- Você colocou Malphas como vice?! Como pôde fazer isso comigo?!
Não preciso nem dizer quem era o autor da reclamação.
- Eu fundei a Ordem com você! Eu estava lá quando decidimos o que fazer! Você simplesmente passou por cima de tudo e resolveu nomeá-lo sem me consultar!
Seus olhos castanhos me acusavam sob a sombra do capuz negro. Recostado ao poço, ele mantinha os braços cruzados, a máscara pendurada em suas costas.
- Cale a boca. Vá reclamar com alguém que se importe. Buer, talvez. O cretino também não gostou da hierarquia. Por que vocês dois não se juntam e abrem uma Ordem só de vocês? Adoraria ver os dois idiotas sendo guilhotinados.
Aquelas palavras saíram com aspereza de minha garganta. Brincar com o episódio mais traumático de nossas vidas foi uma coisa horrível. Eu era o único cretino ali.
- Não acredito que você fez isso! Você me conhece há muito mais tempo que ele! Você nem sabe quem ele é! Como pode confiar nele mais do que em mim?!
- Não nomeio cargos baseado em intimidade, e sim em capacidade. E o infeliz mostrou muito mais habilidade que você para assumir a liderança. Ele é um gênio, o que eu poderia fazer? Mostre algum valor e talvez um dia você chegue aos pés dele.
- Jamais pensei que você me desprezaria desse jeito.
Eu me levantei num pulo, fazendo força para manter os punhos perto de mim.
- Escute bem, Alastor. Você deveria agradecer que eu não tome minhas decisões com base em gostar ou odiar alguém, porque, se fosse o caso, a única posição que você estaria ocupando agora seria debaixo da terra. Eu não desprezo você, eu te odeio profundamente. Minha opinião sobre você é que não passa de um verme egoísta, covarde e mesquinho, que deixa os outros morrerem ao invés de se arriscar para proteger quem depositou sua confiança em você. Se confio em você? Nem um pouco, não depois do que te vi fazer. O único motivo de você estar na Ordem é porque ainda tem alguma utilidade. E se eu fosse você, tentaria ser o mais útil possível.
- Está me ameaçando, carpinteiro?
- O que você acha?
Ele veio para cima de mim, tentando me dar um soco.
Algumas pessoas nunca aprendem...
Desviei de seu golpe sem tirar as mãos dos bolsos. Ele se irritou mais.
- Eu sei quem você é, garoto, nunca se esqueça!
Certa vez eu disse que meu equilíbrio emocional era como uma ratoeira. Basta tocar no ponto exato, e a armadilha se fecha sobre o idiota que tentou me ludibriar.
Aquele era o ponto exato.
Não pude evitar. Abri as mãos para deixar cair sobre o chão todas aquelas travas que me seguravam. Bom senso. Ética. Autocontrole. Interesse social. Piedade...
Assim que todas caíram, fechei os punhos, abraçando somente o instinto animal dentro de mim. Era um caminho sem volta.
Eu não bati nele. Eu o arrebentei. E não até que ele não aguentasse mais, mas até que eu não aguentasse mais. Estava além do certo e do errado. Ele havia ameaçado revelar minha identidade, e eu tinha a obrigação de deixar claro que ele jamais deveria pensar na hipótese outra vez.
Então eu o chutei contra a parede do poço até que ele começasse a cuspir sangue. Pensar em Laura me ajudou muito. Lembrar de como ele me segurou naquele dia, me forçando a ficar quieto enquanto via a bala cavar um buraco em sua cabeça... O idiota deveria ter me estrangulado até a morte, e agora iria pagar pelo erro que cometeu ao me soltar. Cada baque de meus pés contra suas costas era uma das batidas do coração de Laura que ele havia roubado de mim.

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O Filho da Rebelião (Completo) - Livro II - Trilogia Dantálion
Ciencia FicciónAntes de Dantálion, havia Iago. Tendo presenciado a execução cruel dos pais e carregando na pele as marcas do sofrimento, o menino precisa encontrar em si mesmo a força para decidir seu destino: fugir e esquecer o passado, ou buscar a vingança que c...