O Rei Dragão - parte 18: Boa Vizinhança

176 18 0
                                    

I'm friends with a monster that's under my bed

Get a long with the voices inside of my head

You trying to save me

Stop holding your breath

And you think I'm crazy, yeah, you think I'm crazy

Well, that's nothing

- Vamos Abelha, as meninas querem você!

O animal continuava estático observando a casa. Eduardo preferiu não insistir, nunca conviveu com um maesel antes, melhor respeitar aquele momento de Abelha querer ficar só.

- Vamos magrelas, Abelha vem depois!

Como não sabia voltar para o acampamento, pegou as roupas velhas que tirara e deu para o maesel branco cheirar, este compreendeu o comando e mostrou-lhes o caminho por terra.

- O Op-Hal chama ele fazendo piu piu piu piu piu! – entregou Sabrina.

Enquanto refaziam o caminho complicado e sem trilha demarcada, Eduardo aproveitou a deixa para especular tudo o que aconteceu, e nos torvelinhos da narrativa infantil conseguiu pinçar algo útil e perder o foco sobre algo bem mais importante.

- Eles tem livros? O pai do Op-Hal sabe ler? – perguntou o rapaz.

- Sabe! – Sabrina enfatizou chacoalhando a cabeça.

- O Op-Hal bem sabe também!

- Que nada, Bina! – ele desacreditou da informação e ouviu a insistência de uma pequena indignada.

- Sabe! Sabe sim! Ele leu o nome da mãe dele lá na... lá... lá peidei! – as gêmeas começaram a rir.

- Na lá peidinho!

- Na lá peidinho fedido e fedorento!

Disseram Sabrina e Beatriz, as comediantes de Tendas, e Eduardo apenas assentiu pacientemente, sem acreditar.

- Sei...

- Aquela hora a casa do Op-Hal tava fedendo, né?

- É, mas ele não me pediu desculpa de jogar um bicho em mim!

***

Assim que os intrusos foram embora e a esposa ficou distraída cuidando do filho, o homem saiu para reencontrar um antigo conhecido, nem precisou procurar, o bicho estava imóvel a sua espera.

- Abelha, é assim que elas o chamam, correto? Soldado, babá, animal doméstico! Eu cheguei a pensar que alçaria ser superior – desdenhou – No entanto vejo que errei, superestimei sua inteligência. Tampouco as circunstâncias que novamente nos reuniram me impressionam, na verdade, surge como um lembrete do que eu quero esquecer! Agora prevejo que o idílio acabou, virão atrás de nós, aposto que a rainha perseguia aquelas garotas e assim vieram parar aqui. Finda a paz, seremos caçados finalmente.

Mesmo conservando os grandes olhos cinzentos aumentados pelas lentes dos óculos, o homem diferia do homem refinado registrado na memória detalhista do maesel. O que não impossibilitou que Abelha o reconhecesse.

- Shhhhhh, guardemos nosso segredo! – encerrou o monólogo.

Deu tapinhas de leve na tromba de Abelha que, tranquilamente, recuou, deu as costas ao homem e voltou para suas meninas.

***

Se por um lado, elas eram observadas, por sua vez as senhoritas do Consenso avaliavam os rapazes da Guarda Real:

- São bonitos, encorpados...

- Falou tudo! Corpos! O que conversariam com esses monstros ignorantes?

- Pra conversar eu pego um Conselheiro mesmo, se é tão sabida adivinhe meu plano para um Guarda da Rainha Rúbia!

- O Chefe é o mais bonito! Malvadão, devia é ser trancafiado numa masmorra aquele louco.

- A rainha tem plena confiança nele, dizem que são amantes.

- Impossível! Como poderia?

- E da Alis. Não confio nela.

- Parem, o Honrado disse que ela é uma Conselheira e estará conosco.

- Essa espera está me matando! Ficar aqui é um tédio!

O Guardião alto e forte veio dissipar a reuniãozinha:

- Está armando um bruta temporal, precisamos de ajuda para reforçar as barracas dos Guardas da Rainha, eles ainda usam um dos nossos modelos antigos enquanto as revestidas de lona super resistente repousa num depósito do castelo.

- Que idiotas! Por que usam as velhas?

- Explicaram que não deu tempo de costurar o brasão real.

Apesar da convicção de que mereciam passar a noite encharcados devido a imprudência, foram cumprir a tarefa.

***

Chuva dentro do Espinheiro significa risco de morte. Visto que ele é um planta viva, renova-se constantemente, folhas caem, rosas florescem e murcham. Assim, quando a água cai do céu lava uma camada de sujidades acumuladas, gerando o perigo a quem está no chão de ser atingido. Mênia e o marido rapidamente cobriram o tronco com uma lona impermeabilizada com certa substância produzida pelas aves. A lona deixava a cabana destacada na paisagem e por dentro abafada e sufocante. Mas em dia de chuva no Espinheiro, a regra número um é: proteger-se do que despenca com a chuva.

Em poucos instantes a cabana erguida por Eduardo foi quase destruída. A enxurrada era muito forte e só o que podia fazer era proteger as meninas com o corpo. Mal adiantava falar e prometer que a chuva cessaria e ficariam novamente bem, pois devido ao barulho de coisas escorrendo com a água, precisaria gritar o que pioraria o medo. Uma lasca de algum galho rompeu o frágil telhado de vez e fincou perto dos pés do feirante, que começou a rezar acreditando que chegara o fim. Uma figura surgiu na entrada do que restara da cabana:

- Venham antes que um espinho ou galho gigante arrase vocês!

Era o pai de Op-Hal, protegido com uma capa feita de lona grossa. Estendeu outra para Eduardo, cada um pegou uma menina no colo e caminharam o mais rápido possível de volta para a cabana segura.

Os maesel os seguiram e até para eles a qualidade das coberturas foi melhor, o maesel alado coube no espaço entre a abertura do tronco e a porta da cabana enquanto Abelha coube embaixo do tronco em declive.



O Rei DragãoOnde histórias criam vida. Descubra agora