Derramado

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Você acha que sabe o que é dor?

Você por acaso já gritou até o ponto de sua garganta sangrar, implorando pela ajuda que nunca veio?

Você por acaso já teve cortes reabertos, de novo e de novo e de novo e de novo, por lâminas ásperas e cheias de dentes?

Querer morrer, todos já quisemos, ao menos uma vez. Tentar, somente alguns de nós. Em conseguir, todos falhamos. E se, como eu, você também tentou e falhou, sabe do que estou falando.

Existe um instinto último de autopreservação que só se manifesta naquele momento final. Quando a morte finalmente chega, ele dispara.

O meu disparou quando meus pulmões já estavam vazios, e me fez encontrar ar suficiente para um último grito. Um grito que implorou por minha vida, direcionado àquele ser que havia me carregado em seu ventre e me nutrido dia após dia. Minha autopreservação sabia a quem implorar. Meus instintos sabiam que conseguiriam manipulá-la. Era um laço forte demais. Era um apelo forte demais para ser ignorado.

E foi assim que, por minha culpa, minha mãe entregou todos os nomes.

E eu entreguei a vitória nas mãos de Anton.

Naquele dia ele não derramou o meu sangue.

Ele derramou cada milésimo de segundo de minha vida sob meus pés.

Eu os vi todos. Cada instante.

Cada respiração. Cada batida de meu coração.

Estariam todos presos naquela sala escura. Como uma corrente amarrada a meu tornozelo, minha culpa me arrastaria eternamente.

Se eu sobrevivesse, jamais teria um momento de paz.

Meus olhos foram embaçando, os sons se tornando confusos enquanto eu observava o reflexo da lamparina dançando sobre a poça de sangue aos meus pés.

Queime meu sangue. Faça-me esquecer.

- Você já pode entrar agora.

Ergui o rosto, tentando decifrar quem era a figura de cinza que entrava.

- Dê soro ao garoto. Ele está perdendo a consciência.

Houve um murmúrio de protesto. Não consegui identificar as palavras baixas.

Ouvi um baque. Sob uma névoa de tontura, a túnica preta pressionava a túnica cinza contra a parede.

- Mantenha sua boca fechada, Vero. Lembre-se de nosso acordo. Se você contar meu segredo, eu contarei o seu, e você sabe o que vai acontecer com ele. Obedeça, antes que eu mude de ideia.

Aquele com a túnica cinza se aproximou de mim. Senti meus braços formigarem. A sala rodava.

- E cuide da aparência dos dois ratos. Eles precisam estar bem para a execução.

A palavra ecoou em minha mente, assumindo formas abstratas e confusas. Eu sabia o que significava, mas não conseguia compreender.

Execução...

Execução

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O Filho da Rebelião (Completo) - Livro II - Trilogia DantálionOnde histórias criam vida. Descubra agora