Ciúme

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Lucas estava novamente preocupado. Seu pai nunca lhe falara naquele tom antes com ele, alguma coisa o perturbou, talvez ficasse nervoso por sua mãe não ter contado a ele sobre os planos de leva-lo a casa do casal Odebrecht. Ele precisava contar a sua mãe, pra que ela tentasse conversar com ele sobre isso, antes que ele saísse do seu trabalho e fosse até ali tirá-lo à força. Ele não queria ir embora, não agora e não queria que arrumasse uma confusão às portas da casa da família Odebrecht que não tinha nada haver com isso. Foi para a sala com o semblante preocupado, Felipe levantou no momento que Lucas apareceu.

— Lucas, não esconda de mim, o que está acontecendo?

— Eu preciso voltar Felipe... — disse para ele.

Felipe pareceu confuso, se aproximou mais.

— Foi alguma coisa que eu fiz? — Lucas não respondeu, mas balançou a cabeça negativamente. — Se não quer dizer para me magoar, eu prefiro arriscar.

— Não Fê... eu preciso resolver um problema importante, mas não tem nada haver com você, pelo menos não esse problema — disse deixando Felipe intrigado.

— Lucas eu... — a empregada Alicia entrou à sala.

— Senhor Felipe, com licença, mas seu pai acabou de ligar, disse que voltará hoje às 19h00 e gostaria que você fosse busca-lo no aeroporto.

— Tudo bem Alicia, obrigado por avisar — ela sorriu e saiu.

Lucas ficou encarando Felipe.

— Seus pais estão viajando?

Felipe passou a mão sobre seus cabelos.

— Só o meu pai, minha mãe faleceu há cinco anos.

— Desculpe, eu... — Lucas sentiu-se sem jeito, mas Felipe lhe sorriu.

— Tudo bem Lucas, eu já meio que superei, ou pelo menos estou superando melhor agora — disse tentando permanecer forte. — É doloroso perder alguém a quem amamos, mas devemos seguir em frente, e valorizando aqueles que ainda estão ao nosso lado, pois não sabemos quando vai nos deixar.

Lucas ficou sem palavras, achou que era um desabafo íntimo, mas sentiu nas palavras de Felipe um apelo pessoal, que o fez entender sua mensagem secreta.

— Sim, concordo... bom eu preciso realmente ir agora, será que você pode me levar?

Felipe pareceu se entristecer, mas tentou ser compreensível.

— Claro Lucas, vou pegar a chaves do meu carro lá no quarto, já venho. — Lucas o viu subir e depois de um minuto ele desceu. — Eu havia deixado meu celular em cima da cama — comentou naturalmente, e Lucas ficou apreensível tentando observar se havia alguma reação desconfiada no rosto dele, mas pareceu normal.

Alguns quarteirões percorridos, no banco do passageiro ouvindo uma música internacional e agitada, Lucas tentava reorganizar suas lembranças recentes. Havia muitas coisas martelando na sua cabeça... sentimentos e desconfianças, medos e esperanças... estava virando uma grande bagunça a sua vida.

— Fê?

Felipe abaixou o volume do rádio com uma mão e outra segura no volante.

— Sim?

— Você e o David... — ele ponderava pra falar. — Vocês são amigos há muito tempo?

Felipe trocou a marcha.

— Sim, uns 15 anos, somos muitos amigos, porque Lucas?

— Eu só queria saber — forçou um sorriso, olhando para ele. — Ele parece gostar muito de vocês, ficou muito triste quando o seu pai proibiu vocês de voltarem.

Felipe sorriu sem jeito, agora com as duas mãos no volante.

— David é um cara bom, um pouco cabeça dura e impulsivo, faz as coisas sem pensar direito às vezes, já me colocou em diversas encrencas — lembrou, depois soltou uma risada.

Lucas observava a forma como ele falava do amigo.

— Eu fico feliz que ele tenha bons amigos ao lado dele — disse Lucas, e Felipe olhou para ele seriamente.

— Você e o David já são amigos? — havia um tom diferente em sua voz, que não passou despercebido por Lucas que fingiu não notar e respondeu sinceramente.

— Não sei, eu quero dizer, eu o desculpei como a todos vocês, e já conversamos, até brincamos de pique-esconde junto, isso é, a família toda participou.

Felipe pareceu incomodado pelo jeito que Lucas respondeu, com indecisões, misturadas de fascínio e sorrisos reprimidos.

— Lucas você não deve criar expectativas, ele namora a Camila — disse friamente, e trocou de marcha, acelerando mais ainda. Lucas ficou ofendido.

— Eu... o que quis dizer com isso Felipe? Eu sei muito bem que ele tem namorada! — retrucou nervoso demais, sentindo-se corado de vergonha. — Eu não tenho nada com o David, não sei por que raios você insinuou isso!

Felipe reduziu a velocidade ao passar numa lombada.

— Desculpe, não queria que se sentisse ofendido Lucas — disse ele, mas seu rosto ainda permanecia duro.

Lucas respirou fundo para não soltar o que havia descoberto. Iria por tudo a perder se revelasse, e cruzou os braços, aborrecido com ele.

— Não quero mais falar com você. — Felipe acelerou o carro e freou bruscamente, virando o volante à direita, e o carro derrapou num giro na pista, cantando os pneus. — SEU LOUCO! — gritou Lucas perplexo, tentando se segurar no banco, mas ele estava de cinto de segurança e nada aconteceu. — Se eu não estivesse de cinto teria atravessado o vidro desse carro, sabia?

Felipe também estava de cinto e riu da histeria de Lucas.

— Desculpe, só queria te proporcionar um pouco de adrenalina.

Lucas o olhava sem querer acreditar, e com vontade de esmurrá-lo por causa daquilo.

— Você é um idiota Fernando!

Felipe parou de rir.

Fernando? — repetiu o nome, e Lucas que até o momento não havia se tocado, por estar nervoso demais, ficou surpreso por trocar o nome de Felipe por Fernando, uma lembrança de um passado ruim.

— Nossa, você me deixou tão irritado que errei seu nome! — disse tentando parecer bravo, mas estava envergonhado e torcendo para que ele não puxasse assunto relacionado a isso, mas não teve sorte.

— Quem é Fernando?

— Será que pode ligar o carro? — respondeu irritado.

— Foi seu namorado? — perguntou enciumado. — Ou ainda é?

Lucas se estressou e tirou o cinto de segurança. Abriu a porta do carro e saiu. Faltava apenas um quarteirão para chegar, preferia ir a pé do que ficar sob o interrogatório de Felipe.

Não demorou muito e Lucas o viu aproximando ao seu lado no carro, falando pelo vidro aberto.

— Lucas desculpe, eu sei que pisei na bola, eu não deveria ter me intrometido na sua vida pessoal, me perdoa vai? — mas Lucas parecia não querer dar chance e marchava firme pela calçada, enquanto Felipe insistia. — Lucas, me deixa terminar de leva-lo, por favor, prometo que ficarei de boca fechada e sem gracinha.

Felipe parou o carro, e Lucas continuou seguindo em frente, mas parou. Felipe sorriu, esticou a mão e abriu a porta por dentro, e Lucas se virou, retornando o caminho andado e entrou novamente no carro, em silêncio e com o rosto duro.


O Filho da BabáOnde histórias criam vida. Descubra agora