Lost in prologue

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21 anos antes...

O dia refletia o humor de um país inteiro. As grandes nuvens cinza tomavam conta do céu, que há dias não permitia a luz do sol aquecer nossas peles. Era quase impossível ver poucos palmos à frente devido à tempestade que arranhava o ouvido de qualquer um, com uma neblina capaz de acabar com a visão de até mesmo aqueles salvos em suas casas. Brilhos esporádicos na escuridão assustavam a população, que nunca vira algo como aquilo em suas vidas. Não se via ninguém na rua, todos fugiram ao primeiro sinal de chuva, e agora só ouvia-se os estrondos capazes de ensurdecer uma comunidade inteira.

Com a porta fechada, tive de me contentar em ouvir os gritos abafados pelos relâmpagos. Havia horas que esperava do lado de fora, horas que esperava ansiosamente por um momento que demorou mil anos para finalmente começar. O dia deveria ser de alegria para mim. O sol deveria estar em seu ápice, aquecendo nossas almas enquanto pássaros piavam suas canções para adocicar nossas vidas. Nada aconteceu do jeito que imaginava, pelo contrário, o bebê prestes a nascer corria perigo e era meu dever o manter seguro até que tenha idade suficiente para revelar a verdade, ou ele morreria antes mesmo de respirar pela primeira vez.

Talvez a tempestade tivesse sido um chamado de Deus, algo divino intervindo e nos dizendo que o recém-nascido deveria viver, porque o único motivo para os berros de dor da mulher não serem ouvidos pelo marido era o constante som do dilúvio caindo sobre nós. Pois o esposo, escondido em algum lugar do casarão, não poderia saber que sua mulher estava em trabalho de parto ou a criança não teria chances de sobreviver. E meu dever é salva-la. Temia pela mãe, uma mulher doce que definitivamente não merece o marido que tem, mas não havia nada que pudesse fazer por ela mesmo se quisesse. Um dia a família se reencontrará e eles poderão, enfim, se perdoar, mas até lá ele deve permanecer nas sombras, à margem da sociedade e meu trabalho era garantir que esse diga chegue.

Não me lembrava exatamente de como chegara naquela posição, nem ao menos como parara nessa terra congelante, mas por obra do destino estava aqui e ainda tinha uma obrigação a cumprir. Ele está chegando, poucos metros ao lado, uma única parede nos separando, vinte anos de diferença e milhares de anos nos afastando, mas agora tudo estava prestes a mudar. Porque ouvi o grito agudo do lado de dentro e soube que o dia finalmente chegara...

Lost In TimeOnde histórias criam vida. Descubra agora