Little Girl

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    Eu nunca tinha lidado com bebês antes. Era algo novo, e era por isso que eu admirava.
    Uma nova experiência, que eu nunca tinha vivido antes. Era exatamente disso que eu precisava.
    Eu esperava por isso, como uma pessoa que queria muito tocar um instrumento e agora tinha ele em mãos, pronto para ser utilizado.
    Mas eu teria que aprender a tocar. Não que isso fosse um problema...

    A porta foi aberta e o choro do bebê ficou mais alto. Reparei no apartamento não tão grande e com uma aparência desorganizada.
    A estrutura em si era bem simples e desesperadamente arrumada, com um cômodo que englobava dois locais ao mesmo tempo: a sala de jantar, que se resumia em uma mesa retangular, e a sala de estar, com uma televisão e um sofá bem pequeno.
    Aparentemente, não havia uma preocupação com a moradia. Eles apenas queriam morar em algum lugar que fosse seguro e silencioso.

    -Kyro, faz essa pestinha parar de chorar.- Shina reclamou, sentada em uma poltrona ao lado do sofá.

    A situação da garota era deplorável. Olheiras rondavam a parte inferior dos olhos, aparentando que ela não dormia há dias.
    Antigamente, o seu cabelo era arrumado em uma trança, mas agora os fios estavam soltos e ondulados.
    Sukito, que estava mais alto e com uma expressão mais intimidadora, estava encolhido na poltrona ao lado de Shina.
    Aparentemente eles estavam mais unidos e isso era mais tranquilizador.

    -É, concordo.- Murmurou o loiro que estava quieto e calmo demais.

    Kovu também mudou muito com o tempo, principalmente o seu físico. Ele era magro, de um jeito estranho, mas aceitável.
    Agora seus músculos apareciam em seus braços. Ele não tinha deixado de ser magro, mas agora era um magro neutro, que variava entre um corpo definido.
    Ele segurava um controle de video game e estava mais concentrado do que eu esperava. Seus olhos não saíram da tela nem quando eu tinha chegado.

    -Tá tudo bem.- Ouvi um murmúrio carinhoso e me surpreendi quando percebi que era Kyro.

    Eu tinha ficado tanto tempo analisando todas as diferenças que acabei me esquecendo do detalhe principal.
    A garotinha, que antes era segurada por Basten, foi pega no colo por Kyro e soluçava baixinho, como se quisesse parar de chorar.
    O seu cabelo, amarrado graciosamente no topo da cabeça, era loiro claro como um campo de trigo exposto ao sol.
    Era diferente do que eu esperava. Ela não era muito parecida com Kyro, mas eu ainda temia a cor e profundidade de seus olhos.
    Kyro acalmou a garotinha e ela abriu os olhos com um pouco de dificuldade.

    -Kyro, eu nunca falei isso, mas eu te amo muito.- Shina escorregou na poltrona, murcha como uma rosa acinzentada.

    A audição aguçada de Shina deveria ter sofrido muito até agora. Ela realmente tinha motivos para ficar naquele estado.
    Me aproximei lentamente, temendo assustar a criança frágil que aparentava ser como um pequeno anjinho.
    O olhar analisador da pequena se encontrou com o meu, me deixando receoso. Não era como se ela fosse me matar, mas eu temia a sua reação com a minha presença.
    Os seus olhos também não eram da cor que eu esperava. Nunca pensei que seriam castanhos, o que me deixou surpreso.
    Talvez a luminosidade pudesse deixar aquela cor parecida com o âmbar, mas naquele momento era castanho. Um castanho claro, mas ainda assim era castanho.
    De alguma forma, eu não vi Kyro ou Nara espelhado naquela carinha. Nem mesmo imaginei a cara desconhecida da mãe dela...
    Eu me vi ali, bem nos olhos castanhos e curiosos que me fitavam.

    -O nome dela é Luna, embora eu não saiba se ela concordaria com isso.- Kyro falou, percebendo o meu olhar vidrado na garota.

    A sua carinha não tinha nenhuma expressão. Ela apenas me olhava atentamente e eu não sabia o que esperar dela.
    Ouvi o barulho alto de algo quebrando, cortando o silêncio que tinha se instalado no ambiente minutos atrás.
    Kovu estava com uma cara irritada, olhando para a tela da televisão que mostrava as palavras Game Over grandes e estampadas ali. O controle em suas mãos estava partido ao meio.
    Sukito estava rindo da cara do amigo, enquanto Shina estava assustada, provavelmente por ter tomado um susto com o barulho.
    Então eu escutei um murmúrio e soube exatamente o que era. Luna começou a chorar novamente e atraiu a minha atenção.
    Eu não sabia o que fazer, apenas assisti Kyro tentando acalmar a pequenina em seus braços.

    -De novo não...- Shina resmungou, colocando as duas mãos sobre as orelhas.

    A primeira coisa que consegui pensar em fazer foi avançar e pegar Luna no colo, assustando Kyro pela ação repentina.
    Segurar um bebê era tão estranho e novo que me deixava inseguro. Era como ter uma vida em suas mãos e um sentimento de responsabilidade tomar todo o seu corpo.
    Ela escondeu o rosto na curva de meu pescoço e eu fiquei paralisado no lugar, surpreso.
    Kyro me olhava com um sorrisinho no rosto e eu lancei um olhar reprovador para ele, mas não fez muita diferença.
    A garotinha fungava baixinho em meu ombro e sua respiração era desregulada. Minha mão acariciava suas costas com um carinho que eu não acreditava ter.
    Da cozinha, uma figura aparentemente brava chegou no cômodo, com os braços cruzados.
    Era Callie, vestindo um avental de cozinha estampado com algo por baixo de seus braços cruzados, que eu não pude ver o que era.

    -Eu desisto.- Pronunciou, se jogando no sofá ao lado do loiro pensativo com o controle quebrado.

    Percebi a quietude da garota em meu colo e presumi que ela já estivesse dormindo.
    Kyro ainda me olhava fixamente e eu franzi a testa, como se perguntasse o que ele queria. Ele fez sinal para o corredor ao seu lado e eu entendi, mas olhei ao redor como se aquilo fosse algo proibido.
    Aparentemente, ninguém prestava atenção em nós. Sukito e Shina conversavam em sussurros, que ninguém poderia ouvir; Callie apenas estava sentada preguiçosamente no sofá, com a cabeça caída para trás e os olhos fechados; Kovu ainda analisava o controle que tinha quebrado facilmente em suas mãos.
    Nara tinha simplesmente sumido do recinto, mas nem me preocupei tanto com ela. Sendo irmã do próprio demônio, ela poderia se cuidar muito bem.
    O único que poderia perceber a nossa ausência era Basten, que estava sentado em frente à mesa encarando papéis que eu não tinha ideia do que se tratava, mas que poderia desviar o olhar quando quisesse.
    Kyro já tinha entrado pelo corredor, esperando que eu o seguisse, e foi isso que eu fiz. Andei devagar até a porta no corredor que estava aberta e entrei no cômodo.
    Fechei a porta com cuidado para não fazer barulho e olhei ao redor, assimilando o pequeno quarto simples e bem arrumado.

    -Esse é o seu quarto?- Falei baixo, com medo de acordar Luna.

    Ele concordou com a cabeça, se aproximando e pegando a pequena adormecida de meu colo.

    -Ela geralmente dorme junto comigo, já que a gente não têm um berço ainda.- Disse, levando-a até a cama.

    Luna se encolheu quando foi deixada em cima da cama. Ela parecia muito menor agora, dando um ar de fragilidade.
    Kyro se sentou na beirada da cama, olhando para ela de um jeito acolhedor que me deixou embasbacado.
    Eu nunca imaginaria ele como um pai. Anos atrás, ele era tão idiota e frio que eu pensava que não poderia amar ou ser amado por alguém.
    Agora ele estava me provando o contrário, salvando e cuidando de uma garotinha que, inacreditavelmente, era a sua filha.
    Sentei ao seu lado, encarando a parede oposta á cama enquanto eu notava a proximidade que nós estávamos tendo.

    -Você vai me ajudar a cuidar dela?- Perguntou, desviando o olhar para me encarar.

    A sensação de ser encarado por ele era sufocante e eu queria sair dali o mais rápido possível, mas consegui responder:

    -Se eu concordar, vai ser por ela.- Disse, me referindo à Luna.

    -Acho que eu posso conviver com isso.- Falou, me fazendo olhar para ele.

    O sorriso satisfeito em seu rosto me fez repensar sobre todas as vezes que eu abominei a sua existência.
    Ele não era tão ruim assim.

...

O cap tá meio pequeno? Tá.
Desculpem mesmo :/
Eu tô com dor de cabeça então não tem muita coisa que eu gostaria de falar no momento.
Bye ;3

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