40 - A visita

172 29 13
                                    

Na sua nova rotina na PB, Agatha fazia os horários contrários das outras detentas.

As saídas para o banho de sol, refeições e visitas eram monitoradas exclusivamente pelo pelo sargento Reece Ulric, com quem ela estava gostando muito de se relacionar, pois ele a tratava com muito respeito e carinho, e o principal: parecia acreditar na sua inocência.

Reece tinha 27 anos e antes de vir para a prisão, almejava o sonho de formar-se em psicologia, mas influenciado pelo pai, que trabalhava a vida toda na área de segurança, acabou seguindo a carreira militar e foi designado para a PB há dois anos.

Conheceu diversas outras presas, consideradas de alta periculosidade, que jamais negaram os crimes cometidos, sendo a Srta. King a primeira deste outro grupo, que jurava ter caído numa armadilha do sistema e que um dia conseguiria sair da prisão.

No começo ele permaneceu cético enquanto Agatha ficava na defensiva, mas conforme os dias foram passando, o sargento começou a acreditar nela.

Ela, por sua vez, antes de conhecê-lo melhor, imaginou que Reece só estava de olho na sua beleza e que talvez pensasse que um dia tiraria proveito daquela situação, mas com o tempo percebeu que ele não era esse tipo de homem.

Acontecia exatamente ao contrário: era ela que dava investidas sobre o sargento, mas sempre com o intuito de se distrair, para ajudar a passar as horas que se arrastavam nessa sua nova rotina.

— Não vai me levar para tomar banho de sol hoje, meu soldado preferido? — caçoava ela, tentando fazê-lo sorrir.

— É sargento Ulric, senhorita — respondia ele, mas em pouco tempo não resistia e entrava na brincadeira — Trouxe sua roupa de banho, milady?

— Vou pedir para o imprestável do meu lacaio trazer, espere um pouco.

E assim seguiam tornando os dias mais divertidos.

Agatha desconfiou pela primeira vez que ele acreditava na sua inocência, após um diálogo mais sério que tiveram, poucos dias antes de uma visita que ela aguardava há bastante tempo.

— Quando eu sair daqui eu não pretendo voltar a estudar numa escola comum, vou fazer estudos particulares, depois vou aderir aos ensinos a distância, para buscar uma formação.

— E o que pretende cursar, Agatha?

Ela sorriu divertida.

— Não vai me dizer que eu vou mofar na prisão, Reece? Sou condenada a prisão perpétua, esqueceu?

— Não esqueci! — respondeu ele sério — Só estou torcendo para que a senhorita realize esse sonho...

E quase cochichando, prosseguiu.

— Já assistiu ao filme "Um sonho de liberdade"?

— Não me lembro, deve ser um filme mais antigo. E o que isso tem a ver comigo, sargento?

— Nele um homem é preso injustamente e consegue escapar da prisão...

— Ah! Já sei! Vai me ajudar a fugir da PB... Por que não disse logo? Me fala qual é o plano?

Reece a encarou sério.

— Pare de brincar com essas coisas, Agatha. Não é nada disso. Só penso que erros judiciais podem acontecer. O que seu advogado está fazendo para tentar lhe ajudar a sair daqui?

— Meu querido sargento, me escute com atenção! Eu sei que vou sair desta prisão, ainda não sei como nem quando, mas tenho certeza disto. Acontece que se eu depender da justiça para conseguir isso, vou morrer aqui dentro...

— Então o que pretende fazer, senhorita?

— Já estou fazendo. E muito depende de um visitante que logo aparecerá por aqui.

O visitante em questão demorou ainda alguns dias para aparecer e quando o fez, não demorou muito, era contra as regras da PB, ainda mais para uma prisioneira que se encontrava isolada e assim deveria permanecer.

Mas ele ficou o tempo suficiente para que a Srta. King conseguisse exatamente o que queria, não da forma que esperava, recebera uma ajuda externa, pelo menos assim concluiu quando ele foi embora.

🔷🔷🔷🔷🔷

— Há quanto tempo, Agatha.

— Mais de um ano... — respondeu ela secamente.

— A senhorita me parece bem...

— Pare com essa enrolação! — interrompeu ela — Não temos tempo para isso!

— E cuidado com o que vai falar, professor, pois a nossa conversa tem grande chance de ser monitorada. Sou uma detenta perigosa agora...

Adam a olhou de forma curiosa. Na sua mente não esperava esse tipo de informação vindo dela.

— Não tenho nada a esconder, senhorita, mas, se quer assim, vamos direto ao que interessa: o que tem de tão importante para me dizer? Sou um homem ocupado, preciso voltar para a MES, tenho uma peça de teatro para montar...

O sorriso sarcástico no rosto dele quase fez com que a Srta. King perdesse o controle e voasse sobre ele, mas preferiu respirar profundamente e meditar por alguns segundos.

Imaginou que existiam pessoas que tinham esse dom de nos tirar do sério, por conhecer nossos pontos fracos, e o professor Green era um deles, então tentou não cair nesta armadilha novamente, mas não conseguiu, pois a ódio que sentia falou mais alto.

— Sei que retornou para a escola, Adam. Não sei como permitiram, com certeza usou seus meios escusos para fazer isso, mas isto não é da minha conta...

— Está aí algo que concordamos — aproveitou o professor para interromper — Não é da sua conta mesmo...

— Mas se fosse — disse ela agindo da mesma forma que ele — Eu diria que se utilizou de algum daqueles seus amigos imbecis para isso, como aquele gordo da faculdade...

A Srta King parou imediatamente de falar ao notar que as suas últimas palavras o atingiram em cheio, mas não da forma que esperava, pois não viu raiva em sua face, somente dor.

Apesar de desejar isso mesmo, que o professor Green sofresse, percebeu que, por algum motivo, tinha ido longe demais.

— O que aconteceu, Adam?

Ia questionar novamente, quando ele falou, a voz saindo rouca e arrastada.

— É o Christofer...

— O que tem o reitor?

— Ele... Foi encontrado morto...

O professor contou os detalhes do ocorrido e quando terminava, Reece bateu à porta, indicando que a visita tinha que ser encerrada.

— Pode nos dar somente mais alguns minutos? — ela pediu ao sargento.

Ele acenou positivamente e os deixou sozinhos por mais algum tempo. Logo Adam se retirou da sala e Reece percebeu o quanto ele parecia abatido.

Conduziu-o até a saída, depois retornou ofegante até a cela de Agatha.

Entrou e a viu em pé, virada para a parede, onde acima dela um ventilador barulhento rodava em baixa velocidade.

— A senhorita acabou com ele — disse o sargento triunfante — Nem parecia o mesmo homem quando saiu...

Ela permaneceu em silêncio olhando para a parede cinza e era assim que sentia por dentro também, pensou, totalmente cinza.

Uma lágrima teimosa rolou pela sua face, a primeira que derrubava há um bom tempo, a segunda que derrubava por Adam, desde que o conhecera.

Encenação MortalOnde histórias criam vida. Descubra agora