Antes mesmo que o dia amanhecesse, o barulho e o tremor os alertou: um comboio vinha na direção deles. Depressa, correram para o outro lado do pomar. Soldados da SS desciam armados como se a fazenda fosse abrigar um novo campo de concentração.
Klaus cumprimentava o oficial à frente do batalhão.
Yvette exclamou: ―Tem mais guardas aqui que nos bordéis! ― Tiveram de lembrá-la de falar baixo.
Klaudia sussurrou: ―O que faremos?
―Tem que ter um jeito de entrar. ― Pensava nisso, quando se lembrou: ―Espera, ele disse, "Apareça na nossa festa!"
Otto franziu as sobrancelhas: ―Talvez estivesse falando metaforicamente. ― Então Klaudia apontou os entregadores com um bolo enorme, cilindros de hidrogênio e balões.
Franz cerrou os dentes: ― É claro! Amanhã é 20 de abril, aniversário do maníaco do Hitler.
― Tem até palhaço! ―Yvette apontou para o caminhão com pintura circense estacionado mais adiante. Um plano começava a se formar na mente de Alois. Rezou para que ao contrário dos anteriores, ao menos este funcionasse.
O empresário desceu do veículo, falando com Klaus.
Alois se levantou: ―Para a estrada! — Pararam abaixados sob as árvores do acostamento. Amarrou um lenço na altura do maxilar e Franz fez o mesmo, as pistolas em punho, enquanto os outros aguardavam. Assim que o veículo passou, o pararam.
Sob a mira deles, o motorista soltou a língua: ―Será amanhã, ao meio-dia! —Ele os levou até a parte de trás do veículo, mostrando as fantasias e equipamentos do show, um verdadeiro camarim.
O amarraram, apesar dos protestos dele. Não tinha outro jeito com tantas vidas em jogo. Adaptaram a dispensa da fazenda como cativeiro. De acordo com o plano, ao fim de toda a comoção, Franz ficaria responsável por fazer uma ligação anônima e avisar onde o homem estava.
Acabado o interrogatório, se reuniu com o grupo: ―Tem um número em que o mágico faz alguém da plateia desaparecer, com um alçapão. Como já está tudo montado, não precisamos nos preocupar com isso. ― Mostrou o mapa desenhado: ―Os convidados estarão aqui, então se sairmos por trás... ― Parou, pensando em como fariam para atravessar de um canto ao outro da casa cercada.
Enquanto se debatia naquela questão, Yvette balançava os pés para o alto, deitada: ―Você será o mágico? Qual o nome?
Se preparou para as risadas: ― "O Fantástico Fernando, Mestre da Magia e do Suspense"...
Como previa, o grupo estourou na gargalhada: ―Tem sex-appel!— Ela batia palmas.
―Não fui eu quem inventei... Vamos nos concentrar no que é importante? ― prosseguiu: ―Temos os Pietenpol abastecido à nossa espera, assim como a moto e o caminhão, mas ainda restam os soldados para nos preocuparmos.
Um tom de pessimismo já se instaurava, quando Klaudia trouxe uma sugestão: ―Espera, o gás que eles trouxeram, para as bexigas... Era hidrogênio, não? Podemos criar uma distração.
Uma explosão serviria, concluiu: ― No fim, vocês três fogem por aqui. Nós dois seguiremos de volta. ―Apontou a estrada no desenho: ―Então, alguma pergunta?
Seu companheiro levantou uma questão: ―E se te reconhecerem no palco?
Tinha se esquecido daquele detalhe. Olhava para os quatro em busca de uma solução até que Yvette exclamar: ―Já sei! ―Ela pegou um conjunto de maquiagem do camarim: ―Vamos disfarçar você com isso!
Alois sentou à frente da penteadeira para que ela fizesse seu trabalho. Yvette espalhou um pouco de pó em seu rosto: ―Não coça, ou vai ficar mais duas horas aí.
Klaudia veio espiar, curiosa. Olhou de relance para a garota: ―Se ela fizer alguma estupidez, me avise.
―Está perfeito, Sr. Kaufman! Parece outra pessoa!
Levou um choque: estava uns três tons mais bronzeado, seus olhos azuis contrastando fortemente com a pele. Ela lhe ajeitou a peruca de cabelos pretos e a cartola: ―Vai, coloca o bigode. ―Pegou o acessório, vendo-se cada vez mais longe de sua aparência original.
Yvette subia nos ares de tanto orgulho: ―Fabuloso! Sabia que faria sua maquiagem um dia!
Otto sorriu: ―Ficou muito bem, principalmente o bigode.
Desviou o rosto, contente por não poderem vê-lo corar por baixo da maquiagem.
Quando todos estavam cansados de recitar o texto e suas respectivas ações, Alois voltou ao celeiro para checar o avião. Terminava de conferir o motor quando Otto apareceu na porta com seu jantar. Desceu da cabine: ―Agora é só rezar pro tempo ajudar amanhã. E o nosso refém?
―É difícil comer com alguém apontando uma arma, então falei para deixarem-no sozinho.
―Fez bem. ― disse, sorvendo cada gole de sopa da tigela. Após ser preso, fome era algo que não desejaria nem aos inimigos.
Se preparavam para descansar um pouco, mas o companheiro seguia, tagarelando: ―Quando chegarmos, compraremos uma casa, com dois andares no mínimo! Podemos procurar um papel de parede parecido com o que tínhamos. O Ludwig vai precisar de um quarto maior, e...
―Vamos cruzar umas cinco léguas de avião amanhã, esqueceu? —Achava que o tinha magoado com sua explosão, mas ele piscou, agoniado:
―Me desculpe! Minha cabeça não para de pensar em tudo que pode dar errado e...
―Ei ―Tocou o rosto dele: ―Acha que eu também não estou nervoso? Vamos deixar o futuro para o futuro, certo? — Sabia o quanto Otto se esforçava para não enlouquecer de vez, assim como ele próprio. Se tudo desse certo, seria maravilhoso. Caso contrário, não queria nem pensar.
Yvette e Klaudia dividiam o cobertor enquanto Franz dormia sobre a palha. Não eram só as vidas das pobres criaturas presas naquela casa que estavam em jogo, mas também as deles, que se ofereciam para ajudar com tanta solidariedade. Nunca imaginara encontrar amizades como aquelas e não estava disposto a perdê-las.
Abraçou o companheiro, mentalizando o instante em que teriam Ludwig de novo e se veriam finalmente livres daquele pesadelo.
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Gente, me desculpem pela demora em responder os comentários! Eu realmente tô num mês muito movimentado. Mas fiquem tranquilos q eu vou continuar postando!
Semana q vem veremos o plano deles sendo posto em prática, então preparem-se!😉😁 Votem e comentem o que vocês acham que vai acontecer, se algo vai dar errado ou não no resgate do Ludwig, se Yvette vai finalmente conseguir brilhar num novo look...
Enfim, comentem tudo o q vcs quiserem, porque falta pouco pra acabar agora! 😀
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Dois Pais
Historical FictionÉ 1938 e a Áustria está prestes a se unir à Alemanha nazista em sua cruzada odiosa. Em meio a isso, Alois Kaufman, um barman veterano de guerra, guarda de todos um enorme segredo: seu relacionamento de dez anos com outro homem, Otto Vandenburg, um s...