ALICE
Às vezes a gente se perde. Às vezes a gente desvia do caminho, pega um atalho; às vezes nem nos damos ao trabalho de entender o mapa e só saímos no aleatório. Nem sabemos o caminho e nem confiamos no GPS, por causa dos buracos em que ele nos mete. Às vezes a gente precisa contornar uma pedra e acaba não encontrando o retorno. Às vezes o caminho está tão perto, mas vamos entrando em meio a labirintos.
E às vezes a gente só se perde.
Sem explicações.
Sem motivos.
Sem "mas".
A gente só não encontra o caminho de volta.
— Como tu está, heim?
Ouvi a voz de Angélica sibilar baixinho perto da cama. Consegui encará-la meio de lado. Pisquei os olhos algumas vezes.
— Eu... Estou viva. — brinquei e consegui arrancar uma risada dela.
Mas logo depois tentei me virar na cama e a dor aguda na minha bacia quis se pronunciar, mostrando que não estava tão viva assim. E a resposta foi um grito em um agudo que eu nem sabia que podia alcançar.
— Tu não sabia que tinha alergia? — mordeu o lábio.
Respirei fundo, apertando os olhos, balançando a cabeça negativamente.
— Eu só não digo que foi a pior ideia que eu já tive porque foi por uma boa causa. — trincava os dentes, falando meio esganada — Como ele está?
— Aline saiu daqui quase agora, ele está bem. — ela me encarou — Já começaram com a medicação para poder fazer o transplante.
Depois que deu as caras, a dor decidiu que era legal, que era quentinho ficar por ali e ter toda aquela atenção, então achou que podia ficar, fazendo minha bacia de pula-pula.
— E a Ly? Como ela está?
Angélica revirou os olhos.
— Alice, se preocupa um pouquinho contigo.
Às vezes, a gente simplesmente para e senta no meio de uma ponte, sem saber para onde ir, mesmo que só tenha uma reta em frente para seguir. A gente finge de cego, surdo e mudo, porque muitas vezes não queremos aceitar que só tem um caminho para seguir. A gente não quer aquele caminho. E sem perceber, o nosso corpo vai ficando pesado. E mais pesado. E a gente não percebe.
— Vão trazer o remédio daqui a pouco. — falou, como se minha expressão de dor estivesse na cara. E devia estar mesmo.
— Falando nisso, eu tive um sonho esquisito — Eu sonhei que a minha mãe conhecia a Catarina. — ri um tanto baixo, me lembrando da cena — E que elas discutiam. Foi bizarro, você não imagina.
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Consequências
RomanceEu a olhava como se de alguma forma conseguisse absorvê-la e, enquanto a observava, lembrava de todo o passado que ambas trazíamos nos ombros. A encarava numa tentativa débil de decifrá-la, e me questionava como alguém tão pequena, de certa forma, c...