Dois Pais

Capítulo 12

Olhava fixamente para o chão. Otto tentava contato visual com ele até o guarda berrar, brandindo o cassetete: —Sem gracinhas, ou arrebento seus miolos!

Voltaram a atenção para os rapazes no fundo do veículo: eles miravam de volta, com maquiagens borradas e hematomas. Alguns não deviam ter mais que quinze anos. Se lembrou de Ludwig sendo estapeado no rosto. Conteve as lágrimas.

O caminhão parou próximo à piscina pública para onde o sobrinho o arrastava no verão, junto com a mãe. Se entreolharam, confusos. Mandaram-nos seguir em fila. Ventava forte e nevava, de modo que se acharam mais ou menos satisfeitos ao entrar. Um forte cheiro de desinfetante tomou-lhes de assalto, emanando da água iluminada por refletores. Guardas armados os cercavam com cães ao lado de enormes pilhas de roupas.

Alois franziu as narinas. Qualquer que fosse o objetivo daquilo, os filhos da puta eram organizados. Se perguntava o que esperavam deles ali e principalmente como convenceria um júri a devolver-lhe Ludwig. Teria que ser um mentiroso melhor do que fora por todos aqueles anos, concluiu. Aguardaram até um superior aparecer, recebido com continências: baixinho e parecendo incapaz sequer de trocar um pneu, ele os encarava de chicote na mão, o rosto empinado.

O oficial exclamou: —Nunca pensei que estivéssemos tão mal, meus caros! Homens que poderiam ser os propagadores da nobre raça ariana, reduzidos ao quê? Um bando de efeminados, invertidos, degenerados! —O sujeito parou bem em sua frente: —Muitos aqui já enfrentaram as consequências dessa perversão, mas precisavam repetir a dose, não é?

Cerrou os dentes. Tudo o que haviam passado, tanto esforço pra nada...Inspirou fundo, mantendo a cabeça baixa.

—Eis o antídoto de que precisam. — Ele estalou o chicote, ordenando: —Dispam-se!

Todos se entreolharam, atônitos. Os guardas distribuíam golpes, repetindo a ordem. Ele e Otto obedeceram antes mesmo que se aproximassem, recebendo pancadas do mesmo jeito. Estremeceu, a dor se espalhando por suas costas. Desabotoava o cinto quando outro guarda se aproximou, mirando seu peito nu. Só então se deu conta de que continuava com o crucifixo que ganhara do companheiro.

O homem segurou a joia entre os dedos, rindo: —Você é um pároco, por acaso? Como se atreve a usar isso no seu pescoço imundo? — Permaneceu calado. Ele a arrancou num puxão, atirando-a no piso sujo: —Crucifixos não foram feitos pra você e a sua laia!

Otto olhava, assustado. Alois poderia afundar com o peso de toda sua raiva. Esperou o guarda se afastar e se abaixou, largando a calça. Recolheu a correntinha, escondendo-a na mão.

Ficaram nus, os mais jovens escondendo suas partes íntimas do achincalhe dos guardas: —Estão com vergonha? Não tiveram nenhuma antes... — Os empurravam até a borda da piscina, atiçando os cães contra eles. Esbarravam uns nos outros. Um guarda forçou a cabeça de um retardatário contra a água modorrenta. Em meio a latidos e gritos, escolheram não dar chance ao azar. O companheiro comprimia os lábios, lhe estendendo a mão. Segurou-a e pularam juntos.

A água gélida o fez içar-se depressa, olhos ardendo em contato com o que devia ser um terço desinfetante puro. Juntou os braços ao corpo, batendo os dentes, tentando se equilibrar no piso escorregadio. A massa humana despejada na piscina se aglomerava, tremendo. Sentia as pontas dos dedos dormentes, o calor lhe escapando. Otto o abraçou para aquecê-lo. Ele se esforçava em manter o rosto longe da água, pois não sabia nadar.

―Calma. ― murmurou-lhe. Precisavam se manter fortes, pensou. Por eles mesmos e por Ludwig. Tentavam se conservar longe das bordas, de onde os guardas aproveitavam para bater nos coitados que alcançassem. Ficaram assim por algum tempo, até que finalmente mandaram-nos sair. Suas roupas e qualquer coisa que por acaso tivessem jaziam amontoadas do outro lado.