Chapter Two.

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Para os desavisados e alienados: democracia é uma ilusão, e a liberdade é uma droga alucinógena. Durante a vida inteira, fomos ensinados sobre os nossos direitos, sobre os quais não tivemos direito. Já estavam pré-selecionados. Fomos ensinados que somos livres para poder escolher o que quisermos. Mas a questão é justamente essa: a necessidade da escolha. A gente vive na ditadura de escolhas.

Não existe a opção da inércia, afinal de contas, até o próprio ato de "não escolher", é também uma escolha. Então, no final das contas, o que nos sobra? O descontrole. Porque controle também é algo superestimado. De que adianta a gente fingir que controla o destino? A vida faz a gente meio de joão-bobo, e quanto mais a gente bate, mais ele se abaixa e volta para rebater com mais força. Liberdade é a mentira mais doce que alguém em algum momento já espalhou. E a gente é apenas trouxa. E ainda acredita que é livre para optar por alguma coisa.


— Ela tá acordando! — a voz parecia distante enquanto ecoava na minha cabeça — Catarina?!

A voz foi se tornando um pouco mais nítida, juntamente com o a sensação de peso similar a uma bigorna em cima da minha cabeça.

— Por que que ela não responde?!

— Marina, ela tá pálida, não é melhor a gente leva-la para um hospital?

Vozes diferentes falavam ao mesmo tempo, e cada uma parecia cada vez mais próxima. E a bigorna na minha testa parecia cada vez mais pesada, à medida que conseguia ouvir as vozes com um pouco mais de clareza.

— Ô gente, vamos dar um espaço? Tem muita gente aqui em cima, deixa a menina respirar.

Essa voz era inconfundível. Eu poderia beijar a Angélica por tirar esses abutres de cima de mim.

Agora a sensação da bigorna havia ficado um pouco mais leve. Mas não totalmente. O murmurinho aos poucos se dissipava e o barulho das vozes conversando entre si ia ficando mais longe. Tentei forçar meus olhos a abrir lentamente, e a claridade da luz me atingiu diretamente os olhos, fazendo a cabeça pesar de novo quase que instantaneamente.

— Ai, desculpa, deixa eu apagar essa luz. — devo ter feito algum tipo de expressão dilacerada de dor, para ter feito a Angélica perceber instantaneamente o que havia me incomodado.

Ouvi quando ela mexeu na caixa do interruptor, substituindo a luz central do quarto por uma luz de canto, próxima à entrada do banheiro. Voltei a abrir os olhos lentamente, e pude sentir sua silhueta se aproximar de mim.

— Melhor assim? — perguntou.

Mantive os olhos semiabertos porque parecia mais seguro. Afirmei positivamente em resposta à pergunta da Angélica, enquanto umedecia os lábios com a ponta da língua. A sensação que tinha era de ter entrado em estado de hibernação, no meio do deserto.

— O que aconteceu? — forcei minha voz a sair, e só então pude notar o quão fraca parecia.

— Mulher, eu nem entendi direito. Eu já tava no topo da escada com o Gabriel, e só ouvi foi a Alice gritando e descendo correndo atrás de ti. Tu caiu durinha no chão, Deus me livre.Por reflexo, passeei meus olhos pelo quarto, inclinando um pouco a cabeça.

— Ela não tá aqui não. — explicou, parecendo adivinhar minha busca — Foi atrás de água de coco para ti.

— Água de coco? — uni as sobrancelhas enquanto a encarava.

— É, mulher. Tu precisa de água e precisa de açúcar. Assim tem os dois ao mesmo tempo, entende?

Não entendia. Mas fazia sentido. Eu acho.

ConsequênciasOnde histórias criam vida. Descubra agora