Foi já em meados de agosto que consegui uma resposta para a pergunta sobre o autor da maioria dos livros daquele ano, e antes mesmo disso apenas a suspeita dela já era o bastante para me fazer sonhar em passar uma máquina zero na barba de Dumbledore. Quando Hugo pôs uma placa na frente da Floreios e Borrões com a foto do homem e os dizeres "sessão de autógrafos", decidi que ele mais parecia algum ator/modelo do que um grande bruxo defensor dos fracos e inocentes com suas incomparáveis habilidades mágicas. Eu podia estar enganada, e queria, mas seus dentes retos e cabelo bem hidratado não me passava a imagem de duelista e sim de algum comercial de produtos de beleza.
Como alguém que lutou contra um lobisomem, um espirito agourento, trasgos e vampiros pode não ter nenhuma cicatriz?
Lagrum revirou os olhos para mim, ou o que era revirar os olhos na versão reptiliana sem pálpebras, e sequer se dignou a me responder. Li cada um dos livros do homem (cortesia de Hugo, que me fez pela metade do preço uma vez que os best-seller eram bem carinhos) e a cada paragrafo a narrativa apenas não se encaixava com o homem bem vestido, jovem e bonito, sorrindo com cabelos esvoaçantes na contracapa. Cheguei a perguntar sobre ele para Tom e Daisy, Garrick e Hugo. Os dois primeiros não conheciam o homem além de seus livros e o último estava em uma relação de amor e ódio com a esperada lotação que a sessão de autógrafos reservaria para sua loja.
— Mas as damas vão comprar algum livro, Mal? Acha que vão? — E saia resmungando, na esperança de toda aquela gente render pelo menos algum lucro. Olivaras, por outro lado, tinha uma opinião dúbia sobre o homem.
— Gilderoy? Eu me lembro, claro que lembro. Vinte dois centímetros, cerejeira e fibra de coração de dragão. Era um rapazinho ansioso: não para aprender, e sim para brilhar.
E havia conseguido uma varinha para tal: o coração de dragão era um núcleo bastante conhecido pelo seu poder e lealdade, e a madeira de cerejeira era especialmente requerida pelos alunos da escola de magia Mahoutokoro, no Japão. Uma varinha dessa madeira era sinal de prestigio e apenas os idiotas diziam ser fraca ou superficial ao associa-la com a flor: o poder da varinha de cerejeira costuma ser verdadeiramente letal, não importa o núcleo, e, por isso, nunca deve se unir a um mago sem autocontrole ou com fraca força de espírito menor do excepcional.
Se olhasse apenas sua varinha, estava sendo submetida a ler aventuras de um homem realmente acima da média, algum tipo de herói. Mas minha própria consciência (que sibilava e se chamava Lagrum) e as últimas palavras de Garrick não fizeram da leitura algo agradável a cada vez que lembrava que tudo aquilo era mais que ficção. Mesmo que, na melhor das hipóteses, Lockhart houvesse feito tudo aquilo, não havia nenhum tipo de verdadeira instrução naqueles livros. Nenhuma teoria, nenhum feitiço, nenhum guia. Só páginas e páginas do homem sorrindo.
Em minha defesa, rabiscar a cara dele com tinta em todas as capas foi um ato de salvação – iria acabar jogando tudo no fogo se Gilderoy sorrisse e piscasse para mim mais uma vez.
E foi por isso que decidi ficar no Caldeirão Furado naquela quarta-feira, sabendo que durante toda a tarde a Floreios e Borrões estaria lotada de bruxas se estapeando para ver o galã. Não tinha o mínimo interesse em me juntar a elas, nem mesmo por curiosidade, e depois de ajudar na cozinha e almoçar, subi direto para o meu quarto estudar por conta própria. Iniciei e terminei resumos de alguns dos primeiros capítulos dos livros, como o de Feitiços, Transfiguração, Poções e Defesa Contra Artes das Trevas, esse ultimo baseado no que li por conta própria na livraria.
Lagrum estava certo em dizer que eu não devia ter começado tão cedo: fiquei insuportavelmente ansiosa. E aproveitando a cobertura mágica de estar cercada de bruxos maiores de idade, pratiquei tudo que podia até não precisar que nenhuma voz saísse da varinha em pelo menos feitiços básicos. Me diverti tanto que só sai do quarto, para o grande alivio de meu amigo, para encontrar Olivaras em nossa hora marcada. Mas Garrick teria de me perdoar, forças maiores agiram para me tirar do caminho. E com toda certeza considero o bando Weasley em peso mais um anão de óculos e os Granger uma força maior.

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Corona II
Fiksi PenggemarAlvo Dumbledore havia dito que algumas perguntas devem permanecer sem respostas e, na opinião de Malorie Lewis, ele estava certíssimo. Depois de ajudar a salvar a Pedra Filosofal de Lorde Voldemort (e de ter seu próprio confronto com o bruxo malign...