60 - Sob a neve

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À distância a majestosa construção da MES, com suas poucas luzes acesas naquela noite fria em que nevava, parecia dormir profundamente, observada apenas por quatro pares de olhos atentos, também à distância.

Os investigadores faziam uma campana nos últimos dias, num local estratégico, para não chamar a atenção, mas mesmo assim foram abordados duas vezes por viaturas policiais que faziam suas rondas naquelas imediações.

Tiveram tempo suficiente para discutir e relembrar minúcias do caso, que acreditavam seguir para o seu desfecho.

A dica do informante do professor Green era muito simples: o assassino ia agir novamente e a escola seria o seu palco, pois tudo estava relacionado: mortes, passado e presente. Todos os atores escolhidos a dedo para uma grande encenação mortal.

Só restava aos investigadores descobrir como se desenrolaria este último ato.

Nesta momento em questão, com a temperatura baixando alguns graus a mais, onde a previsão era da noite mais fria de dezembro, Turner daria tudo por uma boa xícara de chá quente e disse isso ao parceiro.

- Podemos dar uma ida rápida naquele café que fica a algumas quadras daqui e já retornamos. Eles servem também um delicioso chocolate quente...

Thompson tinha que concordar com ele. Precisavam esticar as pernas e comer alguma coisa, então assentiu e se foram.

O acaso naquela noite não estava a favor deles, ao menos naquele momento, pois nem bem deixaram o local com seu veículo, após fazerem a primeira conversão para sair da via principal, eis que outro sedan surgiu e seguiu calmamente até a entrada da escola, levando os últimos atores que faltavam para o encerramento daquela longa apresentação.

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- Parece que faz uma eternidade que não piso na MES - disse Agatha, ao percorrerem o corredor que dava acesso ao anfiteatro - Esta escola não lhe parece mais assustadora a noite?

- Eu a adoro em qualquer horário. Ela para mim é como se fosse um lar, assim como é para Catarina.

Acabavam de chegar na entrada do anfiteatro e a Srta. King ficou refletindo sobre o comentário do amigo.

- Acredita mesmo nestas coisas sobrenaturais?

Ele a encarou sério.

- Mas é claro que sim!

- Então me convença - disse ela sorrindo.

- Pois bem! Lembra-se de quando a senhorita foi presa, depois daquele terrível julgamento?

- Como poderia esquecer? É um pesadelo que faz parte do meu passado.

- Assim que saiu o veredito, eu visitei esta escola e pretendia nunca mais retornar. Sabe, eu já havia sentido o poder que existe aqui dentro, mas naquele dia, sozinho, eu pude ver uma apresentação particular neste palco que me fez mudar de ideia.

- Do que está falando?

- Estou falando de uma breve apresentação da Catarina Campbell e do espírito de Emilly, bem aqui no anfiteatro.

- É claro que está brincando...

- Não estou! Achei aquilo estranho, mas compreensível. O espírito de Catarina estar preso na MES onde tudo indica que ela foi assassinada não é algo tão surpreendente assim, mas quando vi Emilly eu percebi que havia mais alguma coisa em andamento.

Agatha se sentou numa das poltronas, pois estava se sentindo zonza.

- O senhor não deveria brincar com essas coisas.

- Não estou brincando, Srta. King. É claro que achei a princípio que fosse uma alucinação qualquer o que eu estava vendo, mas depois o nosso amigo professor Green me ajudou a decifrar todo esse imenso quebra-cabeça.

- Nosso amigo? Adam tentou me matar, provavelmente matou meu primo...

Derick riu como o não fazia há muito tempo e o som de sua risada ecoou pelo anfiteatro pouco iluminado.

- Se tem uma coisa que o professor não fez até hoje foi matar, Agatha. E isso é outro fato que eu tenho plena certeza...

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Os investigadores retornaram e estacionaram no mesmo local de antes. O vidro do veículo estava um pouco embaçado, apesar do ar condicionado estar ligado, o que fez com que Thompson levasse um tempo para perceber que algo não estava correto.

Seu sétimo sentido, sempre apurado, mandou uma mensagem de urgência para seu cérebro, e nem bem estacionou, ligou novamente o motor e partiu em direção à portaria da escola.

A MES possuía um amplo estacionamento nas laterais de sua fachada, onde ficavam os veículos dos professores e empregados da escola e naquele momento em questão haviam somente dois carros estacionados. O primeiro ele sabia que era do segurança da escola, mas o segundo, escuro tal a noite que caminhava para as 10 horas, era desconhecido e Thompson tinha certeza de que não estava ali quando saíram para o café.

Parou ao lado da guarita do segurança e após trocar algumas informações com ele, Turner notou que o semblante do parceiro demonstrava uma nítida preocupação, enquanto o portão eletrônico era aberto.

- Eles estão aqui! - disse simplesmente o investigador - Está na hora de agirmos.

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- E se não foi ele, quem foi que orquestrou todas as mortes até hoje? E quem tentou duas vezes me matar na prisão?

- Vamos pensar, Agatha! A primeira morte foi Catarina...

- Derick, não mude o foco! Adam não tem nada a ver com a morte dela...

- Bom, ele não tinha até os 12 anos.

Agatha fez uma autêntica expressão de surpresa enquanto ele continuou.

- Ele foi um garoto de rua, que fugiu do lar de adoção para onde foi enviado, após seus pais morrerem. O seu primo não chegou a lhe contar esta história?

- Anderson foi assassinado antes...

- Que pena! Mas então, quando o professor era ainda um garoto, ele foi adotado pelos descendentes da família Campbell. Desta forma ele passou a ter um parentesco, não consanguíneo obviamente, mas ao menos familiar com ela.

- Espere um pouco. Creio que foi o senhor mesmo que disse sobre as suspeitas do tio dela ser um dos suspeitos de sua morte.

- Excelente memória, Srta. King! O seu tio, Sr. Henry Campbell. Catarina era órfã e ele era o seu tutor.

- Então Adam descende de um possível assassino? Isso não seria surpresa...

Derick riu novamente e desta vez Agatha começou a ficar assustada com essas atitudes do amigo.

- Qual é a graça desta vez?

Ele se controlou e num instante seu rosto voltou a ficar sério.

- A graça está em saber de coisas de que a senhorita ainda não sabe...

- Então me conte tudo de uma vez!

E Derick, sem saber que estava sendo observado pelas câmeras de segurança, contou.

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