Após meses na PB, Agatha passou a interagir de forma mais ampla com algumas detentas e assim a garantir mais espaço na prisão, numa disputa psicológica com outras mulheres encarceradas.
Como numa selva, apesar da constante presença dos guardas, o que prevalecia era a lei do mais forte, que não podia somente existir, tinha que estar nas aparências também.
Para ela, que nunca viveu nas ruas e só conhecia o assunto através dos filmes e noticiários, foi como entrar num novo mundo, onde a violência era uma constante.
E talvez essa sua falta de malícia tenha lhe causado os problemas que veio a ter que enfrentar, mas na sua mente isso foi obra de alguém de fora, que a queria destruir para sempre.
Assim todo o episódio acabou mais lhe ajudando do que qualquer outra coisa, não fosse o fato que o objetivo principal do ataque que sofreu atentasse diretamente para a sua vida.
Era um dos dias que Agatha mais apreciava, pois o Outono castigava a prisão enviando temperaturas cada vez mais baixas. Então o tempo que podia aproveitar o Sol era sagrado, quando ele resolvia escapar das nuvens e dar o ar da graça.
Foi num desses dias que o atentado aconteceu.
Como citado anteriormente, Agatha fazia parte de um grupo de detentas que se dizia inocente. Dentre elas, a mais violenta era Brigitte, uma francesa naturalizada que fora acusada de matar um homem que a tentou estuprar.
Numa das noites frias que passaram na prisão, ela confessou para a Srta. King que não queria matá-lo, mas que o fizera em legítima defesa, quando ele avançou sobre ela.
— Eu o conheci num bar em Bournemouth e depois que tomamos algumas bebidas, ele me convidou para conhecer o hotel onde estava hospedado. Passamos um tempo na varanda observando a praia e tomando champanhe.
— Em dado momento ele me puxou pelo braço e começou a me levar para o quarto. Eu resisti, pois estava ali só para me divertir, não queria nenhuma intimidade com o sujeito, mas parece que a bebida o fez perder a classe e ele avançou sobre mim.
— Eu sou forte por natureza, herdei isso dos meus pais. Além disso, sempre adorei me exercitar em academias e não tinha bebido tanto quanto ele naquela noite. Quando ele tentou me arrastar para o quarto e eu já o havia empurrado umas duas vezes, na terceira vez perdi a pouca paciência que tenho e usei a garrafa de champanhe como um bastão, o acertando na cabeça.
— Creio que usei força demais no golpe e ele caiu desmaiado na varanda. O meu principal erro foi não ter chamado um socorro ou até a polícia. Peguei minhas coisas e fui embora do hotel. Algum tempo depois fui presa e descobri que tinha matado o cara e não acreditaram que o fiz em legítima defesa, pois eu não tinha mais as marcas roxas nos braços de quando ele tentou me arrastar para o quarto.
— Como já tinha uma leve passagem por vandalismo na França, coisas de adolescentes, não me consideraram uma ré primária e vim parar aqui neste fim de mundo...
Agatha não acreditou totalmente em Brigitte, mas não contestou nenhuma de suas histórias, pois imaginou que seria bom tê-la como amiga, mas agora já não tinha certeza de que havia sido uma boa ideia.
Estavam no pátio tomando Sol quando a confusão começou.
Como Brigitte era alta e forte, devia pesar uns 90 quilos, constantemente apareciam outras detentas que queriam desafiá-la para uma briga.
Até aquela manhã ela conseguiu evitar esses conflitos, mas desta vez duas detentas conseguiram lhe segurar, uma de cada lado, enquanto uma terceira lhe deu um soco no estômago.
— Então você pensa que é melhor que nós, sua vadia gorda...
Mesmo perdendo o fôlego, Brigitte conseguiu resmungar.
— Não sou gorda, sou forte. Peça para suas amigas me soltarem e eu lhe mostro o quanto.
— Você pensa que eu sou burra? - respondeu a agressora que tinha uma estatura bem menor — Eu tenho um presentinho pra você bem aqui...
A Srta. King presenciou o início da confusão e acreditou que os guardas viriam logo para separá-las, mas quando viu o estilete brilhando na mão da detenta, sua reação foi espontânea.
Se aproximou rapidamente da detenta que segurava Brigitte pelo lado direito e a empurrou com força para o lado.
A agressora a olhou sorrindo e desferiu um golpe com a arma em sua direção, a atingindo ao lado da barriga, depois tentou acertar também a francesa, mas antes de conseguir, levou um murro bem colocado na lateral de sua cabeça e caiu.
As detentas que seguravam Brigitte fugiram, enquanto ela gritava por socorro para Agatha, que agonizava no chão com a mão sobre o corte, que parecia sangrar muito.
A Srta. King não viu mais nada, sua visão escureceu e desmaiou.
Quando despertou estava ocupando um dos leitos da enfermaria, com um frasco de soro ligado por um pequeno tubo até uma das veias do seu braço esquerdo.
Achou que havia tido um pesadelo, mas quando uma dor a atingiu na lateral de seu corpo, percebeu que a agressão tinha sido bem real. Viu um médico se aproximando e perguntou sobre o seu estado.
— Foi somente um corte superficial — disse ele sério e a deixou com seus próprios pensamentos.
Dois dias depois voltou para a sua cela e descobriu que a agressora estava internada num hospital fora da prisão, com traumatismo craniano, enquanto Brigitte mofava numa das solitárias.
Sua companheira de cela, uma inglesa de quase 40 anos, que nunca havia lhe dado a mínima atenção, se aproximou quando as luzes se apagaram e lhe deu um conselho.
— Garota, se tem algum tipo de influência lá fora, dê um jeito de usá-la. Esse ataque que sofreu foi só um aviso, se a quisessem morta, você já estaria. Não sei quem são seus inimigos, mas eu os evitaria ao máximo...
Agatha permaneceu em silêncio e refletiu sobre aquele conselho por muitas horas antes de dormir.
Algumas noites depois, com auxílio das amigas do curso de tecnologia da informação, conseguiu um aparelho celular de rádio e ligou para um conhecido seu.
— Doutor, preciso que os investigadores venham me visitar. Estou correndo perigo! Se não vierem logo, pode ser que nunca saberão tudo que eu sei...
— Então fale de uma vez senhorita — pediu ele esperançoso.
— Mande que elas venham logo, antes que seja tarde demais...
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Encenação Mortal
Mystery / ThrillerEra para ser somente mais uma apresentação teatral da Modern English School of Bedfordshire, que sistematicamente ocorria a cada cinco anos, voltada exclusivamente para os alunos do Sixth Form. Mas algo deu errado no script, colocando em risco a...