Familiar Things

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    Eu sentia o meu sangue ferver, mas não era um sentimento necessariamente raivoso. Era algo específico, desconhecido e ao mesmo tempo muito familiar.
    Minha cabeça estava se ocupando com perguntas que eu nunca pensei que faria novamente.
    Eram perguntas relacionadas a ele, perguntas cheias de curiosidade e preocupação. Mas eu não deveria me preocupar...
    Deveria?

    Eu acordei um pouco atordoado e sentindo fisgadas em minha pele. O meu corpo estava arrepiado e trêmulo. Eu suava frio e podia perceber certa dificuldade para respirar.
    Apenas ignorei e respirei fundo, retomando o ar que estava em falta.
    Era um dia normal: me levantei, fui até o banheiro e lavei o meu rosto, me renovando para aguentar outro dia cansativo.
    Porém percebi algo estranho ao me olhar no espelho. Meus olhos estranhamente arregalados e as íris quase invisíveis estavam brilhando em vermelho.
    Eu não me surpreendia com a mudança de cor dos meus olhos. Eu era um monstro agora, mesmo sem eu querer.
    Eu sempre tentava evitar qualquer comportamento estranho e agir como alguém normal, o que era bem fácil pois eu podia controlar meus instintos. Mas naquela manhã, quando eu vi os meus olhos perturbados e involuntariamente transformados, percebi que havia algo de errado.
    A concentração que eu tive que impor para que minha aparência voltasse ao normal foi absurdamente inacreditável. Eu nunca tive que forçar o meu controle.
    Passei a língua pelos caninos, sentindo as pontas levemente pontudas. Provavelmente eles estavam mais formados antes do meu controle se restaurar.
    Esperei algum tempo até ter certeza de que a minha aparência não iria ser afetada novamente e saí do banheiro, me lembrando mentalmente de me manter o mais calmo possível.
    Enquanto eu arrumava as minhas coisas para sair de casa, divaguei sobre alguns acontecimentos passados, que me custavam para deixar a minha mente...

    (Flashback ON)

    Sentir que você está preso e entregue a vários tipos de tortura é agoniante. Os meus pulsos eram fortemente presos nos braços de uma cadeira de metal.
    Um sujeito encapuzado sempre vinha para me machucar e me deixar para sangrar sozinho.
    Era doloroso, mas não chegava perto da falta de esperança que eu sentia por dentro. Eu estava apaixonado, eu sabia disso, mas ele não viria.
    Ele não sabia que eu tinha sido pego por alguns guardas que passavam bem perto da casa. Eu não consegui fugir e acabei parando em uma cela velha, onde as barras de ferro estavam enferrujadas e sujas.
    Esse castelo é assustador. Quase não consegui salvá-lo antes por tamanho receio sobre a estrutura grandiosa e tenebrosa. Mas tinha algo que me impulsionou quando o medo estava dominante...
    Na época, eu não fazia ideia do que era aquilo, aquele sentimento, mas agora eu posso ver claramente.
    Eu estou sim apaixonado por ele, e dói saber que ele vai morrer e eu não poderei impedir.

    -Garoto!- Alguém sussurrou, e mesmo com a cabeça baixa, pude ouvir. -Olhe aqui!

    Lentamente levantei a cabeça e fixei o olhar nas grades de ferro, onde havia alguém do outro lado.
    Era a mesma pessoa desconhecida que vinha me torturar a cada período de tempo, no qual eu não fazia ideia do quanto era.
    Abaixei a cabeça de novo, me encolhendo no metal frio da cadeira e fechando os olhos, esperando ouvir o som da grade se abrindo.
    Nada aconteceu. Nenhum som. Nada.

    -Não me ignore.- Murmurou a mesma voz, agora muito perto do meu ouvido.

    Me assustei e levantei o olhar de súbito, observando o rosto agora em minha frente.
    O indivíduo estava dentro da cela comigo e com o capuz abaixado, revelando um rosto feminino e inesperado.

    -Quem é você?- Perguntei e minha voz falhou, rouca e fraca.

    Pensei que ela não conseguiria entender o que fora dito por mim, mas ela respondeu.

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