Capítulo 41

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Aterrissaram nas docas em Southampton. O que os locais chamaram de "Look out, the airplane!", na linguagem de Alois era apenas o resultado de uma longa jornada pilotando sem descanso. A dona de um hotel viu Ludwig e, apiedada, lhes ofereceu uma estadia de graça.

Colocou o garoto para dormir e parou em frente à janela, inspirando o ar salgado. Olhava os guindastes e prédios ao redor, ainda sem acreditar. Otto o abraçou. Não conseguiu deixar de conferir se Ludwig ainda dormia. Viu-o de costas, o lençol subindo e descendo devagar. Voltou a admirar a paisagem.

—É bonito, não? Podíamos passear naquela praia. Ludwig nunca esteve numa, ele vai amar isso!

Suspirou, sem sentir todo aquele entusiasmo. Parecia que ainda estava em Graz ou no campo, arquitetando a próxima escapada, a próxima mentira...

—Pensando no passado de novo?

Olhou para ele, os olhos castanhos lendo-o tão bem. Baixou o rosto para as ruas abaixo do hotel: —Não, é só...— Ele tocou sua mão. —Nada disso teria acontecido se eu...

—Não, Alois—Otto balançou a cabeça naquele ar de sabe-tudo irritante que ele amava tanto: —, mesmo se eu tivesse partido, nós três acabaríamos do mesmo jeito. Bem, talvez um pouco diferente, mas do que adianta pensar nisso agora?

Realmente, não importava saber como as coisas poderiam ter sido porque não tinham uma máquina do tempo. Olhou para Ludwig deitado, o braço pendendo para fora da cama. Tornava a cobri-lo, quando ele se remexeu:

—Tio...

—O quê? ― perguntou, temendo o que ouviria a seguir.

—Gostei das suas mágicas. Podíamos montar um circo. O senhor seria o mágico, o Otto podia ser o palhaço. Eu quero ser o domador de leões.

Sorriu. Era bom saber que depois de tudo o que passaram, o menino ainda queria testar sua saúde cardíaca. Lançou um olhar ao companheiro: —Colecionar insetos é um bom hobbie. Por que não tenta isso primeiro?

Otto riu: —Não tem leões em Yorkshire, Lud. Talvez no museu.

Ele piscou, sonolento: —Vocês vão ficar aqui?

—Vamos pra casa do meu pai amanhã...

—Não, quero dizer, aqui, no quarto. Vão ficar aqui comigo, não vão?

Alois o reassegurou: —Claro que sim, pode dormir tranquilo. —Ele voltou a deitar, bocejando.

Após alguns consertos, decolaram de novo, dessa vez com mapas e uma ideia mais detalhada da rota que deveriam tomar. Ludwig sentia o vento no rosto, a paisagem urbana do sul da Inglaterra aos poucos ganhando os contornos bucólicos e floridos do norte. Chegavam ao destino, porém, diferente do que ocorrera antes, o vento não colaborou e se viram enfrentando uma turbulência: —SEGUREM FIRME!— Freou, mas o avião entrou de nariz num galinheiro, desacelerando aos poucos pelo terreno. Espantou uma galinha do cockpit.

O sobrinho desceu da cabine, com Barão no colo: —Foi demais! Parecia o Mickey Mouse pilotando! —Franziu as sobrancelhas, sem saber se aquilo era um cumprimento ou não.

Seu companheiro limpava os olhos, emocionado. A porta da frente se abriu e o velho senhor Vandenburg veio, seguido pela esposa e por Wilhelm, Aninka e as crianças, numa só massa de alegria e confusão.

Alois viu pai e filho se abraçarem, cheio de inveja por não poder fazer o mesmo. Suspirou, Ludwig perguntando: —Aquele velhinho é o pai do Otto?

Confirmou. O sobrinho voltou a puxar sua mão: —Então ele vai morar com eles agora?

—Não. — respondeu, ouvindo o menino exclamar em alívio. Olhou para ele. Era possível que ele ainda não tivesse entendido, mas isso não continuaria por muito mais tempo. Ainda sentia-se pisando em vidro cada vez que pensava no assunto.

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