Capítulo 126

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Ele retira as mãos da cabeça, deixando um sorriso torto brincar no canto direito de seus lábios. Abaixando a cabeça e em seguida levantando a devagar, Daniel molha os lábios com a língua e se vira para mim, o olhar firme.
- achei que ninguém cuidaria dele melhor do que você.
Minha visão fica embaçada e uma lágrima tosca e solitária corre em minha bochecha esquerda, trato de a limpar logo.
- obrigada, Charlie é realmente muito especial para mim. E eu agradeço a você por tê-lo colocado em minha vida.
- não me agradeça.
Antes que eu possa responder o enfermeiro com cada de poucos amigos volta, segurando uma bolsa azul nas mãos.
- seu tempo acabou senhorita, preciso examinar ele.
- tudo bem, eu já terminei. - agarrei as alças da mochila e me virei, pela última vez antes de deixar a sala, e dizer algo que Andrew não me deu chance. - espero que você fique bem.
- eu vou ficar.

" "

Encolhi as pernas ao me sentar na arquibancada do campo de futebol e fecho os olhos, sentindo o sol, mais fraco do que de costume, adentrar minha pele exposta do rosto e pescoço. O ar entra e sai dos meus pulmões como se estivesse em chamas, meus cabelos, agora presos em uma trança mal feita na lateral da nuca, tem alguns fios soltos, fazendo cócegas em minha face.
Abro os olhos, ouvindo o som dos gritos do treinador Adams gritar com os meninos do time de futebol americano, e apanho o celular.
Nenhuma mensagem dele.
Um arrepio forte sobe pela minha pele e eu mordo a língua, sentindo o gosto metálico se espalhar pela minha boca. Os garotos correm pelo campo, as camisas grudadas aos corpos por culpa do suor, os cabelos molhados.
Talvez Andrew se desse bem no futebol americano.
Deixo o celular em cima da mochila e apoio os cotovelos nos joelhos, observando o quanto o senhor Adams pega pesado com os garotos do segundo ano. Ouço o celular dar um toque rápido e avanço para pegá-lo o mais rápido possível, ligo a tela e desbloqueio a mesma.

Aonde você está morango ?
Amorzinho 😍.

Estou preocupado. Aconteceu alguma coisa ?
Amorzinho 😍.

Deixo as mãos caírem em meu colo e resolvo responder Sam antes que ele me rastreie.

Estou bem, desculpa não avisar.
M.

Só me deixe quieta agora, preciso pensar.
M.

A resposta veio em seguida, rápida como uma bala que fazia questão de atingir meu peito toda vez que eu penso em Andrew.
Aonde você está ?

Tudo bem morango, me avise qualquer coisa.
Amorzinho 😍.

Obrigada ❤️.
M.

Larguei o celular sobre a mochila novamente e me estiquei para trás, apoiando as costas e a cabeça nos brancos das fileiras acima da qual eu estou sentada e pensando em como tudo mudou de uma hora para outra.
Não sei quanto tempo eu fiquei aqui, sentada no banco duro e desconfortável da arquibancada observando o time e logo depois fecho os olhos, deixando o vento forte e gelado levar minha dor para longe. Só voltei a mim quando senti o primeiro pingo de chuva tocando o meu rosto, caindo exatamente sobre minha testa. Me apresso para pegar o celular e o enfiar no meio dos cadernos na mochila, os pingos de chuva se tornam mais  volumosos e eu tento descer as escadas sem cair ou escorregar. Corro entre os carros até chegar no Mini Cooper vermelho, entrando no carro e despejando todo o conteúdo da mochila nos bancos traseiros.
O celular, os livros, os cadernos e algumas canetas, além do estojo, caem de uma vez, me confirmando a hipótese de que nada foi molhado pela chuva grossa. Jogo os cabelos para trás, grunhindo ao sentir os nós sendo puxados pelos meus dedos. Ligo o aquecedor do carro, tentando me esquentar, já que minha roupa está completamente encharcada, e encosto a cabeça no volante.
Aonde você está meu amor ?
Não houve mensagens, não houve nenhuma ligação, nem mesmo algum sinal de vida pela parte de Andrew desde que me abandonou nesse estacionamento. A preocupação por ele e a raiva de mim se acumulam em meu peito, diria que até me dilacerando o coração de dentro para fora.
Mas por que aquela merda de encontrão foi acontecer ?
Caso contrário, eu não estaria toda molhada dentro do meu carro, me sentindo mal por ter deixado um segredo que não era meu fazer um buraco na confiança que tanto cuidei em relação a Andrew e sim, na sala de aula pensando em como o meu relacionamento estava bem, conversando com Sam sobre o baile de sábado que vem e olhando de vez em quando para Andrew, que estaria sentado no fundo da sala com seus amigos.
Retiro os óculos do rosto e os deixo no painel do carro, encostando a cabeça no banco e me virando de lado, encolhendo as pernas e as puxando para mim, no intuito de tentar me diminuir junto com a minha dor. Minha mente gira, roda e da pequenos gritos ao tentar pensar em alguma localização que possa se encaixar na descrição : para onde Andrew iria se estivesse se sentindo perdido ?
Mas nada surge, nenhum lugar parece ser forte o suficiente para aguentar a fúria de Andrew ou de seus punhos descontrolados. A última coisa que me resta é procurar alguém que definitivamente o conheça bem, que o conheça melhor do que eu, que me mostre ou me dê pelo menos uma dica de onde ele possa estar. Eu preciso saber aonde Andrew se enfiou antes que meu corpo sucumba a hipotermia, por conta das roupas molhadas, ou ao meu cansaço mental, por tentar entender os ciúmes e a possessividade do meu namorado.
Mordo meu lábio inferior bem forte, na intenção de fazer minha dor interior se manifestar pelo ferimento em minha boca. A chuva se intensifica do lado de fora e um trovão dança solto no céu, clareando por um instante as nuvens escuras.
Eu preciso ir para casa, preciso da minha cama, preciso do abraço do meu avô e principalmente, preciso sentir o cheiro de Andrew em meu travesseiro.

GraysonOnde histórias criam vida. Descubra agora