Prata no Verde

2.3K 379 183
                                        

Era de se esperar que uma garota encontrasse paz em sua própria cama. Talvez a maioria conseguisse. Mas a maioria não tinha que lidar com cobras. Quando passei pela porta do meu dormitório, com os ponteiros do relógio já se aproximando de uma da manhã, eu não imaginava que encontraria as luzes ligadas e nem mesmo o rosto de três garotas entre doze e treze anos me encarando – vestidas para dormir, sentadas em suas camas, mas sem sono algum. Levantei uma sobrancelha.

— Eu devia ter avisado para não me esperarem acordadas? — Resmunguei para nenhuma das três em especial, mas meus olhos estavam em Daphne, pois os dela estavam em mim.

— Você está sangrando — A herdeira dos Greengrass não esperou meu consentimento para sair de sua cama, andar até mim e tocar em meu buço com a ponta dos dedos de princesa. — O que aconteceu?

— Sobre o sangue ou sobre todo o resto? — Forcei um sorriso que não foi correspondido, seus olhos verde-água afiados para minhas gracinhas, cortando-as em dois. Soltei o ar, olhando para trás dela os rostos ansiosos de Sue Hopkins e Emily Bulstrode e, mais além, uma única pessoa coberta até a topo da cabeça. — Eu e você sabemos que está espiando aí embaixo, então ajude sua dignidade e se junte a nós ao invés de se colocar nessa posição.

Demorou alguns segundos, mas o amontoado que era o corpo de Pansy Parkinson saiu debaixo de suas cobertas. Seus cabelos curtos estavam bagunçados, mas os ombros permaneceram retos enquanto ignorava o fato de ter sido descoberta. Olhou para nós de forma demorada, então para o sangue em meu rosto, mas não esperei qualquer palavra dela e não veio. Era como tinha que ser, ao menos por hora.

— O que aconteceu, Mal? — Sue ecoou a pergunta, mas Daphne balançou a cabeça.

— Depois, Sue, agora ela precisa limpar esse rosto.

— Deixa disso, Daphy — com o máximo de suavidade que consegui, me afastei de sua mão preocupada. — Sangue seco já deixou de me incomodar faz muito tempo. Eu vou para o banho daqui a pouco, depois que acalmar os nervos das minhas estimadas colegas de dormitório, claro.

A maioria deslizou as luzes e fechou as cortinas de suas camas depois que expliquei, mesclando fantasia e fatos da melhor maneira que consegui, sobre a inscrição na parede e Madame Nor-r-ra. Não, eu não sabia quem havia feito aquilo. Sim, tinha certeza que nenhum dos leões tinha qualquer dedo naquilo. Não, Parkinson, muito menos eu. Havíamos encontrado tudo do jeito que todos viram: uma frase macabra na parede de pedra e a pobre gata pendurada, toda dura no suporte de archote. E não, ela não estava morta. Havia sido petrificada, coisa que ajudou a limpar nosso nome – nenhum estudante do segundo ano poderia ter feito aquilo, era magia negra avançadíssima.

Madame No-r-ra ficaria bem e voltaria a perseguir os estudantes quando as mandrágoras de Sprout chegassem à maturidade. Suspeitos? Não havia nenhum. Muito menos culpados. Satisfeitas, por hora, com as atualizações, Pansy, Hopkins e Bulstrode se deitaram em suas camas, prontas para aproveitar uma longa noite de descanso e comemorar o fato de amanhã ser domingo. Eu adoraria me juntar a elas nessa atividade, mas Daphne não deixaria que eu escapasse tão fácil.

Ela me esperava depois que me limpei no banho, a água quente aliviando meus músculos tensos e empurrando as ondas de dor, me dando mais algum tempo de consciência. Greengrass era perspicaz demais para não notar o sutil fato de que eu não havia comentado sobre minha brusca saída da Festa das Bruxas. Tinha esses olhos claros e sérios, muito sérios para alguém da idade dela, mas sérios o bastante para a garota que tinha todo um nome em cima de si. Constantemente eles estavam em mim, percebendo a menor mudança de tom de voz e me perseguindo depois com isso. Não diria que era algo ruim.

— Não tenho resposta, Daphy — murmurei por baixo do ressoar de Parkinson. — Senti alguma coisa e então já estava naquele corredor. Os outros chegaram instantes depois. Isso é tudo.

Corona IIOnde histórias criam vida. Descubra agora