me encarando preocupado. Ultimamente, ele sempre me encarava daquele jeito, e aquilo estava começando a me irritar. 
– Não foi nada, Bruno. - Falei, já meio puta - Só estou te abraçando. 
– Ah. Mas você est… 
– Estou bem. Não estou enjoada. Nem com fome, nem com sede, nem com dores, nem com frio, nem com calor, nem com sono. 
– Ah… - Ele falou, só para ter algo para dizer. Me agarrei a ele outra vez, encaixando meu rosto na curvatura do seu pescoço e respirando de uma forma propositalmente intensa ali. Senti-o estremecer de leve. 
– Não namoramos há algum tempo… - Falei, tentando recordá-lo, de uma forma sutil, que aquele era um período sem sexo relativamente longo, e, no estado em que me encontrava, desesperadamente longo.
– Ah, amor… Você sabe… - Ele começou, alisando meu braço - Eu ando muito atarefado com a empresa. E o tempo livre que tenho uso pra arrumar aos poucos a mudança e tomar conta de você e do bebê. 
– É, eu sei. - Falei, dando beijos suaves pela extensão do seu pescoço - Mas não é como se você não tivesse tempo nenhum livre… Por exemplo, agora… 
– Ahm… - Ele começou, se afastando um pouco de mim - Eu estou meio cansado… Sabe, hoje foi um dia difícil. 
Continuei abraçada a ele, remoendo um sentimento crescente de rejeição. Mas ao invés de ficar triste e deprimida, me senti incrivelmente puta. 
– Você está me dizendo que está tão cansado que não podemos nem curtir um pouco o momento? - Perguntei, controlando minha fúria quase titânica.
– Estou morrendo de sono… - Ele falou, dando um bocejo audível e, eu tinha certeza, falso. 
Continuei encarando-o, planejando de quantas formas poderia torturá-lo. Mas depois de algum tempo, tudo que fiz foi engolir em seco e me desvencilhar dele, virando de costas e puxando o edredom todo para mim. Algum tempo depois, ouvi a tv sendo desligada e seus braços envolverem minha cintura, sua mão tocando como sempre minha barriga. 
– Não encosta em mim. Isso provavelmente vai demandar de você muita energia. 
Ele pareceu não ligar para o comentário, e se aproximou ainda mais de mim, espalmando sua mão na minha barriga. Aquele pequeno contato, mesmo que inocente, estava me incendiando. Tudo porque Bruno havia decidido bancar o monge, e provavelmente estava se divertindo às custas do meu desespero sexual. Mesmo gostando de sentir sua pele, segurei sua mão com firmeza e retirei-a da minha barriga. 
– Ninha… - Ele começou, mas o interrompi.
– Estou falando sério. Se você não tem tempo ou disposição, não sou eu que vou ser o estorvo que vai te manter acordado. Bons sonhos, amor. 
Puxei a última palavra em um tom de deboche, e com toda a certeza ele percebeu. Ainda assim, não respondeu nada, apenas aceitando com um suspiro de desgosto a distância que eu havia estabelecido entre nós. Mas não adiantava. 
Na manhã seguinte, seus braços estariam em volta da minha cintura e sua mão sempre estaria espalmada no meu umbigo outra vez.
– Está nervosa? 
– Não. - Menti categoricamente. 
Eu estava nervosa. Bruno e eu estávamos no carro dele, indo ao obstetra com os resultados dos exames. Para manter nossa calma - ou pelo menos tentar - decidimos não ler nada antes do próprio médico, porque se houvesse alguma observação fora do “normal” naqueles laudos, mesmo que não fosse nada demais, não entenderíamos os termos médicos e acabaríamos em pânico, talvez à toa.
Por isso, os envelopes ainda estavam lacrados. Tanto os exames relacionados à minha saúde quando o exame que informava o sexo do bebê.
– Eu estou. - Ele falou, tentando manter os olhos na rua à frente. 
Bruno não precisava sequer anunciar aquilo: Estava óbvio.
Me senti um pouco mal por talvez ser a responsável por não gerar o nosso filho da forma correta. Eu rezava para todos os santos que não houvesse nada naqueles exames, para que o bebê não corresse riscos, principalmente porque ele era a coisa mais importante do mundo agora, mas também porque eu jamais me perdoaria caso algo acontecesse a ele. Porque a culpa seria minha. 
– Não vai dar nada… - Falei, um pouco baixo, tentando convencer a mim mesma que era bobagem se preocupar. Se houvesse algo, os exames anteriores teriam apontado. 
– Claro que não. - Ele falou ao meu lado, apoiando a mão direita na minha perna e aplicando ali um pouco de força, como se quisesse me passar confiança. Ainda assim, não foi difícil notar o vacilo de insegurança no sorriso que ele deu. 
Fiquei calada o resto da viagem. Ele fez o mesmo. Qualquer palavra que soasse entre nós dois naquele momento parecia como uma fagulha na pólvora, nos aproximando de uma explosão de nervos a cada segundo. 
Quando chegamos, nosso nervosismo pareceu se intensificar. Tentei parecer calma, porque se Bruno percebesse meu estado provavelmente entraria em desespero, dizendo que aquela tensão toda acabaria prejudicando o bebê. E eu acreditaria, e entraria em pânico também. E então seríamos dois pais desesperados à beira de uma síncope. 
– Bom dia, Ninha. Bruno. 
Nos sentamos, e me deixei levar pela aura de positividade e animação do dr. Carlos. Bruno estava tão nervoso que parecia ter simplesmente esquecido de sentir ciúmes. 
– Bom dia, doutor. - Ele falou, entregando imediatamente os exames - Não vimos nada porque… 
– Porque estávamos com medo. - Concluí, imaginando que talvez falar, naquele momento, pudesse aliviar um pouco a minha tensão.
– Bom, também… - Bruno continuou - Mas porque achamos melhor que o senhor visse, e caso houvesse alguma coisa anormal, que nos explicasse. Antes que chegássemos a conclusões erradas. 
– Fizeram muito bem. - Ele disse, aceitando os envelopes das mãos de Bruno e abrindo-os calmamente, como quem abre uma carta de Natal. 
Ele analisou os resultados por algum tempo. Um bom tempo. Talvez semanas. Meu estômago começava a dar reviravoltas aleatórias, fazendo com que eu me sentisse um pouco mais enjoada a cada segundo transcorrido. Bruno estava imóvel na cadeira ao meu lado, olhando fixamente para o médico, que ainda virava e desvirava as páginas.
O zumbido do ar condicionado parecia muito mais alto agora, e me incomodava mais também. Estava frio, mas não dei muita atenção a esse pequeno detalhe. Eu podia escutar cada engolida seca que Bruno dava, e aquilo estava me deixando à beira de um ataque de nervos. Até o barulho das páginas sendo viradas estavam dando corda à minha iminente explosão.
Se o doutor não tivesse falado alguma coisa naquela hora, eu provavelmente teria gritado. 
– Podem respirar aliviados. A mamãe não tem nenhum tipo de problema que possa prejudicar o bebê. 
Senti algumas toneladas sumirem das minhas costas. Suspirei profundamente, não porque segui o sentido literal do que o dr. Carlos havia dito, mas sim porque o alívio que senti foi tão grande que mal podia lidar com ele. Fechei os olhos e agradeci, mesmo sem saber a quem ou ao que direito, mas sabia que deveria ser grata. E eu estava. 
– Eu sabia. - Ouvi Bruno falar ao meu lado, mas seu tom de voz entregava o alívio que ele próprio sentia. Eu ainda estava de olhos fechados, leve demais para reagir de alguma forma, mas tinha certeza que ele estava sorrindo. 
Senti-o agarrar minhas mãos e apertá-las, me trazendo de volta à realidade.
Abri os olhos e me deparei com o dr. Carlos, segurando os dois envelopes idênticos fechados que restaram. 
– Dois? - Ele perguntou, um pouco confuso. 
– É… Eu pedi pra fazerem duas vezes… Pra não restarem dúvidas. - Bruno falou, um pouco tímido.
– Ele gosta de gastar dinheiro à toa… - Falei, completamente distraída pelos papéis nas mãos do médico.
Ele riu. 
– Vocês não abriram? - Ele perguntou, nos encarando, e meu coração de repente começou a bater forte outra vez. 
– Não. Deixamos pra receber todas as notícias de uma vez. - Bruno falou, rindo do ainda recente alívio e da expectativa para mais uma novidade. 
– Entendi. - Disse o médico, abrindo sem cerimônias o primeiro envelope. Se eu prestasse atenção, tinha certeza que poderia ouvir as marteladas do meu coração naquele momento. 
Todos os movimentos do dr. Carlos pareciam ser feitos em câmera lenta, e eu tinha certeza que toda aquela adrenalina não podia fazer bem ao bebê.
Bruno e eu o encarávamos com atenção absoluta, registrando cada mudança em sua expressão. Como se soubesse disso, ele parecia fazer força para não esboçar reação alguma. De uma forma irritantemente calma, pegou o segundo envelope e abriu, lendo também o laudo daquele exame. 
– Bom, os dois deram o mesmo resultado… - Ele começou, me fazendo tremer um pouco - Então acho que realmente não restam dúvidas. 
Ele parecia divertido, mas meus nervos estavam em um estado que, se antes o sorriso do médico bonitão parecia deslumbrante, agora eu tinha vontade de socá-lo. 
– E então? - Perguntei, e só me dei conta de que a voz era minha depois de ouvi-la.
A resposta veio, provavelmente, em menos de dois segundos. Para mim, no entanto, o silêncio entre aquela pergunta e a resposta pairou no ar por, pelo menos, uma eternidade.
– É uma menina. 
Esperei que aquele pedaço de informação fizesse efeito, tanto em mim quanto em Bruno, mudo e paralisado ao meu lado. Embora eu tivesse minhas convicções de que, no final das contas, o bebê seria realmente uma menina, ainda assim ouvir a confirmação me fez ficar ainda mais feliz. Uma menina. 
Olhei para Bruno, que ainda encarava o médico da mesma forma. Assim como eu - ou talvez mais - ele parecia distante, tentando processar a informação. Não poderia dizer se aquela novidade tinha sido bem aceita por ele ou não, porque ele não esboçava reação alguma. 
– Bom, na verdade… - O dr. Carlos continuou - Posso garantir que não há meninos nessa gestação, mas não devemos descartar a possibilidade de gêmeos ou mais, embora sua barriga não esteja suficientemente grande pra isso. Mas caso haja mais de um bebê, posso dar a vocês a certeza de que todas serão meninas. 
Estremeci com a ideia de “gêmeos ou mais”. Como mãe de primeira viagem, se uma gravidez simples já começava a me dar um pouco de pânico, imaginei o que gêmeos não seriam capazes de fazer comigo. 
– E como podemos ter certeza… - Comecei a pergunta, mas não precisei terminá-la.
– Vocês vão saber ao certo quantos bebês são depois da primeira ultrassonografia, que pelo que diz aqui na sua ficha, já está agendada. Mas, pela minha experiência, creio que seja uma única menina mesmo. 
Prestei bastante atenção em tudo que o dr. Carlos dizia, mas era impossível estar completamente atenta a ele enquanto Bruno se mantinha ali, em estado catatônico, imóvel com seus pensamentos, incapaz de fazer parte da troca de informações entre nós. Só consegui relaxar quando, algum tempo depois - provavelmente o tempo necessário para que ele tivesse alguma reação - virei para o lado outra vez e o vi sorrindo debilmente enquanto mantinha seu olhar desfocado na parede atrás do dr. Carlos. 
Aquilo só poderia significar que ele estava feliz. 
Respirei mais aliviada. Quando a hora de ir embora chegou, chamei-o com uma voz calma e baixa, quase como se estivesse tentando acordá-lo de um sono profundo. Ele pareceu despertar, e embora ainda estivesse extremamente distraído, agradeceu ao dr. Carlos pela atenção com um sorriso radiante no rosto e saiu do consultório, me puxando pela mão. Aos poucos, ele estava voltando a si.
– Meu Deus, e se forem trigêmeas? - Bruno perguntou, animado como uma criança em véspera de Natal, quicando levemente na cama e fazendo com que eu pulasse também ao seu lado. 
– Não vão ser. - Falei, tentando me cobrir com o edredom. 
– Como você sabe? O médico disse que não devemos descartar a possibilidade… 
– Bom, eu espero que não seja. 
– Por quê? - Ele falou em um tom ofendido, embora eu não imaginasse o que exatamente o ofendeu. 
– Não é você que vai parir, né bonitão? - Eu ri, beliscando-o de leve. 
– Bom, pelo menos você passaria por isso uma única vez, e eu não encheria mais o seu saco - Ele falou, tentando parecer casual, enquanto se enfiava debaixo do edredom e se agarrava em mim como sempre - Se vier uma só, vamos ter que repetir a dose pelo menos mais duas vezes. 
Fiquei calada por algum tempo, de costas para ele. Outra vez, Bruno havia me pego de surpresa, se mostrando extremamente confiante em coisas que pareciam banais quando ele falava, mas que eram enormes. 
– Você quer ter três filhos? - Perguntei com uma voz fraca, depois de algum tempo. 
– Pelo menos. - Ele falou contra meus cabelos de forma calma - Mas eu não tenho pressa. 
Fiquei calada mais algum tempo, deixando que a confiança dele me inundasse aos poucos. Eu ainda era insegura em muitos aspectos, mas Bruno parecia levar tudo de uma forma tão simples que, com o passar do tempo, me acalmava também. Quando me virei e fiquei de frente para ele, senti seus músculos contraírem, como normalmente acontecia nos últimos dias. Talvez ele estivesse começando a sentir falta do nosso contato tanto quanto eu sentia, mas naquele momento minha intenção não era seduzi-lo. 
– Desculpa se pareço estar desconfortável. - Comecei, muito próxima ao seu rosto. 
– Tudo bem… - Ele me abraçou com força - Não precisamos falar sobre isso agora. 
– Não, não me incomoda - O interrompi, retribuindo o abraço e o olhando nos olhos - Não estou desconfortável, é só que… Eu nunca pensei que alguém fosse querer planejar esse tipo de coisas comigo.
– Que tipo de coisas? 
– Você sabe… Ter uma família… Filhos, casamento… Ainda é um pouco surpreendente pra mim… 
Dessa vez, foi ele que ficou em silêncio, me analisando profundamente. Quando voltou a falar, senti meu coração derreter mais um pouco.
– É melhor ir se acostumando então, porque você vai ter que aceitar o fato de me aturar pelo resto da vida. 
Me aconcheguei mais nele e sorri, sem me importar com mais nada. Fechei os olhos e fiquei ali, agarrada a ele, sem esperar nada. Por isso, fui pega de surpresa com um beijo carinhoso e doce. Retribuí o ato, me agarrando involuntariamente no pescoço dele. Eu não queria forçar a barra, não queria mudar a intensidade daquele beijo, mas era impossível controlar a minha libido. 
Forcei minha língua contra sua boca, e quando ele abriu seus lábios, me permitindo aprofundar o beijo, quase berrei de alegria. Meu corpo começou a tremer sem que eu pudesse evitar, porque aquele tipo de intimidade há algum tempo me fazia falta. E então, em menos de um minuto, eu estava completamente pronta para ele. 
Mas, como sempre, Bruno se afastou, mesmo que ofegante. Senti que estava muito próxima de assassiná-lo.
– Durma. O dia foi pesado pra você hoje. - Ele falou, me dando selinhos de leve e tentando se afastar um pouco de mim. 
– Não foi pesado. Não estou com sono. - Falei, um pouco desesperada, ainda agarrada ao seu pescoço. De certa forma, aquilo era mentira: Eu estava mesmo cansada, não porque havia feito muita coisa naquele dia, mas porque passei metade dele tensa com tudo que tinha para saber. Bruno usou seu golpe mais baixo, movendo seus dedos lentamente de cima a baixo nas minhas costas, percorrendo a espinha de forma torturante e lenta. Ele sabia que aquilo era fatal. Sabia que eu dormiria instantaneamente. Merda. 
– Foi sim. E eu tenho certeza que o sono vai chegar. - Ele falou, com sua voz mais melodiosa ao pé do meu ouvido, e embora meu corpo ainda ardesse por ele, fui sendo acalmada aos poucos por sua mão nas minhas costas, enquanto a outra afagava minha barriga, como sempre. 
E então, obviamente, eu dormi.
Bruno corria o dia inteiro de um lado para o outro, atarefado demais com tudo. Era assim durante toda a semana, e até os fins de semana pareciam corridos. Isso porque havia coisas da empresa ainda pendentes, principalmente no que dizia respeito à mudança da diretoria. Como se não bastasse, nossa mudança se aproximava rapidamente, e caixotes começavam a surgir por todos os lados. Assim, o tempo que tínhamos juntos, normalmente as noites, eram preenchidos por revisões nas papeladas da empresa e caixotes enfileirados pelos corredores do apartamento dele. Sua atenção em mim, embora redobrada conforme minha barriga aumentava, era nula quando se tratava de sexo, e a coisa se tornava tão estranha que comecei a me preocupar. 
Eu estava agora com quase 12 semanas de gestação, e desde o momento que havíamos descoberto sobre a gravidez, Bruno não me tocava. 
Cada tentativa desesperada minha resultava em uma nova desculpa, e mesmo que eu soubesse que ele andava realmente atarefado, era impossível deixar de notar que, se fosse algo relacionado ao bebê, e não a mim, ele parecia completamente alheio ao resto do mundo e dava total atenção às minhas necessidades. Ele não queria transar comigo. E eu não sabia o motivo. E estava subindo pelas paredes. 
– Alô? 
– Oi, doutor. É a Ninha. Anne Olsen. - Falei, tentando parecer casual. 
– Olá, Ninha. Aconteceu alguma coisa? - O dr. Carlos respondeu, do outro lado da linha. 
– Não… Nada com o bebê. Estou ótima. Quer dizer, com um pouco de enjoo, e dor nas costas, mas… - parei, tentando voltar ao assunto em pauta - É outra coisa. 
– Pode falar.
– Ahm… - Comecei, me sentindo um pouco idiota - Não sei se é com você que eu devo falar sobre isso… 
– Podemos tentar. - Ele respondeu, encorajando-me. Hesitei um pouco, mas lembrei do meu atual estado. 
– É sobre Bruno. 
Ele ficou em silêncio, provavelmente esperando que eu prosseguisse. Como isso não aconteceu, ele voltou a falar. 
– Ok, estou ouvindo. 
Suspirei. 
– Ele… Ele está distante. 
– Distante como? Ele não está dando atenção à gravidez? 
– Não, não é isso. Ele dá bastante atenção ao bebê. Até me sufoca… 
– Então? 
– Então… - Comecei, e tive certeza de que estava começando a corar - Ele me dá atenção, mas… Só com coisas relacionadas à gravidez… Entende? 
Rezei para que ele entendesse. E como um obstetra experiente, embora novo, ele entendeu. 
– Ah. Vocês estão distantes como casal.
– É… 
– Ele não mostra interesse…
Interrompi-o, um pouco desesperada. 
– Não! Ele não me toca! Se recusa a transar comigo! Fica inventando desculpas toda vez que eu tento alguma coisa, desde que soube da gravidez! Eu não aguento mais! 
– Calma, Ninha.
Me calei, esperando que ele me desse alguma explicação com relação à atitude de Bruno, ou que me desse uma solução. Qualquer coisa seria bem vinda. 
– Ele deixou de ser carinhoso com você? - Ouvi-o perguntar. 
– Não… Ele continua o mesmo… Diz que me ama todos os dias… Mas não me toca de jeito nenhum!
– E antes da gravidez, qual era a frequência com que vocês mantinham relações?
– Quase todos os dias. - Choraminguei, deixando de lado a vergonha - Eu não sei mais o que faço! Estou a ponto de embebedá-lo pra conseguir me aproveitar dele! 
Eu sabia que aquilo tinha soado idiota, mas não me importei. Eu era uma mulher desesperada. 
– Ninha… As reações dos homens no período de gravidez variam. Alguns podem se sentir mais atraídos por suas mulheres, outros mantêm a relação como ela costumava ser, e outros se afastam. Bruno parece estar nesse último grupo. Isso não quer dizer que ele não sinta mais tesão, mas às vezes é complicado para o homem. Se antes ele a via como amante, agora ele tem uma imagem mais pura de você. Você é a mãe da filha dele, e isso deve fazer com que ele não consiga te tocar sem se sentir culpado ou achar que está fazendo alguma coisa errada. Muitos homens reagem dessa maneira.
Fiquei olhando para a parede como uma débil mental, simplesmente porque tudo que eu podia fazer era esperar que o ddesse alguma solução para aquilo. 
– E como… Como diabos eu vou convencê-lo…? - Comecei, amaldiçoando Bruno por ser tão esquisito. 
– Vocês precisam conversar. Tente entendê-lo, e tente fazer com que ele te entenda. Se não funcionar, marcamos uma conversa nós três. Tudo bem? 
Tentei controlar o nó na garganta, me forçando a não chorar. 
– Tudo bem.
– E se acalme. Lembre-se que sua carga emocional reflete na sua filha. Conversem hoje, e amanhã você me liga e me diz como foi. Vou ficar no aguardo. 
– Ok. - Falei, tentando me acalmar - Obrigada, doutor. E desculpe por ocupar o seu tempo. 
– Não precisa se desculpar. Estou aqui pra tornar sua gravidez melhor, lembre-se sempre disso. 
– Tudo bem. Obrigada. 
– Até amanhã, Ninha. 
– Até. 
Desliguei, com um aperto no peito. Passava um pouco das 19h, e Bruno ainda não havia chegado. Tentei retomar a calma, exercitando minha respiração de olhos fechados. Tentei me recusar a acreditar naquilo. Ele não podia simplesmente ter deixado de me desejar. Não podia me ver com outros olhos. Aquilo era absurdo, e me magoava. Eu era a mãe da filha dele, e só Deus poderia dizer o quão feliz eu me sentia com esse fato. Mas isso não fazia com que eu deixasse de lado o meu papel de mulher. E, como toda mulher, precisava explorar minha sexualidade. Se aquilo fosse verdade, eu passaria a me sentir apenas uma barriga ambulante, carregando a única coisa valiosa que Bruno possuía. E isso me magoava.
Ele não me tocaria pelo resto da gravidez? Se ele me negava com a barriga ainda ligeiramente maior, como seria nos últimos meses da gestação? Ele me evitaria ainda mais? Por que a falta de intimidade incomodava apenas a mim, e não a ele? Seria possível que Bruno estivesse se aliviando de outras maneiras? Seria possível que, me vendo exclusivamente como a mãe da sua filha, ele tivesse procurado outra qualquer que desempenhasse o meu antigo papel? O papel de amante, que satisfaria aos seus desejos limitados por essa gravidez? Será que ele havia ido atrás de outra mulher? Ou o que seria pior: Será que havia ido atrás de uma prostituta, pagando para que ela fizesse o que EU deveria fazer? Deus, por que eu estava pensando naquilo? Talvez estivesse exagerando, ou fazendo suposições absurdas, mas o desespero começou a me tomar de uma tal forma que, agora, eu fazia força para não rir da própria situação. Eu já havia estado no lugar da prostituta, e agora estava no lugar da mulher traída. Até onde essa ironia poderia ir? O quão cruel ela poderia ser? A quantas mulheres eu havia feito mal no passado por ser o que era? Talvez fosse a hora de pagar por esse mal. Pagar pelos meus pecados do passado. Ainda assim, eu não conseguia lidar com isso, e isso era desesperador. 
– Não seja idiota! Ele não está te traindo! - Falei em voz alta, controlando a vontade de me estapear. 
Me forcei a repetir, incessantemente, que aquilo era simplesmente ridículo, e que não havia motivos para tal suspeita. Mas eu precisava que ele confirmasse isso, para poder respirar direito. 
Então, por um motivo ou por outro, eu o colocaria contra a parede aquela noite. 
Não passaria daquela noite.

De repente, Amor.Onde histórias criam vida. Descubra agora