O Rei Dragão - parte 34: A Última Casa Ladeira Acima

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Nemo reconheceu a paisagem, desceu da montaria, retirou o jananá e se ajoelhou para agradecer a Divindade. Nuvens pesadas encobriam o céu e Taor por trás delas proporcionava um dia quente e abafado. Finalmente chegaram à vila de Tendas.

- Obrigado por mostrar-me tua face de compaixão, Divindade, Mãe da Luz e Mãe de todos nós! É abundante a sua graça e eu sou um ser pequeno que pouco merece. Vê o quanto sou falho, abandonei minha esposa, filhos, linhagem, para galopar no encalço de um sonho louco. Arrastei comigo um bom amigo que sofre, ó Mãe da Luz, providencie alívio ao seu coração.

Então Nemo pegou a terra do chão e jogou por cima dos ombros, os bordeses agradeciam com esse gesto cada término de uma viagem por mar ou rio.

Tairone viu com tristeza os pontos de sangue deixados nos últimos passos do cavalo usado por Nemo. Percebera que o animal sofria, não possuía a mesma energia inesgotável que impedia Ava render-se. Ali deveria haver um ferreiro ou qualquer profissional para Tairone alugar a oficina e cuidar pessoalmente dos animais, ao estilo centauro.

Para uma vila inóspita no meio do deserto, o lugarejo pareceu agitado.

- É sempre assim, Nemo?

- Quanta gente! Os comboios devem estar se organizando pra sair em viagem.

- Vamos tentar descobrir onde morava a criança, apenas cuide do que diz e evitaremos chamar a atenção.

- Fome, e você?

- Você comeu dois terços do coelho que caçamos. – levantou um dos cantos da boca num pequeno esgar de quase sorrir, não fazia uma expressão bem-humorada fazia muito tempo – Vamos procurar um lugar que tenha um estábulo e então resolvemos isso.

- Hospedagem, senhor? – um feirante idoso ofereceu e logo chegaram outros dois homens oferecendo o mesmo.

Tairone respondeu ao primeiro a abordá-lo.

- Quero acomodar-me junto com meu animal. Aceito um quarto para meu amigo.

- Entendo, senhor. Está com sorte, é o primeiro de Sargos que vejo chegar aqui. A maioria dos chegados são mésios, urupenhos e meia dúzia de amírticos. – disse o feirante.

- O pessoal de Frontir-Mésia para nossa sorte acampou fora da vila. Já imaginou mésios e amírticos começando a se desentender por aqui? – completou o outro feirante.

Os dois recém-chegados pouco compreenderam dessa conversa, disfarçaram as dúvidas sobre o que estaria acontecendo. Então Tairone pediu que o instalassem regateando brevemente os preços com os feirantes, só para manter a tradição.

- Quanto ao animal do meu amigo, arranje quem o leve para um ferreiro e depois alguém venha me buscar para que eu mesmo possa tratar suas patas. Aqui já entrego parte do pagamento da estadia. Com o ferreiro negociarei pessoalmente.

O feirante, que era um idoso banguela chamado Gael, pôs satisfeito o pagamento no bolso e deu a um dos outros feirantes uma parcela do valor combinado pelos serviços. Começou a indicar o caminho.

- Por aqui, tem ladeira se não se importam.

Atravessaram ruelas estreitas e outras largas na medida para permitir a passagem de um pedalinho por vez, cortaram o mercado por dentro, uma confusão de gritos e odores.

- Quando parte o próximo comboio?

Gael riu expondo a gengiva rosada por baixo do bigode branco.

- E quem é que qué saí de Tendas agora? Nunca acontece nada aqui não! Quem tá vindo de baixo conta que as estradas rumo pro oeste tão cheias de gente vinda pra cá, vem até os ricaços de Porto Seco, e o que esperamos é que a estrada sul teja a mesma coisa. É o que disse, pelos nossos pensamentos vocês devem ser só os primeiros a chegar rumo sul.

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