14 - A acusada

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O Dr. Gustaf Griffiths chegou cedo ao antigo prédio da corte de Luton.

Apesar do tempo nublado, o ar estava quente e ele parecia incomodado com o calor, enxugando o suor da testa com um lenço branco, até que alcançou uma divisória que dava para o local da audiência, onde o ar-condicionado estava ligado.

Sua primeira vitória no caso foi manter o julgamento em Luton, pois havia uma pressão da promotoria de que ele fosse transferido para a Old Bailey, como é chamada a Corte da Coroa em Londres.

Sorriu ao ver sua cliente já sentada no banco dos réus, de cabeça baixa e sem algemas, mas antes passou para confortar a família dela, totalmente acuada num pequeno canto, espremida literalmente pela imprensa, membros da família da vítima e manifestantes favoráveis à condenação.

Um dia antes o Dr. Griffiths teve uma conversa com a família de sua cliente.

— É melhor deixar que ela permaneça presa até o julgamento, sem pagamento de fiança.

— O senhor está maluco? — disse o pai dela, um rico empresário londrino — Quero minha filha livre o mais rápido possível...

— Pense comigo — explicou o advogado — Além do valor da fiança ser um absurdo...

— Eu tenho condições de pagar — interrompeu o empresário.

— Não é esse o problema. Se ela sair não poderá deixar o condado onde o crime aconteceu​, será perseguida e crucificada pela mídia, pode até sofrer um atentado de algum maluco qualquer. Neste momento na prisão ela está segura...

O pai dela não concordara, mas resolveu dar crédito à experiência do Dr. Griffiths e agora, na audiência preliminar, vendo a pressão de todos para que sua filha fosse trancafiada para sempre numa prisão de segurança máxima, teve que dar razão para ele.

— O senhor estava certo — ele fez se ouvir acima do tumulto, cumprimentando o advogado, que lhes deu um olhar de conforto e rumou para o local onde sua cliente o aguardava.

O Dr. Griffiths percebeu que ela chorava, ao se aproximar e lhe dar um abraço.

— Seja forte! — disse ele em seu ouvido e ela pareceu se acalmar, bem no momento em que o juiz adentrou o recinto, fazendo com que o tumulto desaparecesse.

Pouco tempo depois, após o advogado de defesa dispensar o pagamento de fiança, fixado pelo juiz em 250 mil libras, ele se despediu de sua cliente, prometendo visitá-la mais tarde.

Tinha algumas dúvidas em mente e precisava elucidá-las, para melhor preparar a sua defesa.

Quando a encontrou mais tarde numa cela da delegacia de Luton, não parecia ser a mesma garota que vira horas antes, pois estava agora maquiada e com um sorriso confiante no rosto.

— Bem melhor lhe ver assim — disse ele.

— Eu vou poder ver minha família?

— Tenha um pouco de paciência que eu consigo isso, apesar da rigidez da nossa justiça, você sabe...

Ela concordou com um aceno.

— Estou aqui por outro motivo. Quero saber mais detalhes sobre o que aconteceu no dia do fato...

— Eu já lhe disse tudo que eu sei doutor.

— Você sabe que todos testemunharão contra você...

— Todos?

— Tudo indica que você cometeu este crime...

— Todos? — repetiu ela — Até o Derick Mitchell?

Encenação MortalOnde histórias criam vida. Descubra agora