O Rei Dragão - parte 36: Fidélix

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É o tempo do muito, do tanto que eu vejo

A nossa semelhança

E todo toque já é novidade

- Pesadelo? – Caça Escalpos perguntou.

Alis sentou com as pernas esticadas, engasgando, reclamando de falta de ar. Mauro esperou a crise passar, o fenômeno tem se repetido constantemente. Ela deitou o corpo para frente, apoiou a testa nos próprios joelhos e continuou arfando.

Mauro deslizou a mão ao longo das costas de Alis e pôde sentir as pontas dos ossos protuberantes. Em geral, o grupo perdeu peso e emagreceu dentro do Espinheiro, e Alis despontava como a maior deterioração. Nem Marília parecia pior, com toda dificuldade que atravessava. Talvez porque não estivesse caminhando, o serviço puxado ficava com quem a carregava. Enquanto isso assistia Alis, insistir, avançar ao seu lado sem pedir nada para ela, era a melhor de sua unidade. Por isso recebia dele o que ninguém nunca escutaria.

- Bom Ano Novo.

A mulher que conhecia teria beijado e se enroscado ao seu redor. Essa mulher cansada limitou-se a um sorriso distraído. Em nome da lealdade deu o beijo por Alis. Deitaram novamente e Mauro pegou no sono.

- Tudo bem, Alis? – Trácota perguntou no escuro, mantendo sua vigilância interminável ao lado de Eva.

- Sim.

"Faltam cinco dias." Ele sinalizou com os dedos e sorriu.

-Eu sei, eles não tem condições de estar tão a nossa frente. E carregam crianças, que andam devagar. Acho que antes disso os interceptaremos no caminho. Se ao menos essa planta parasse de sibilar e incomodar, me deixa louca!

- Dorme, Alis. Sempre que faço vigília reparo que está insone, tá quase na sua vez de ir para o mato. Descansa.

Trácota acendeu e apagou a lanterna taórica três vezes, na mata ao redor da clareira Nicanor, Fidélix e Pérola mantinham vigilância. Uma lanterna piscou três vezes no mato, outra repetiu o sinal. A terceira demorou, Trácota, alarmado levantou para conferir quem faltava e a última respondeu. Permaneceu de pé em estado de alerta, aprendera a não subestimar Nízor. Poderiam combinar inúmeros esquemas de segurança para o grupo, o único realmente eficiente era matar Nízor.

Passada uma hora, Alis avisou que ele deveria pedir que os outros voltassem para a troca. Trácota entregou a lanterna para a colega avisar Nicanor, Fidélix e Pérola para voltarem e foi acordar Eva. A Conselheira resmungou enquanto, Rato e Caça Escalpos já tinham jogado água no rosto e espreguiçado.

Pérola chegou depressa, temia demais ficar sozinha na mata escura. Nicanor saiu calmamente, desejou Bom Ano aos colegas e estendeu a lanterna para Rato.

- Cadê o Fidélix? – o ladrão estranhou a demora.

- Porra! – Caça Escalpos desembainhou a lâmina e os Guardas copiaram, prontos para lutar. Alis e Cícero se armaram e ficaram para defender as garotas.

Trácota seguiu a direção da lanterna que tinha demorado a piscar. Localizou no chão onde calculou que encontraria o objeto. Fidélix não estava ali. Apenas outro bilhete com o símbolo dos matadores de dragões.

- Nízor! – gritou para alertar o grupo.

Em seguida escutaram uma voz lamentosa.

- Que merda, cara! Que merda... – Rato revirava seus cabelos ruivos como se a cabeça doesse.

Trácota descobriu o que o deixou transtornado.

- Aqui! O Rato achou o Fidélix.

Mauro correu na direção da voz de Trácota, viu o corpo de Fidélix estirado na terra, a face retorcida numa expressão de horror na morte dolorosa. Segurava a arma, porém o Chefe estava incerto se houve luta, acreditava que o Guarda segurava a arma durante a vigília como todos faziam. Ajoelhou para examinar o ferimento, foi um assassinato sujo, cheio de sangue ensopando o uniforme do cadáver.

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